O fim dos exames nacionais, a revisão do regime de provas de aferição e a introdução de uma avaliação contínua são os três principais temas de um Projeto de Resolução, que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) entrega esta quinta-feira na Assembleia da República.
Tendo como objetivo acabar com desigualdades e considerar a “situação de cada aluno face aos conhecimentos ministrados, com vista ao estabelecimento de estratégias de consolidação e recuperação adequado às necessidades de cada um”, o projeto pensado pelo partido comunista para as escolas nacionais quer incentivar “a melhoria do processo de ensino-aprendizagem” e “a inclusão efetiva de todos os estudantes”.
No documento a que o DN teve acesso, o PCP insiste na valorização da avaliação contínua que, no entanto, exige “uma política de investimento público, valorização sociolaboral dos seus profissionais, criação de condições de estabilidade e previsibilidade na organização e desenvolvimento do trabalho”, que é “contrárias às que têm vindo a ser impostas por sucessivos governo”.
Isto porque, segundo o partido, a desvalorização da avaliação contínua é um dos motivos que geram uma “perspetiva elitista de acesso ao conhecimento e à cultura”, que favorecem o ensino privado.
Coerente com uma posição de décadas, o PCP manifesta-se, neste projecto de resolução, contra a realização de exames no ensino básico e secundário. Sublinhando a perspectiva selectiva e elitista que lhes estará subjacente, os comunistas defendem a avaliação contínua numa escola mais inclusiva, o que pressupõe reforço dos meios necessários à sua superação das dificuldades dos alunos e ao efectivo sucesso das aprendizagens.
Concordo, no plano dos princípios, com a maioria das críticas que se fazem aos exames: produzem uma avaliação parcial e incompleta dos estudantes; tendem a condicionar e por vezes a empobrecer o ensino e aprendizagem, sobrevalorizando as disciplinas e as matérias que serão alvo da avaliação externa; uniformizam e padronizam a avaliação, sem atenção à diferenciação pedagógica, fundamental para responder aos desafios da diversidade e da inclusão no ambiente escolar.
No entanto, tenho as minhas reservas relativamente à proposta de supressão de todos os exames. Depois do evidente exagero dos tempos de Nuno Crato, creio que se encontrou uma solução equilibrada com as duas provas finais a realizar no final do 9.º, do 11.º e do 12.º anos. Provas com consequências para a aprovação final dos alunos, e que por isso devem ser levadas a sério, mas sem terem o mesmo peso que é dado à avaliação contínua.
A verdade é que, num quadro de maior autonomia pedagógica que é dado às escolas – que permite reorganizar o currículo e estabelecer critérios próprios de avaliação, dever-se-á sempre, de alguma forma, aferir se as aprendizagens essenciais definidas a nível nacional estão a ser efectivamente alcançadas. Claro que é fácil dizermos e acreditarmos que sim, que tudo corre bem em toda a parte, que todos os alunos aprendem e que para todos os problemas que surgem se encontram soluções à medida. Na verdade, sabemos bem que não é isso que sucede, e a avaliação externa é precisamente a forma de detectar as dificuldades.
O PCP quer acreditar que numa escola sem exames todos podem progredir ao seu ritmo, dando o seu melhor sem serem comparados depreciativamente com os colegas mais bem sucedidos. A intenção é boa, mas o que a realidade demonstra é que, sem um ponto de referência claro e bem visível, a tendência é sempre para o facilitismo avaliativo. E o reforço do investimento público, num quadro de melhoria de resultados, é uma miragem…
Na verdade, o sucesso administrativo, fácil de obter quando não há uma certificação externa das aprendizagens, acaba por ser uma armadilha: se mesmo sem meios adequados, os alunos têm bons resultados, isso significa que as escola podem afinal dispensar os recursos que insistentemente reivindicam.
Há muita coisa que pode e deve ser discutida no que diz respeito à avaliação externa, a começar pelo actual modelo de provas de aferição, imposto sem discussão e a revelar evidentes desajustamentos, e a acabar no exames do Secundário, que ao fim de tantos anos continuamos se perceber bem para que servem, se para certificar e qualificar as aprendizagens deste nível de ensino, se para ordenar e seleccionar os futuros estudantes do ensino superior, tarefa que as universidades se recusam a fazer. Discuta-se também a praga dos “exames a nível de escola”, uma fonte de burocracias e complicações que se atira para cima dos professores para não se ter de assumir a evidência de em alguns percursos escolares deveria haver dispensa das provas. Mas não me parece que a abolição pura e simples de tudo o que seja avaliação externa possa melhorar globalmente o sistema educativo ou servir melhor os interesses dos alunos.
Finalmente, se a proposta do PCP não é nova, o timing do seu reaparecimento é o menos recomendável. Ao fim de sete anos de costismo educativo, com uma série de reformas e experimentalismos polémicos no terreno, sem que nunca tenha sido feita uma avaliação séria e isenta da flexibilidade curricular, do regime dito de inclusão, da pseudo-autonomia das escolas, do MAIA, do Ubuntu e de tantas outras pedagogias contrafeitas que têm sido promovidas, acabar com os exames seria a melhor prenda para os responsáveis do actual desgoverno na educação, que dessa forma nunca seriam confrontados com os resultados das suas políticas.
Se gostou de ler, partilhe...
Gostar disto:
Gosto Carregando...