Para este ministro e os seus apoiantes, parece que sim. A primeira reacção, a mais visceral, que sai aos defensores da burocracia pseudo-pedagógica do MAIA é chamar ignorantes aos seus detractores: não conhecem o projecto, como se eles próprios se interessassem por mais alguma pedagogia além da que é emanada pelo ministério; não sabem o que é “avaliação pedagógica”, como se qualquer avaliação escolar pudesse não o ser; usam a formação, na modalidade de mais do mesmo, como um castigo a aplicar aos recalcitrantes, como se a persistência no erro fizesse de alguém melhor profissional.
Vem isto a propósito de uma colega, maiata irritada e irritante que, descontente com a petição Fim do Projeto MAIA e as perto de doze mil assinaturas que já conseguiu reunir no momento em que escrevo estas linhas, resolveu fazer também uma petição. Esta a pedir mais formação para quem desdenha de um projecto tão brilhante que até o seu principal mentor o abandonou.
A argumentação, ou falta dela, não se desvia muito do que já ficou dito e parte, como toda a medíocre teoria da “avaliação pedagógica”, de pressupostos errados: a de que com uma avaliação mais rigorosa os alunos obtêm melhores resultados. Que o problema do insucesso é a falta do “feedback” adequado. Que com a magia do MAIA todos os alunos aprendem, mesmo os que não querem aprender.
Na verdade, o que o MAIA faz é burocratizar a avaliação, na tentativa de generalizar procedimentos que, podendo ser válidos e eficazes numas disciplinas, não o são noutras; e ignorando não só as especificidades inerentes às diferentes áreas disciplinares mas também as disparidades ao nível da carga horária de cada uma. É possível avaliar da mesma forma trabalhando em monodocência e com apenas uma turma ou tendo sete, oito, ou ainda mais, como sucede frequentemente a partir do 2.º ciclo, com uma ou duas centenas de alunos?
Um pouco de pensamento “reflexivo” – que para alguns se reduz a obedecer cegamente aos reptos do ME e dos seus comissários políticos – deveria fazer-nos compreender a profunda contradição que grassa na pedagogia do regime entre o desenvolvimento curricular e a “avaliação pedagógica”: enquanto naquele se privilegia uma visão “holística” do currículo, exortando-se os professores a quebrar as compartimentações do saber entre as disciplinas tradicionais, reorganizando o currículo com base nos projectos educativos e na “autonomia das escolas” e promovendo a interdisciplinaridade através dos DAC, na avaliação prevalece a rigidez conceptual que coloca avaliação formativa e sumativa em compartimentos estanques e que na prática representa um claro retrocesso em relação aos avanços das últimas décadas e a uma aplicação plena do princípio, esse sim eminentemente pedagógico, da avaliação contínua.
Ao contrário dos pedagogos de cátedra ou de gabinete, não tenho pretensões a teorizar sobre avaliação. Mas preocupo-me em aplicar o que os livros e a experiência me foram ensinando no dia a dia da profissão. E cada vez encontro menos vantagens em separar o formativo do sumativo, ou o avaliar do classificar. Romper o cerco em que as formulações maiatas nos querem encerrar reconduz-nos à avaliação verdadeiramente pedagógica que deve estar presente em todo o processo de ensinar a aprender. Esta visão integrada é que nos permite também, fugindo a excessivos formalismos avaliativos, aproveitar o máximo de tempo disponível para o que verdadeiramente interessa, que é o processo de aprendizagem.
Por exemplo, uma ficha formativa pode servir para o aluno rever matérias, superar dificuldades, obter feedback sobre os seus inconseguimentos. Mas também permite ao professor verificar como o aluno trabalha, avaliando a forma como pesquisa ou relaciona informação, como aplica conhecimentos adquiridos ou o empenho e a persistência que demonstra no seu trabalho. Da mesma forma que um teste sumativo pode e deve ter um carácter formativo: seria um desperdício de tempo que um teste servisse apenas para classificar os alunos, sem lhes proporcionar qualquer aprendizagem real.
Tudo isto, claro, são meras reflexões de um professor a pensar fora da caixa, tentando ir um pouco além das teorias que norteavam a formação de professores nos anos 90 e nas quais alguns parecem ter cristalizado. Muitos colegas de ofício certamente me entenderão, mas que não sei se estas heterodoxias alcançarão as alturas onde planam as mentes formatadas de alguns doutores da pedagogia.