Indisciplina: anunciado mais um “observatório”

Organizações representativas dos professores, diretores escolares e pais lançaram hoje o Observatório da Convivência Escolar, uma iniciativa que pretende ajudar a denunciar e monitorizar a indisciplina nas escolas.

A iniciativa é da Federação Nacional da Educação (FNE), em colaboração com a Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), a Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP) e Associação para a Formação e Investigação em Educação e Trabalho (AFIET).

“Em roteiros para a legislatura anteriores, já tínhamos desafiado o Ministério da Educação a criar um observatório para questões da violência e indisciplina, em virtude de sentirmos que, ano após ano, se agudizavam os problemas”, explicou à Lusa o secretário-geral da FNE.

Na falta de resposta da tutela, mas com o apoio de outras organizações, a federação decidiu não esperar mais e o Observatório da Convivência Escolar foi lançado hoje, desde já com o lançamento de uma plataforma ‘online’ para denúncias.

Não me parece que a criação de mais um “observatório” para questões de indisciplina e violência escolar seja a solução para acabar com os ambientes problemáticos e violentos que se caracterizam num número significativo de escolas. E ninguém se sinta imune ao problema: mesmo em escolas consideradas pacíficas pode a qualquer momento surgir um incidente. Aos anos que se fala do assunto e se “monitorizam” ocorrências, sem grandes resultados: estaria mais do que na altura de começar a actuar com medidas concretas, numa matéria que é fulcral quando todos, aparentemente, querem o mesmo: uma escola pública de qualidade, segura e inclusiva para todos os que a frequentam.

Ainda assim, antevejo um lado positivo nesta iniciativa, quando a regra geral tem sido ignorar ou minimizar todo o tipo de casos que não acabem na esquadra de polícia ou na urgência do hospital. E mesmo estes últimos são geralmente considerados “casos isolados”, em vez de se assumir que representam, quase sempre, a ponta do icebergue. Neste contexto, é fundamental dar visibilidade a um problema que, seja em defesa das “políticas públicas”, seja em prol do “bom nome” das escolas, é menosprezado e silenciado pelos responsáveis que tardam em assumir responsabilidades na matéria. Aqui, superando décadas de laxismo e negação, o Observatório da Convivência Escolar poderá fazer a diferença: colocando as comunidades escolares e a opinião pública a discutir o assunto, recolhendo dados objectivos, dando voz às vítimas silenciadas e denunciando quem, pela inacção e o silêncio, se torna cúmplice de abusadores e agressores.

Continuam as agressões a professores

O pai de um aluno invadiu esta quarta-feira a Escola Básica do Lumiar, em Lisboa, interrompeu uma aula de Português e espancou o professor do filho. De acordo com encarregados de educação de outros alunos, a direção do estabelecimento foi informada da agressão, mas nada fez no momento, acabando por ser a vítima a contactar a PSP e a efetuar a respetiva queixa-crime.

O CM tentou obter esclarecimentos junto da direção, mas não obteve qualquer resposta por a mesma “estar em reunião”. Segundo o CM apurou, a vítima sofreu ferimentos ligeiros e o agressor está identificado, tendo o expediente sido remetido ao Ministério Público.

Leio mais uma notícia sobre bárbara violência contra um professor e recordo de imediato o que ontem por aqui se escrevia, em comentário a outro post:

No dia em que devolverem o tempo de serviço congelado, ficará tudo bem. Porque é só isso que está mal. Indisciplina, facilitismo, nada disso importa. No quotidiano escolar, os professores são, não só coniventes, mas agentes da degradação calamitosa a que se assiste na escola pública.

Há muitas coisas a mudar na escola pública portuguesa e a dignidade dos professores não passa apenas pela valorização da carreira e dos salários. Mal andarão os professores que acham que mais uma ou duas centenas de euros no final do mês pagam todo o tipo de abusos, humilhações e violências de que são ou possam vir a ser vítimas…

A impunidade com que qualquer energúmeno passa as portas de um estabelecimento de ensino para agredir e maltratar não pode continuar. Um ambiente escolar seguro é um direito de todos, e assistir à inoperância das direcções escolares perante estas situações não é menos degradante do que os actos dos agressores. Há quem defenda, julgo que com razão, que estas agressões deveriam ser crime público; independentemente de o serem, o que se justificaria inteiramente era o Ministério da Educação perseguir na justiça, até à última instância, todos os autores de agressões violentas em meio escolar. Os serviços jurídicos do ME, tantas vezes usados em litigâncias do Governo contra os professores, deveriam, isso sim, defender as escolas e os seus profissionais.

Entretanto, ontem também, soube-se do desfecho de uma outra agressão violenta e potencialmente fatal a um professor, esta da autoria de um aluno:

Um jovem, de 17 anos, foi condenado a dois anos e nove meses de cadeia, mas com pena suspensa por cinco anos, por ter agredido com um ferro um professor dentro da sala de aula, em Felgueiras, no ano passado. O tribunal de Penafiel decidiu dar uma oportunidade ao estudante que estava em prisão domiciliária. “Vai ter uma espada sobre a cabeça até aos 22 anos”, avisou o juíz ao arguido que deixou de estar em prisão preventiva.

Agressão sexual ou brincadeira?

O caso noticiado como uma situação de sodomização de um aluno numa escola de Vimioso terá sido, afinal, uma “brincadeira entre alunos, simulando exames médicos à próstata”, refere o Ministério da Educação (ME) numa nota enviada ao Expresso, que já tinha noticiado que a origem do caso estava num desafio entre os envolvidos.

“Segundo o processo instaurado ao nível da escola terá existido uma ‘brincadeira’ entre alunos, simulando exames médicos à próstata. As restantes entidades ainda não concluíram e/ou não deram conhecimento da conclusão das respetivas diligências”, pode ler-se na nota divulgada pelo Ministério, que reforça que não é possível falar de sodomização, tal como inicialmente noticiado, porque ainda se desconhece os contornos do caso.

A alegada vítima, continua o ministério, está a receber apoio psicológico e orientação “sob vigilância dos assistentes operacionais, os professores e o respetivo diretor de turma”. “A preocupação da escola centrou-se na proteção do aluno envolvido nesse episódio.”

Sobre os oito suspeitos da alegada agressão, o ME informa que foram suspensos e já regressaram à escola. Um deles teve ainda prorrogado o prazo de suspensão.

A agressão sexual a um aluno de 11 anos, na forma de sodomização com um cabo de vassoura, foi afinal uma “brincadeira”? Será agora normal, nos recreios escolares, brincar aos “exames à próstata”, como o inquérito interno, na escola onde tudo se passou, vem sugerir?

Sem bases para refutar a versão da escola, corroborada pelo ministério, noto que é apenas a versão de uma das entidades envolvidas nas averiguações: as restantes ainda não se pronunciaram. Mas mesmo admitindo que ainda há aspectos a esclarecer, a atitude convergente da direcção escolar e da tutela ministerial segue o padrão habitual nestas situaçôes: está tudo bem, já são todos amigos outra vez, umas palestras sobre os perigos deste mundo e, claro, muito apoio psicológico, o mesmo que falta para tantas situações do quotidiano escolar, mas aqui haverá para dar e vender. E está feito, não há mais nada para ver, é circular, é circular…

Autoridades hiperactivas

O caso de abuso sexual na escola de Vimioso segue o padrão habitual no país de brandos costumes, começando por ser visto como inconsequente brincadeira de miúdos: já passou, ninguém viu nada, circulem, não há nada para ver…

Foi necessário que passasse um longo fim de semana, que a vítima ou alguma das testemunhas se começasse, a medo, a descoser e, finalmente, que a comunicação social divulgasse o escândalo, para que os responsáveis saíssem do casulo da sua irresponsabilidade e inacção, percebendo que, perante a gravidade dos factos, e com os holofotes sobre eles, algo teriam de fazer.

E eis que, de repente, todos querem mostrar serviço: a Direcção do agrupamento, a GNR, a PJ, o Ministério Público, a CPCJ, a Associação de Pais. Os suspeitos foram suspensos preventivamente e até a IGEC desceu ao terreno, preocupada não com o aluno agredido ou com os agressores que continuam a frequentar a mesma escola, mas atraída pela possibilidade de processar a funcionária que, prudentemente, optou por não se meter no meio da confusão.

Aguardam-se assim novos desenvolvimentos, que ajudarão a perceber se há sinais de que os problemas de violência escolar começam finalmente a ser tratados com a atenção que lhes é devida e o respeito que todos os alunos, docentes e funcionários das escolas merecem. Ou se, pelo contrário, a agitação que se observa é apenas a necessidade de simular o movimento de quem não sai do mesmo sítio, a aparente mudança de paradigma que deixa tudo na mesma.

A família do aluno de 11 anos sodomizado por oito colegas, com idades entre os 13 e os 16 anos, na escola de Vimioso, distrito de Bragança, está a receber apoio psicológico, indicou hoje a Associação de Pais.

Em comunicado, a presidente da Associação de Pais do Agrupamento de Escolas de Vimioso diz que foi informada da situação pelo presidente da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Vimioso, no final da tarde de segunda-feira, 22 de janeiro, três dias após o alegado episódio de sodomização, no qual terá também participado o irmão da vítima.

(…)

Várias fontes ouvidas pela Lusa confirmaram que o episódio de sodomização ocorreu cerca das 12:30 de sexta-feira, 19 de janeiro, no interior do estabelecimento de ensino, “com recurso a uma vassoura” e na presença de uma funcionária, pelo menos, que “nada fez” para travar os supostos agressores, informação que também consta de uma exposição da Junta de Freguesia de Vimioso, enviada anteriormente à Lusa.

Segundo estas fontes, policiais e locais, dois dos agressores têm 16 anos – já podem responder criminalmente – e um deles é irmão da vítima, tendo completado 16 anos no dia da suposta agressão sexual.

Os restantes alunos alegadamente envolvidos na ocorrência têm entre 13 e 15 anos.

A alegada agressão sexual aconteceu na sexta-feira, 19 de janeiro, mas só três dias depois, na segunda-feira, 22 de janeiro, é que a GNR foi informada da ocorrência.

Apenas nesse dia o aluno foi levado ao Centro de Saúde de Vimioso e depois ao Hospital de Bragança, com arranhões e queixas.

Na terça-feira, 23 de janeiro, estiveram no local inspetores da Polícia Judiciária e, na quarta-feira, a vítima foi encaminhada para o Instituto de Medicina Legal, no Porto, para realização de perícias, ou seja, cinco dias depois do alegado episódio de sodomização.

Em resposta enviada na sexta-feira à Lusa, o Ministério da Educação (ME) diz que o Agrupamento de Escolas de Vimioso, ao tomar conhecimento do sucedido, procedeu à “instauração de 10 processos disciplinares a alunos que terão estado envolvidos no caso do aluno que terá sofrido a alegada agressão”.

Para terça-feira estão marcadas reuniões, em separado, entre a CPCJ de Vimioso com a mãe da vítima e com os pais dos alunos envolvidos na alegada agressão.

(In)segurança escolar em Vimioso

Um dos alegados agressores da criança de 11 anos sodomizada “com recurso a uma vassoura”, na escola de Vimioso, no distrito de Bragança, é o irmão da vítima, avança o presidente da Comissão de Proteção de Crianças de Jovens (CPCJ) de Vimioso, António Santos, à CNN Portugal. As autoridades falam num clima “de terror e de encobrimento”. Os alunos mais novos “andam assustados” e os suspeitos “sentem que são impunes” porque “ninguém lhes põe travão”.

“Isto tem-se tornado normal, mas ultimamente tem-se tornado cada vez mais grave. Os mais novos andam assustados. Isto é um meio pequeno e todos os miúdos têm conhecimento do caso”, afirma à CNN Portugal José Manuel Alves Ventura, presidente da Junta de Freguesia de Vimioso, que denunciou o caso.

O caso que está a chocar o país aconteceu na sexta-feira 19 de janeiro em plena escola, na presença de, pelo menos, uma funcionária que não nada terá feito para travar o grupo de oito jovens com idades entre os 13 e os 16 anos. A situação só chegou às mãos das autoridades três dias mais tarde quando, na segunda-feira seguinte, os pais da vítima levaram a criança ao médico devido às queixas de ferimentos. Tendo em conta os crimes em causa, a Guarda Nacional Republicana comunicou os factos à Polícia Judiciária.

Na terça-feira estiveram no local inspetores da Polícia Judiciária e, na quarta-feira, a vítima foi encaminhada para o Instituto de Medicina Legal, no Porto, para realização de perícias.

Mas a CNN Portugal sabe que este não foi um caso isolado. No passado, existiram vários casos de violência levados a cabo pelo mesmo grupo, que não só agride os colegas mais novos, como chegou a partir um dedo a uma funcionária, que tentou separar uma cena de violência entre os alunos. No entanto, António Santos garante que não há registo de casos contra professores.

“Este grupo de alunos mais velhos sente que é impune e ninguém lhes põe travão. Não obedecem aos pais, nem aos professores”, reforça José Ventura.

Há problemas sérios nas escolas portuguesas que, sob a ilusão do país seguro e de brandos costumes, andamos há demasiado tempo a ignorar e a esconder. A violência existe, e não apenas onde nos habituámos a contar com ela, as escolas periféricas dos grandes centros urbanos, os “territórios educativos” que abrangem zonas de habitação degradada e famílias desestruturadas e carenciadas. A violência pode irromper em qualquer parte, até numa aparentemente pacata vila da raia transmontana.

Embora a grande maioria das escolas portuguesas se possam considerar ainda, e de um modo geral, lugares seguros, há que ter a noção de que a violência faz parte da natureza humana. Se queremos que ela não se instale em lugares onde nunca deveria existir, como é o caso das escolas, duas coisas são necessárias: prevenção, que passa por manter um olhar atento ao que se passa à nossa volta, agindo precocemente perante os focos de disrupção, e intervenção, implicando proteger as vítimas, punir os agressores assim que apurados os factos e tomar medidas eficazes para prevenir futuras ocorrências e devolver tranquilidade à comunidade escolar. Do que vamos sabendo da horrível agressão na escola do Vimioso, a sensação que fica é que demasiadas coisas vinham falhando há demasiado tempo, e não apenas no interior da escola. Uma agressão desta magnitude, envolvendo até um irmão da vítima entre os agressores, não surge do nada, nem se pode resolver com pedidos de desculpa ou processos disciplinares inconsequentes.

Sem ilibar de responsabilidades a direcção escolar – sendo sempre mais fácil culpar a funcionária que não agiu perante o ocorrido, sem se apurar se teria condições para o fazer ou não seria ela própria vítima dos meliantes – nem a comissão local de protecção a crianças e jovens, há que sublinhar a enorme responsabilidade que o Estado, ao “condenar” todos os menores de idade a frequentarem a escola até aos 18 anos, mesmo que lá não queiram andar, contraiu perante todos os que estudam e trabalham nas escolas. Que segurança é possível garantir quando delinquentes integram a população escolar? Quando gangues violentos actuam no interior da escola, protegidos pela menoridade e pelo “direito à educação”?

Quando um grupo de alunos, que até pode ser pequeno, mas torna disruptivo e violento, tenta tomar conta de uma escola, a responsabilidade de garantir a segurança de todos não permite meias tintas: ou se expulsam os agressores, ou se impõe a ordem e a disciplina, recorrendo aos meios necessários, no interior. Claro que quando nada disto envolve directamente quem tem responsabilidades, porque não terá de enfrentar os delinquentes nem os seus filhos frequentam a escola problemática, é sempre mais cómodo assumir que é apenas mais um “caso isolado”, e deixar correr…

Professor, saco de pancada?

Quando comecei a leccionar, uma alteração legislativa recente impunha aos novos professores a apresentação de um atestado de robustez física e psíquica para o exercício da profissão. Não sei se o legislador teria em mente algo que começa a ocorrer com demasiada frequência nas escolas portuguesas: em nome da inclusão, instalou-se uma permissividade que permite que crianças e jovens descompensados transformem colegas, professores e funcionários em sacos de pancada. Em quase total impunidade, pois sempre se alegará que não são conscientes dos seus actos ou por eles responsabilizáveis.

De uma fonte devidamente identificada chega-me este depoimento que adaptei para publicação, retirando todas as referências que pudessem identificar os intervenientes ou a escola em causa.

Vimos por este meio relatar a situação ocorrida esta manhã, dia xx de dezembro, pelas 12h no Clube xxxx. O xxxx encontrava-se num estado de total alteração quando chegámos à sala de apoio da educação especial, onde, segundo a funcionária já a tinha agredido e ao aluno xxxx. Este encontrava-se a chorar e o xxxx estava sentado no sofá do corredor a acalmar. A professora xxxx, calmamente, levou o para a rua para “tirar cafés”, brincadeira que ele gosta de fazer. Combinou com ele que a seguir iam apanhar folhas com os colegas. Quando chegou a hora combinada, o xxxx não queria ir e a professora xxxx dirigiu-se para o portão. O xxxx veio atrás dela, furioso, e deu-lhe pontapés na perna, puxou-lhe os cabelos, chamou-lhe “filha da puta” e apertou-lhe o pescoço com as duas mãos. Quando tentei intervir, ele agarrou-se também a mim, abanando-me e empurrando-me e continuou a barafustar e a gesticular. Só quando ambas o agarramos e encostamos à rede e lhe prendemos as mãos, o conseguimos imobilizar. Assim que o elemento da direção chegou perto de nós (foi pedida a sua presença) o xxxx mudou totalmente de atitude, demonstrando uma postura calma, respondendo calmamente e acatando tudo o que lhe era dito.
De salientar que, já noutro dia, o aluno me agarrou pela camisa, me puxou e me ameaçou. Nesta altura foi a professora xxxx que lhe agarrou as mãos e me soltou. Com todo o respeito que o xxxx nos merece, a situação parece estar a fugir do nosso controlo e, face ao exposto, torna-se até perigoso dar-lhe uma ferramenta para as mãos. Por outro lado, todos os outros meninos da sala estão a ser prejudicados, pois estas situações impedem que lhes demos a atenção que merecem e impedem o bom funcionamento das atividades.
Consideramos assim, não haver condições de segurança para a realização das atividades, nem para o aluno, nem para os colegas, nem para os docentes.

Ninguém de bom senso negará o direito à educação dos alunos com necessidades especiais. Também é evidente que não é privando da convivência com os pares e os adultos que uma criança com dificuldades de socialização adquirirá as indispensáveis competências sociais. O problema está, como é óbvio, numa pequena minoria de alunos que não consegue regular as suas emoções e reage pela agressão verbal ou mesmo física perante uma situação que não sabe – ou não quer – gerir de outra forma.

Todo o trabalhador tem direito à segurança no local de trabalho, e o profissional da Educação não é excepção. Mesmo em profissões consideradas de risco, os trabalhadores são adequadamente seleccionados, treinados e equipados dos meios necessários para enfrentar as situações mais violentas ou arriscadas. E os docentes, a maioria já de meia idade e muitos com problemas de saúde, têm de andar na escola a ser insultados e ofendidos, quando não corridos ao empurrão e ao pontapé por quem não se consegue comportar?

No mundo em que vivemos todos têm, e ainda bem, os seus direitos. Só que o direito de um à educação não se pode sobrepor ao direito à saúde, segurança e integridade física de todos os outros, os que têm o azar de se cruzar com ele. Antes de impor a mirífica inclusão, compete ao Estado garantir que o incluído, tendo ímpetos agressivos, não se torna uma ameaça para os restantes – e, por vezes, até para si próprio.

Não sou especialista em perturbações mentais nem em educação especial; nem tão pouco conheço o caso concreto do aluno aqui apresentado, mas há um pormenor do relato que me chamou especialmente a atenção: de violento e intratável com todos os que o tentaram acalmar, tornou-se de imediato dócil e obediente perante o elemento da direcção escolar chamado a tomar conta da situação. Mera coincidência, ou haverá nesta súbita mudança de humor algo de mais consciente e intencional? Mais: quantos destes diagnósticos de doença ou perturbação mental, espectros disto e daquilo, passaram realmente por uma avaliação rigorosa? Serão todos estes casos de desrespeito pelo próximo com que nos deparamos nas escolas o reflexo de falta de entendimento destes alunos “especiais” ou haverá alguns que demonstram, simplesmente, que alguém desistiu de lhes ensinar regras básicas de educação e respeito que conseguiriam apreender? Quando seremos capazes de discutir abertamente estes problemas em vez de calarmos as verdades inconvenientes com o discurso hipócrita, mas politicamente correcto, da inclusão?

Petição contra a violência escolar – os pareceres

Não há violência ou indisciplina grave nas escolas, João Costa dixit…..

Dia 12, antes de o Parlamento fechar, deve ser o debate da petição sobre Violência, Paz e Segurança nas escolas, que reuniu as 7500 assinaturas para ir a plenário.

Uma tentativa de avivar o debate sobre isto, nomeadamente dizendo ao Parlamento e aos partidos que têm de revisitar com urgência o Estatuto do aluno e adquirir muito mais realismo no debate do assunto, ouvindo, com mais atenção quem está nas escolas, entre outros, os professores.

Muita gente foi consultada, mas o texto mais engraçado na comicidade nula e fantasista é o do Governo e do Ministro.

Resumo conclusivo meu: “Violência e indisciplina?! Tudo fantasia de quem fez a petição. É coisa que não existe. E se houvesse, as brilhantes medidas deste ilustrado governo, regadas a perfil do aluno, davam conta delas no ovo….”

Com passagens deselegantes para os peticionários, só faltou dizerem, como um certo diretor, que quem faz petições e requerimentos é desordeiro (porque afinal perturba a santa paz podre medíocre em que nos mergulharam……).

O texto tem mesmo a ousadia de sugerir que quem se queixa disso (a inexistente violência e a imaginada indisciplina) inventa porque as medidas do Governo são maravilhosas, visão panglossiana a que só falta um “está tudo no melhor dos mundos.”

8 anos destas fantasias e o ministro saltou para o grande caldeirão de PN Santos na expetativa de continuar a influenciar políticas.

Se continuar este corte entre o real, que vivemos nas salas e corredores, e as fantasias delirantes da 24 de julho, onde vamos parar?

Já em contagem decrescente rumo à dissolução anunciada, o Parlamento irá ainda ter oportunidade de apreciar a petição de Luís Sottomaior Braga e mais de oito mil outros subscritores contra a violência escolar. O tema já motivou por aqui vários posts, pelo que evitarei repetir-me, remetendo os leitores eventualmente interessados para o que escrevi aquando da entrada da petição nos serviços da Assembleia da República.

Deixo também os links para os pareceres sobre o tema em discussão que diversas entidades e organizações fizeram chegar ao Parlamento. Tal como Luís Braga, destaco o palavrório do ministro, uma daquelas pessoas que só reconhece os problemas que ele próprio inventa e só aceita as soluções que congemina na sua cabeça. Em negação da realidade, o “amigo das escolas e dos professores”, o ouvidor da “voz dos alunos” insiste no discurso propagandístico, oco e demagógico, cada vez mais desfasado do que se passa nas escolas.

E, ainda, uma nota final: apesar de expressamente convidados para o efeito, nem o Conselho das Escolas, nem a ANDE nem a ANDAEP emitiram qualquer parecer sobre o teor da petição. Nenhuma das organizações que asseguram a representação institucional e corporativa dos directores escolares, e que habitualmente gostam de se fazer ouvir, se quis pronunciar sobre a violência escolar. Será que o assunto não interessa nem preocupa os senhores directores? Ou por não sentirem o problema nas suas escolas – ou nos seus gabinetes – preferem ignorar que há escolas onde a violência é real – e pronta a explodir a qualquer momento?…

Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo

Associação Nacional de Municípios Portugueses

Confederação Nacional das Associações de Pais

Conselho Nacional de Educação

Federação Nacional da Educação

Federação Nacional de Professores

Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais

Ministro da Educação

Sindicato de Todos os Profissionais da Educação

Xenofobia e racismo nas escolas portuguesas

Pais e mães brasileiros que se mudaram para Portugal para dar aos filhos educação de qualidade têm encontrado uma rotina de abusos verbais, violência física e maus-tratos nas escolas de lá.

As histórias reunidas nesta reportagem não são apenas registros de diferenças culturais. Envolvem crianças amarradas a cadeiras, professores ameaçando alunos com golpes de régua na cabeça e agressões entre estudantes, sem que a direção das escolas proteja os jovens.

Certas situações viraram casos de polícia, o que fez pais abandonarem tudo e voltarem ao Brasil.

As acusações são graves e o cenário apresentado pelos pais brasileiros que desistiram de Portugal por causa dos alegados maus tratos aos filhos, na escola que os deveria proteger e integrar, é preocupante. Põe em causa a imagem de país hospitaleiro e de brandos costumes que gostamos de ter Portugal. Demonstra que ainda há muito por fazer no combate ao bullying e à violência escolar, realidades nem sempre evidentes, mas que nem por isso deixam de se manifestar. E os alunos novos, os mais tímidos, isolados ou desenquadrados da turma tendem, já se sabe, a tornar-se alvo privilegiado dos bullies. Há que dar mais atenção às interacções entre alunos, não só na sala de aula mas também nos recreios, balneários e outros espaços escolares onde os abusos, longe de olhares vigilantes de adultos, mais facilmente podem ocorrer.

Ressalve-se que a reportagem, feita por um órgão de comunicação brasileiro, não tem contraditório: baseia-se unicamente na versão dos pais, percebendo-se pelas entrelinhas que, aqui e acolá, poderá haver algum exagero nas acusações e uma certa incompreensão de como certas coisas funcionam num país diferente do Brasil. Mas deve haver sempre um sinal de alerta que não pode ser ignorado nestas situações, que é a percepção das crianças e adolescentes em relação à forma como estão a ser (mal)tratadas. Se há queixas, nem estas devem ser minimizadas, nem tão pouco devemos diabolizar a escola portuguesa e os seus profissionais ao mais pequeno problema que surja: construir um ambiente escolar saudável e seguro na escola é bom e desejável para todos: para alunos e suas famílias, tal como para o pessoal docente e não docente que aí trabalha diariamente.

Fica o link de uma notícia que merece ser lida na íntegra, e onde não falta sequer a lamentável intervenção de mestre Pacheco. O único português ouvido para a peça não perdeu a oportunidade para largar o habitual fel contra a escola e os professores portugueses:

Há uma tradição de violência nas escolas portuguesas. É triste dizer isso, mas a formação do professor é miserável. Ela reproduz o modelo social escolar do século 19.

Que a justiça lhe seja pesada

O Ministério Público (MP) acusou de homicídio qualificado, na forma tentada, o aluno de 16 anos que em junho agrediu com um ferro um professor numa escola de Felgueiras, no distrito do Porto, foi hoje revelado.

De acordo com a informação disponível no ‘site’ da Procuradoria-Geral Distrital (PGD) do Porto , o “Ministério Público considerou suficientemente indiciado que no dia 5 de junho de 2023, de manhã”, o arguido “munido com um ferro com 66 centímetros de comprimento desferiu com o mesmo uma pancada na cabeça do professor, fazendo-o cair ao chão”.

Após a pancada inicial, com o docente caído no chão, “o arguido, continuando na posse do referido ferro, desferiu-lhe várias pancadas, tentando atingi-lo na cabeça, enquanto dizia ‘eu mato-te’, só não o tendo conseguido atingir na cabeça em virtude de o professor ter tentado defender-se, agitando os braços e as pernas”.

Acusar de tentativa de homicídio um jovem de 16 anos pode parecer algo excessivo, mas como qualificar uma agressão selvática a um dos seus professores, com um ferro, ao mesmo tempo que lhe dizia isso mesmo: vou-te matar!?…

Que a justiça se faça, sabendo-se embora que costuma ser branda perante crimes juvenis. Tentar matar um professor – algo que eventualmente teria conseguido fazer, quando perante o colega caído no chão lhe continuava a bater com o ferro, se ninguém tivesse intervindo – é um crime de enorme gravidade, brutalidade que deve merecer o apropriado castigo, assinalando claramente que há crimes contra a vida e a integridade moral e física das pessoas que nenhuma sociedade fundada no respeito pelos direitos humanos pode tolerar.

O caso foi divulgado e comentado neste blogue, aqui, tendo voltado a ele uns dias mais tarde quando os nossos sensíveis governantes, que nunca tiveram uma palavra a dizer a respeito desta e doutras agressões selváticas a docentes, se declararam ofendidos e indignados com uns cartazes em que apareciam caricaturados com lápis espetados nos olhos e focinho de porco. Violência, queixavam-se eles. E sentido de Estado, noção do ridículo, já para não dizer vergonha na cara, quando os terão?

Petição contra a violência na Escola

Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia da República

Os cidadãos abaixo assinados apelam ao Parlamento para que promova o questionamento do Governo e debata o tema, para que se chegue à tomada de medidas executivas, regulamentares e legislativas, para abordar de forma mais eficaz o problema da violência e falta de segurança em meio escolar.

Na nossa opinião, a Assembleia da República deve promover um debate urgente, com uma perspetiva abrangente e suprapartidária, numa linha de entendimento entre os partidos e sem demagogias ou desvios politiqueiros, para abordar este assunto.

Continuar a ler…

Informa-me o Luís Sottomaior Braga que a Petição para que haja medidas contra a violência na Escola e reforço da Paz e Segurança acabou de dar entrada no Parlamento. Com 8300 assinaturas, ultrapassa confortavelmente o mínimo de 7500 que é exigido para a discussão em plenário, pelo que o tema da violência escolar deverá ser incluído, em breve, na agenda dos trabalhos parlamentares.

Apesar da fama de país de brandos costumes, a violência escolar é um problema que continua enquistado no sistema educativo português, sem que, ano após anos, sejam tomadas medidas efectivas para o enfrentar. Na verdade, prefere-se frequentemente ignorar ou minimizar as situações concretas – bullying entre alunos, ameaças de alunos e pais a professores e funcionários e, de quando em vez, ofensas verbais e agressões físicas a alunos e profissionais de educação – caracterizando-as como “actos isolados” e desculpabilizando os responsáveis pela violência.

Na realidade, o que vemos demasiadas vezes é o insulto, a ameaça e a agressão tornarem-se crime sem castigo, quão fácil se torna, no nosso país, atribuir as culpas à infância sofrida ou à família disfuncional, à perturbação mental do aluno ou ao professor que não soube lidar com ele correctamente e portanto, de alguma forma, “mereceu” os maus tratos que sofreu. Acima de tudo, nada de divulgar publicamente tais “actos isolados”, pois isso compromete a “imagem” que se quer dar da escola e/ou agrupamento, a de comunidade pacífica e inclusiva onde todos convivem exemplarmente. Quanto ao ministério, que poderia ter aqui uma intervenção decisiva, assumindo sem contemporizações a defesa incondicional de todas as vítimas da violência em meio escolar, é o primeiro a não querer saber do que se passa – a não ser que o caso acabe na esquadra de polícia ou na urgência do hospital, pois aí torna-se impossível negar as evidências.

Soluções fáceis não surgem com um passe de mágica, mas também não passam, nem pelo nada fazer, nem pela criação de mais um observatório, unidade de missão ou grupo de trabalho para ir uma vez mais estudar e meditar sobre o assunto. Talvez a discussão pública, aberta e sem tabus, do problema da violência escolar na casa da democracia, seja o melhor ponto de partida: permite pelo menos reconhecer que o problema existe, primeiro passo antes de partir em busca de soluções que previnam a violência, punam e desencorajem os agressores e protejam as vítimas.