João Rodrigues desmonta a narrativa neoliberal e a apropriação indevida que ela faz do conceito de liberdade, focando-se na liberdade de explorar e oprimir e na subordinação dos indivíduos ao funcionamento dos mercados. E reduzindo o “Estado forte” ao duplo papel de perpetuar a desigualdade e a injustiça social e de promotor e financiador de negócios privados.
No Portugal democrático, a onda das políticas neoliberais iniciou-se relativamente cedo, com as privatizações, que serviram de base à reconstituição dos grandes grupos económicos e ao aumento da dependência externa do país, com a entrada de investidores estrangeiros. A par de alguns investimentos no tecido produtivo, o que mais se acentuou foi a velha tradição do capitalismo rentista, avesso ao risco e viciado no lucro fácil e nos negócios feitos à sombra do Estado. Nada é mais falso do que os bramidos dos ditos liberais contra o “socialismo”: foram políticas neoliberais que nos trouxeram ao ponto em que estamos, numa tendência comum a governos mais à esquerda ou à direita: privatizações, desregulação e precarização do trabalho, dependência externa, perda da soberania financeira com a adesão ao euro. Uma política que atingiu o auge durante o governo de Passos Coelho, que à boleia da troika mas indo até além das suas exigências, impôs o mais duro programa de austeridade, empobrecimento e emagrecimento das funções económicas e sociais do Estado.
O sucesso dos primeiros quatro anos de geringonça deveram-se em larga medida à reversão parcial das políticas austeritárias. Mas a mudança de rumo deixou frustrados os órfãos do passismo, que deixaram de se identificar com um PSD agora menos radicalizado em torno de políticas neoliberais. E é assim que encontramos, sem grande surpresa, muitos antigos militantes do partido a animar tanto o protofascismo chegano como a salfífica Iniciativa Liberal. Duas faces, afinal, da mesma moeda: um projecto político assente no individualismo, na perpetuação e agravamento das desigualdades, entendidas como a ordem natural das coisas, e na captura do Estado, colocado ao serviço de interesses privados.
O discurso aparentemente mais sofisticado dos autoproclamados liberais esconde mal a crueza das ideias. O verniz neoliberal estala facilmente à menor das objecções ou provocações, o que se observa com muita facilidade nas redes sociais. Mas a retórica simplista e aparentemente sedutora parece estar a colher bem entre aquele eleitorado jovem com mais ambição individual do que consciência social. Já o discurso chegano, mais populista e ainda menos escrupuloso na exploração do racismo e da inveja social, é claramente dirigido a uma clientela intelectualmente menos sofisticada, mas certamente mais numerosa quando saímos do ambiente das elites urbanas e olhamos para o país real que andámos a construir nas últimas décadas.
Afinal de contas, como já alguém disse, o Chega não é mais do que o plano B dos neoliberais…
GostarGostar
E o que entristece é ver jovens a apoiar estas ideias como grande novidade. Pensam eles que se sentarão à mesa do banquete desta vida? Haverá um ou outro lugar vago, como sempre e a bem da sobrevivência do regime. Os outros lugares já estão ocupados, têm nomes sonantes e manterâo a linhagem .
GostarLiked by 1 person