Com essa mudança de paradigma atribuída à avaliação de desempenho docente, restringiu-se o acesso aos patamares superiores da carreira para a maioria dos docentes, independentemente das suas competências, e originou-se um descontentamento generalizado nas escolas, com repercussões diretas nos alunos. Porque é que eu hei-de me esforçar se ao fim ao cabo a valorização do meu esforço não é tida em conta? Nesse sentido, ao longo dos últimos quase vinte anos, várias greves e manifestações refletiram a insatisfação dos professores em relação a esse sistema. Neste momento, a avaliação dos professores, ao invés de promover o desenvolvimento profissional e a qualidade educativa, apenas impõe limitações na progressão na carreira e cria desconfiança entre pares, sendo um dos maiores promotores da degradação do clima organizacional.
Se podemos aceitar que a ideia de avaliação de desempenho pode trazer benefícios à qualidade geral do ensino, não podemos ficar calados relativamente a este modelo, que não cumpre nenhum dos requisitos para o qual dizem ter sido criado. Para além disso, ainda foi acrescentado o sistema de quotas, que agudizou o ambiente de descrença e descontentamento entre os professores, impactando diretamente a qualidade do ensino oferecido aos alunos.
Com o seu partido finalmente instalado no poder, Alberto Veronesi revisita o tema da avaliação do desempenho docente (ADD), pedindo ao novo governo a reforma de um modelo de avaliação excessivamente burocrático, punitivo e vexatório, que penaliza injustamente os professores e cria mau ambiente nas escolas. Mas que tem servido, aparentemente bem, os interesses dos governantes de diversas cores: sucessivos governos acomodaram-se às regras impostas ainda no tempo de José Sócrates e, significativamente, nenhum sentiu necessidade de as alterar. A verdade é que a ADD tem funcionado como um garrote eficaz às progressões na carreira, tendo mantido dezenas de milhares de professores a marcar passo na entrada para o 5.º e o 7.º escalão e poupado, com isso, milhões de euros ao orçamento da Educação.
Veronesi apresenta algumas ideias que deveriam inspirar uma nova ADD, construída em diálogo com os professores e não contra eles, como sucedeu com o modelo ainda em vigor. Mais focada no efectivo desenvolvimento de competências pedagógicas e científicas do que na “caça ao crédito”. Adaptada aos contextos, necessariamente diversificados, em que professores de diferentes disciplinas e níveis de ensino desenvolvem a sua actividade, em vez de padronizar práticas e critérios avaliativos. Que contribua para o desenvolvimento profissional dos professores em vez de os penalizar e desmotivar.
Pela minha parte, pouco adepto de reformismos à moda do PSD, vou ainda mais longe: há um erro de base na concepção da actual ADD, que é a perseguição de uma mítica excelência no desempenho profissional. Ora isto cai pela base quando se definem quotas para as excelências que cada escola ou agrupamento está superiormente autorizada a albergar. E gera um legítimo sentimento de insatisfação e revolta: se só alguns merecem ser considerados muito bons ou excelentes, então esses que trabalhem!
Mais importante do que detectar os desempenhos meritórios, seria identificar os factores que comprometem o desempenho de alguns professores, pois é isso que coloca em causa a qualidade da escola pública e das aprendizagens dos alunos. Factores que podem residir nos próprios professores, que deverão ser apoiados e ajudados a melhorar, mas que muitas vezes têm a sua origem em causas relacionadas com a distribuição de serviço, a organização e o ambiente escolar.
Na elaboração do seu relatório de auto-avaliação, o docente deveria sentir-se à vontade para descrever as suas dificuldades, as suas falhas e o que necessita para evoluir profissionalmente. Em vez disso, um sistema perverso obriga-o ao auto-elogio, omitindo o que possa desagradar ao avaliador e enaltecendo, exagerando até, as suas realizações. A avaliação deveria ser holística, implicando a organização escolar e o trabalho colaborativo entre pares, em vez de pautada pelo individualismo e o secretismo. Orientada, não para termos professores mais baratos, mas sim melhores escolas com melhores professores!