Perante a ilegalidade declarada dos serviços mínimos, que fazer às dezenas de processos disciplinares e faltas injustificadas aplicados a professores grevistas por direcções escolares seguidistas e prepotentes? A resposta lógica e sensata só pode ser uma, o arquivamento imediato. Ninguém pode ser punido por incumprir uma ordem ilegal, como são todas as convocatórias feitas ao abrigo dos serviços mínimos que os colégios arbitrais, esses tribunais dos pequenitos, decretaram, mas o tribunal a sério considerou, sem sombra de dúvida, ilegais.
A lamber as feridas da derrota jurídica, o ministério de João Costa ainda não atirou a toalha ao chão: pondera se haverá de recorrer da decisão, tirando partido de um sistema jurídico que não penaliza como deveria nem o abuso de poder nem a litigância de má fé.
Nesta imposição ilegal de serviços mínimos, os professores foram vítimas não apenas do ministério que os deveria valorizar e defender, mas igualmente do trabalho sujo a uma repartição governamental – a DGAEP – e dos seus juristas avençados. Estes não são juízes, sublinhe-se, pelo que podem ser responsabilizados pelos seus actos comprovadamente ilícitos e lesivos dos direitos dos trabalhadores docentes. O apelo à decência, feito pela Fenprof, é pertinente, mas duvido que chegue. Talvez só percebam quando começarmos a tratar esta gente como nos tratam a nós, obrigando-os a responder, no banco dos réus, pelas suas malfeitorias…
É o que a Federação Nacional de Professores (Fenprof) espera que aconteça agora, frisando que o teor do acórdão do TRL, conhecido nesta quinta-feira, “vai além” das greves em causa, “ao deixar “claro que serviços mínimos em dias de aulas ou de qualquer actividade que não seja o que a lei prevê são ilegais”. A Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) estipula que, no caso da educação, “a imposição de serviços mínimos cinge-se às actividades de avaliações finais, exames ou provas de carácter nacional, que tenham de se realizar na mesma data em todo o território nacional”, frisa-se na decisão do tribunal. (…)
“Espera a Fenprof que, por razões agora acrescidas, o Ministério da Educação decida arquivar todos os procedimentos disciplinares e que os mesmos [procedimentos] não se repitam”, exortou aquela estrutura sindical, que também deixou um recado à DGAEP, a quem o ME tem enviado os pedidos de serviços mínimos, e ao Conselho Económico e Social, que indica os juízes-presidentes dos colégios arbitrais: “Terão de ser rigorosos na aplicação da lei e não pactuar com as intenções do Ministério da Educação de impor serviços mínimos ilegais.”
“À DGAEP cabe, em primeiro lugar, informar o ME de que o seu pedido não tem cobertura legal, dispensando a constituição de colégio arbitral; a este, desde logo ao seu presidente, compete analisar o pedido, identificar a ilegalidade e não decretar serviços mínimos que violam a lei e põem em causa um direito constitucional”, conclui a Fenprof.
Se temos por aí uns artistas que se arrogam o direito de medalhar escolas “amigas das crianças”, outras há que parecem apostadas em ser inimigas dos seus próprios professores. Basta constatar as atitudes ignóbeis e persecutórias que têm contra os seus próprios docentes, por terem ousado não cumprir os serviços mínimos de uma greve que os não tinha – a greve da Frente Comum ocorrida a 17 de março.
A Fenprof fez um levantamento dos casos de que teve conhecimento e apresentou hoje mesmo queixa no DIAP contra as direcções escolares que agiram desta forma e as entidades públicas, nomeadamente as delegações da DGEstE, que incitaram à injustificação de faltas ou à abertura de processos disciplinares.
Directamente do comunicado, eis a lista das escolas cujos directores deveriam encher-se de vergonha…
A delegação da Fenprof que ontem esteve na reunião negocial com o ME abandonou-a antes do termo. Não para ensaiar de forma gratuita um radicalismo que alguns vêm exigindo, mas para assinalar o desagrado perante o que se evidencia como uma farsa negocial. Quando, ao fim de quatro reuniões de suposta negociação, a proposta final do ME é exactamente a mesma que apresentou no início, é evidente que andam a brincar, não só com os sindicatos que os representam, mas também com os próprios professores: com a sua dignidade profissional e os seus direitos, expectativas e aspirações.
Também não abona a favor da seriedade e boa fé negocial, nem tão pouco dos valores éticos e políticos de um partido que se diz democrático e socialista, que ao mesmo tempo que encenam a negociação com os professores em luta, andem a caucionar a actuação de direcções escolares que atentam contra o direito à greve, marcando faltas injustificadas e abrindo processos disciplinares a professores grevistas. Uma ilegalidade e uma prepotência inaceitáveis, para as quais só o recurso aos tribunais pode ser resposta, levando ao banco dos réus todos os prevaricadores.
Em primeiro lugar, o facto de o Ministro da Educação ter revelado aos sindicatos que o documento que apresentou na primeira reunião de negociação não vai sofrer qualquer alteração, mesmo após a realização de três reuniões políticas e de uma outra de teor técnico, o que revela que este processo dito negocial não passou de uma encenação.
Mas, acima de tudo, pela postura anti-democrática e discriminatória ao insistir em prosseguir com os procedimentos disciplinares contra os professores que fizeram a greve da Administração Pública a 17 de março, para a qual não estavam decretados serviços mínimos, em oposição ao sucedido com greves anteriores, consideradas ilegais por parecer da Procuradoria Geral da República. Concordando com este procedimento do ME, ao considerar que os professores aderiram à greve de boa fé, a FENPROF condena a existência de dois pesos e duas medidas.
No próximo dia 18 de maio, a FENPROF irá apresentar ao DIAP de Lisboa todos os casos de que tem conhecimento de faltas injustificadas e processos disciplinares aplicados indevida e ilegalmente a estes professores e educadores.
Desta aferição, não resultam nem mais apoios para as crianças e jovens com dificuldades, nem mais recursos humanos para as escolas. E são recursos e apoios que, em decisiva medida, as escolas carecem para a obtenção de resultados ainda mais positivos.
Para ultrapassar as dificuldades mais do que diagnosticadas pelos professores, deveria existir uma efetiva redução do número de alunos por turma, a atribuição de mais recursos materiais e humanos às escolas, a redução da burocracia e, também, um efetivo rejuvenescimento do corpo docente.
A realização das provas em formato digital em nada altera nem a forma, nem o conteúdo, nem os efeitos positivos do presente programa de aferição que são nenhuns. Poderá, porém, nos alunos, criar mais ansiedade pelo pouco domínio no uso do computador para a realização deste tipo de provas, ao mesmo tempo que os professores ocupam ainda mais tempo da atividade letiva para ensinar e treinar competências digitais, reduzindo o tempo despendido para a recuperação das aprendizagens e a consolidação de conhecimentos. Desta forma reduz-se a utilidade das competências digitais à sua aplicação na realização de uma prova.
A Fenprof toma posição sobre a polémica que tem envolvido as provas de aferição de 2023, sem esquecer que este modelo de avaliação externa das aprendizagens surgiu em 2016 como alternativa aos exames nacionais que então se faziam em todos os anos finais de ciclo. Na verdade nunca foi um modelo consensual: avaliar faz sentido se essa avaliação tiver consequências, que não precisam necessariamente de se traduzir numa nota, mas devem permitir identificar carências e dificuldades e condicionar a acção futura no sentido de ultrapassar esses constrangimentos.
Ora nem a realização demasiado precoce destas provas – o que é flagrante no 2.º ano de escolaridade, quando o nível de conhecimentos e de autonomia dos alunos são ainda bastante limitados – nem a forma como muitas das questões e exercícios são elaborados, nem a complexa logística que acaba por implicar a chegada tardia dos resultados às escolas e aos alunos contribuem para que os resultados tenham reais reflexos na melhoria das aprendizagens. Acresce que o ministério, que manda professores e alunos fazer o seu trabalho em torno dos relatórios RIPA e REPA, não avalia ele próprio as inconsistências e limitações de um modelo avaliativo que há sete anos – com uma breve interrupção devida à pandemia – anda a ser imposto inutilmente. Quando as escolas se debatem com a falta de tempo e de recursos, seria importante reconhecer que, num balanço global, o cerimonial das provas e de tudo o que elas envolvem traz mais perdas do que benefícios ao sistema educativo.
Este ano ensaia-se a fuga para a frente que é a generalização das provas digitais sem que existam meios e condições, na generalidade das escolas, para a sua realização. Provas que, no 2.º ano, constituem um absurdo a nível pedagógico, pois o uso das tecnologias é ainda muito incipiente e assim deve continuar a ser: a mobilidade fina desenvolve-se manuseando o material de escrita, não à procura de letras no teclado. Acrescenta-se assim mais uma grave distorção num processo que nasceu já nasceu torto, fruto do voluntarismo e da inconsciência de quem decide: vamos avaliar sobretudo a destreza dos alunos no uso dos computadores e a qualidade dos equipamentos informáticos de cada escola, em vez dos conteúdos curriculares das disciplinas a que as provas dizem respeito.
Lisboa 11/02/2023 – Manifestação Nacional de Professores em Lisboa (Rita Chantre / Global Imagens)
Para quem, por estes dias, se confessa cansado da luta, recorde-se que o Primeiro de Maio original remonta a 1886. De então para cá, muitas conquistas se alcançaram, mas continuamos a ter uma repartição injusta de rendimentos entre o Trabalho e o Capital. Quase século e meio depois, e quando a globalização neoliberal agrava as assimetrias e desigualdades e a exploração capitalista se tornou a maior ameaça ao futuro do planeta, a luta dos Trabalhadores não só não está terminada como continua a fazer todo o sentido.
Entre os trabalhadores docentes, a greve iniciada pelo STOP, ainda em Dezembro, “por tempo indeterminado”, correspondeu às expectativas frustradas de muitos professores, inconformados e combativos, que há muito não se reviam nas lutas – fofinhas, diziam eles – do sindicalismo tradicional. Desencadeou um processo reivindicativo que, alternando momentos de maior e de menor mobilização e intensidade, ainda não terminou.
Mas ninguém disse que iria ser fácil. A negociação com o ME começou pelos concursos, mas rapidamente a exigência da recuperação integral do tempo de serviço se assumiu como prioridade. Com a fasquia colocada no ponto mais alto, e sabendo-se as voltas que este tema já deu no primeiro e minoritário governo de António Costa, ameaças de demissão incluídas, não seria agora que, dotado de maioria absoluta, o PS iria satisfazer a vontade dos professores. A um objectivo ambicioso, teria de corresponder uma estratégia à altura, capaz de obrigar o Governo, perante uma força e união inéditas da classe, a ceder em algo que não fazia parte das suas promessas, muito menos dos seus planos.
Quanto à estratégia do Governo, ela foi clara desde o início: vencer os professores pelo cansaço. Pouco preocupados com as aprendizagens dos alunos, sabem que a greve representa prejuízo material para os professores. Afinando a estratégia de desgaste, foram surgindo as pressões: primeiro, pondo em causa a legalidade da greve, depois, requisitando serviços mínimos à margem dos critérios legais, que solícitos colégios arbitrais logo concederam, e sempre, pressionando os directores para manterem as escolas abertas.
Ao fim de quase meio ano de lutas, um sentimento de amarga decepção começa a dominar os professores: mexemo-nos muito, alguns mais do alguma vez o fizeram nestas lidas, mas não saímos do mesmo sítio: até agora, nenhuma reivindicação importante dos professores foi alcançada.
É verdade que os professores ainda não foram vencidos. Como costuma dizer-se nos meios sindicais, só é vencido quem desiste de lutar. Mas entre os professores, além dos que nunca lutaram verdadeiramente, começa a avultar o grupo dos desistentes, que não querem perder mais tempo e dinheiro a alimentar o que lhes parece ser uma ilusão inalcançável.
Ressurge também uma velha tendência da classe nos momentos de desânimo, bastando dar uma volta pela blogosfera docente e as redes sociais dos professores, para a encontrar: como os professores não conseguem vergar o Governo, atacam os seus próprios sindicatos. Sempre é mais fácil. Mais difícil é perceber o que esperam ganhar com essa reacção infantil que, curiosamente, não vemos noutras classes profissionais igualmente envolvidas em lutas duras e prolongadas.
Alguns argumentos são extraordinários. Diz-se, por exemplo, que falta união entre os sindicatos. Ora desde que a actual luta se intensificou a quase totalidade dos sindicatos têm actuado conjuntamente numa plataforma que inclui as duas federações. Parte do processo negocial decorreu em mesa única, algo que já não acontecia há décadas. No final, nem um só sindicato assinou qualquer acordo com o ministério. E quanto ao papel de outsider assumido pelo STOP, essa foi uma inevitabilidade ditada pela postura do sindicato e a luta inovadora que quis desencadear, o que foi vivamente saudado pelos sócios e simpatizantes deste sindicato.
Perceba-se que os sindicatos dos professores reflectem a diversidade de uma classe que nunca foi homogénea. Pode haver unidade entre os representantes se ela está longe de existir entre os representados? Mais, essa unidade constrói-se em torno de quê? Vão todos atrás do primeiro que decidir alguma coisa? Ou opta-se pelo consenso paralisante, que é sempre a melhor forma não comprometer a “unidade”?
Nos últimos dias, não faltou sequer a insinuação torpe, a que o Paulo Guinote decidiu dar injustificado destaque, de que o ME andaria a pagar viagens aos EUA a delegações da Fenprof e da FNE para irem, juntamente com o secretário de Estado da Educação, fazer acordos às escondidas dos professores. Afinal, tratou-se de uma iniciativa anual que reúne a OCDE, representantes sindicais e governamentais para debater a actualidade e o futuro da Educação. A edição de 2018 deu nas vistas porque teve lugar em Portugal e também não faltou quem não gostasse de ver Tiago Brandão Rodrigues e Mário Nogueira sentados lado a lado. Em Washington, António Leite encontrou-se com as delegações sindicais, mas cada um foi, obviamente, por conta da organização que representa. Haver quem pegue nisto para a crítica acintosa e aldrabona aos sindicatos diz bem da forma como alguns de nós olham para quem os representa.
Alguma coisa está mal quando uma classe profissional culta e influente olha os seus sindicatos como corpos que lhe são estranhos. Os sindicatos são formados pelos próprios trabalhadores, algo que, no dia que lhes é dedicado, será sempre bom relembrar. No cerne de todas as grandes conquistas conseguidas pelas classes trabalhadoras estiveram sempre os seus sindicatos, organizando e enquadrando as lutas colectivas por melhores condições de vida e trabalho.
Haver quem declare que, entre mais de 20 sindicatos docentes, nenhum lhe serve, significa apenas, provavelmente, que há quem espere de um sindicato aquilo que ele não lhe pode dar. Não são os sindicatos que fazem as leis, os decretos e os despachos. Não têm o poder de “deixar” o Governo fazer isto ou aquilo. Não são sequer eles que decidem a ordem de trabalhos das reuniões negociais. Têm, em cada momento, apenas a força que lhes é dada pelos trabalhadores que representam e que se dispõem a lutar pelos seus direitos.
Por isso, e porque lutar custa, e cansa, é que ao lado do argumento do “tantos sindicatos” surge a variante do “precisamos de uma Ordem”: o sonho da união eterna e definitiva, imposta por decreto, e de ter um bastonário nosso, “independente de sindicatos e de partidos”, que irrompe com o seu bastão pelo ministério dentro e consegue para a classe, de uma penada e sem esforço, tudo aquilo que ela sempre desejou…
Assinale-se ainda a contradição de fundo que atravessa a luta dos professores: exigimos negociações mas, cansados de humilhações e derrotas, impomos “linhas vermelhas” que um Governo que hostiliza abertamente os professores nunca aceitará. Não veremos, a não ser perante um terramoto político de amplitude inimaginável, o Governo a ceder perante as principais exigências dos professores, entre as quais avulta a contagem integral do tempo de serviço. Mas também nenhum sindicato ousará, perante a mão cheia de nada que lhe é oferecida, assinar algum acordo com o ME em nome dos professores. Estamos assim, pelo menos pelos tempos mais próximos, condenados ao desentendimento.
Não estando em causa desistir, a luta estará então para continuar enquanto houver docentes dispostos a assumi-la. Doseando forças de forma inteligente, diversificando as frentes de batalha e as formas de luta, trazendo-a dos portões e das ruas para dentro das escolas e para a vivência diária da profissão. Aproveitando os momentos e as conjunturas mais favoráveis para pressionar o poder, somando pequenas vitórias que nos darão ânimo, cultivando um espírito solidário e colaborativo e passando o testemunho da luta e da conquista de direitos às novas gerações docentes que começam finalmente a despontar na profissão.
Fundada em 1983, a Federação Nacional dos Professores continua a ser a maior e mais representativa organização sindical de docentes. Liderou e enquadrou todas as grandes lutas dos professores em defesa dos seus direitos e pela melhoria da sua carreira, salários e condições de trabalho.
Depois das conquistas dos anos 90, entre as quais avulta o primeiro Estatuto da Carreira Docente e uma significativa valorização salarial e profissional da classe, o século XXI tem sido de acentuada regressão em termos laborais, e não só para os professores. É redutor associar este declínio à (in)acção da Fenprof e dos seus sindicatos, como alguns fazem, mas é certo que o movimento sindical docente precisará sempre de se renovar e reinventar num mundo também ele em mudança, e nem sempre para melhor.
A assinalar este aniversário, uma extensa entrevista a Mário Nogueira onde todas as perguntas têm resposta, incluindo as que versam sobre a relação difícil com o novo sindicalismo corporizado pelo STOP…
“Parece que há ciclos de cinco anos” entre os grandes momentos de luta, comenta Mário Nogueira, recordando que, no ano passado, disse aos colegas: “Se se confirmarem estes ciclos, para o ano vai ser luta a sério”.
E foi, precisamente, dessa forma que 2023 arrancou, marcado por greves nas escolas e manifestações a fazer lembrar as de 2008, com uma exigência que, não sendo nova, os professores parecem não estar dispostos a largar desta vez: a recuperação de todo o tempo de serviço.
“Espero que não seja preciso esperar até 2028 para voltarmos a ter uma grande luta dos professores. Nós precisamos é de resolver rapidamente esta situação, porque ela é terrível e as pessoas têm uma sensação de injustiça tremenda”, sublinhou, defendendo que a recusa do Governo “é, acima de tudo, um capricho do primeiro-ministro” que, em 2019, ameaçou demitir-se se a proposta de recuperação do tempo dos professores, na altura em discussão no parlamento, fosse aprovada.
Ou então, como diz a Fenprof, propostas sem pés nem cabeça. Na verdade, nada que não fosse esperado. O que mais surpreende é que durem horas reuniões ditas negociais onde nada se negoceia. Sabemos que o ministro gosta de se ouvir e ganhou fama de habilidoso com as palavras, para não lhe chamar coisa pior, mas talvez já vá sendo altura de, perante a conversa de chacha, deixar o senhor a falar sozinho.
Note-se que já nem se dão ao trabalho de apresentar propostas de trabalho relativamente aos temas agendados. As reuniões são apenas para cumprir calendário e o raciocínio dos governantes é bem evidente: valorizar a carreira docente não consta do programa do Governo, temos uma maioria absoluta que apoia a nossa política educativa e assim sendo não vamos ceder às vossas exigências.
Só faltou, para serem ainda mais claros, chamarem parvos aos professores que agora reclamam e há um ano, ingenuamente, votaram neles…
Não se trata de um jogo interessante neste caso, descobrir as diferenças entre a entrada numa reunião com o Ministro João Costa e o resultado à saída da mesma reunião. Na verdade, não se encontram. A inexistência de propostas concretas prévias ao encontro entre governo e sindicatos traduz-se pela inexistência de pouco mais do que indicações de que algumas coisas podem ser alteradas em conselho de ministros. Estas são as palavras da tutela no final de horas de reunião dita “negocial”.
Para o governo, não constando do seu programa de maioria absoluta, não existirá do confronto de argumentos qualquer revalorização da carreira docente. Não havendo essa disponibilidade o ME saiu como entrou, recusando contar um dia dos 6 anos, 6meses e 23 dias que são devidos aos docentes portugueses, já para não falar no tempo perdido entre transições entre regimes de carreira e, até, do tempo perdido nas esperas por um acesso aos 5.º e 7.º escalões, enquanto aguardavam vagas. Mesmo neste caso a solução proposta não salvaguarda os interesses dos docentes implicados.
Portanto, os sindicatos da Plataforma pela Profissão Docente reafirmaram à saída que a luta vai continuar, que os professores merecem respeito, que a Escola Pública precisa de uma profissão docente atrativa e que a luta irá até níveis que podem ser evitados, caso o ME recue, deixe de olhar orgulhosamente para este processo e reconheça aquilo que a maioria dos portugueses já vieram manifestar – os professores têm razão e merecem o respeito que não estão a ter da parte do governo.
Uma reunião técnica para esclarecer que, tecnicamente, o tempo de serviço congelado que o ME pretende recuperar se reduz a um redondo zero.
Técnica e especificamente, confirma-se que as assimetrias da carreira dos professores são para manter e mesmo, nalguns casos, agravar. Noutros, a pretensa correcção ou “mitigação” dessas situações irá criar novas e não menos injustas assimetrias.
A reunião técnica serviu assim para confirmar o que, ao nível político-sindical, já se sabia: a luta é para continuar!
Umas sem serviços mínimos – é o caso das greves distritais convocadas pela plataforma de sindicatos – outras que eventualmente os terão, como as convocadas pelo STOP para os dias 26 a 28 de Abril, para a qual o ME pediu a definição de serviços mínimos.
Aguardo, com alguma curiosidade a decisão do habitual colégio arbitral, para confirmar se acompanha as decisões dos seus congéneres em greves anteriores, ou se tem outro entendimento. Sim, porque esta coisa de estarmos paulatinamente a formar uma jurisprudência sobre direito à greve a partir de decisões extrajudiciais das quais não se pode recorrer em tempo útil parece-me, salvo melhor opinião, um grave entorse às regras do Estado de Direito e do regime democrático.
Os últimos serviços mínimos a vigorar nas escolas estenderam-se até 31 de Março, o último dia de aulas do 2.º período lectivo, “nos mesmos termos do que havia sido decretado anteriormente”, diz o ME.
Com o início do 3.º e último período lectivo regressam também os protestos de professores, interrompidos pelas férias da Páscoa. As greves por distrito convocadas pela plataforma sindical (na qual se incluem as federações mais representativas do sector, Fenprof e FNE — Federação Nacional da Educação) vão iniciar-se no Porto, a 17 de Abril, e seguem depois a ordem alfabética inversa até terminarem em Lisboa a 12 de Maio. Nos dias de paralisação, estão também marcadas concentrações de professores em cada capital de distrito.
É o número mais elevado da última década, ultrapassado apenas pelas mais de 4.500 aposentações registadas em 2013.
“O problema não está na aposentação de tantos docentes, pois esta saída era previsível, tratando-se de professores e educadores que exercem funções há mais de 40 anos”, refere a Fenprof.
Por outro lado, a organização sindical manifesta-se, sobretudo, preocupada com a falta de atratividade da profissão e com o reduzido número de alunos que, todos os anos, saem dos cursos de Educação para se tornarem professores.
“Só há uma forma de estancar a saída precoce da profissão, recuperar os que já abandonaram e atrair jovens para os cursos de formação: valorizar uma profissão que, de forma crescente, tem perdido atratividade”.
O incremento progressivo das aposentações é inevitável numa profissão envelhecida e onde só agora se começam a notar tímidos sinais de rejuvenescimento: até ao final da década, quase metade dos actuais professores dos quadros deverão ter abandonado a profissão. Não deveria ser um problema, tendo em conta que ao longo das últimas duas ou três décadas se formaram dezenas de milhares de novos docentes. Mas é-o, porque as condições precárias a que o ME condenou os jovens professores levaram a que boa parte deles mudasse de vida, e não equacione hoje, num quadro que continua a ser pouco vantajoso, o regresso à profissão docente.
O recente processo de revisão do regime de concursos seria a oportunidade perfeita para que, ouvindo os professores e tendo em conta as suas necessidades e anseios, se erigisse um novo regime legal que desse uma resposta eficaz às carências de pessoal docente. Uma carreira docente dignificada e valorizada, não apenas no aspecto material, que é importante, mas também nas condições do exercício da profissão, seria igualmente, a médio e longo prazo, a forma de garantir a atractividade da docência e dos cursos de formação de professores.
Demonstrando uma vez mais não estar à altura das suas responsabilidades nem da confiança dos portugueses que lhe outorgaram uma maioria absoluta, o governo socialista preferiu no entanto, como se sabe, o caminho do unilateralismo e da imposição das suas más soluções. Cabe agora aos professores mostrar que não desistem da sua justa luta e que esperam do Presidente, que pediu uma solução negociada deste conflito, o veto político do decreto-lei fruto da arbitrariedade e do autoritarismo de um Governo incapaz de negociar.