O estudo sobre a saúde psíquica e o bem-estar de alunos e professores hoje divulgado – versão integral aqui – surge como a primeira tentativa de caracterizar, de uma forma sistemática, uma realidade durante demasiado tempo desprezada pelos responsáveis educativos. Durante décadas, a presença de psicólogos nas escolas resumiu-se praticamente ao desenvolvimento de programas de orientação escolar e profissional e, pontualmente, a algumas avaliações psicológicas e encaminhamentos que iam sendo solicitados pelos professores.
As prioridades eram outras, e recordo um passado não muito distante em que existia no agrupamento em que trabalhava, então com perto de um milhar de alunos, apenas uma psicóloga ao serviço. Em contrapartida, existiam três professores bibliotecários. Hoje os tempos felizmente mudaram, e espero que o discurso obsessivo do novo ministro em torno da saúde mental se traduza, não em mais burocracias e inutilidades tipo-ubuntu, mas num reforço consistente e continuado de psicólogos e terapeutas nos quadros das escolas e agrupamentos. Que termine de vez a farsa das “capacitações” e se assuma a necessidade de apostar em apoio especializado e personalizado para quem efectivamente precisa.
O estudo divulgado aponta também sinais de desgaste psicológico entre os professores: cerca de metade revela sintomas como tristeza, irritação ou dificuldades para adormecer. Algo que não é novo: investigações anteriores já haviam notado que esta é uma profissão que nos adoece, sendo que uma grande parte das causas desse mal-estar e sofrimento decorre directamente, não dos escolhos próprios da profissão, mas da forma como os professores são tratados por quem os tutela. Mas quando se chega a este ponto, invariavelmente, os estudos promovidos pelo ME preferem focar-se na gestão que é feita ao nível das escolas, evitando deliberadamente questionar a pressão ministerial ou as políticas educativas.
Uma última nota para recordar a necessidade de não isolar os problemas de saúde mental do seu contexto social, escolar e familiar. Se uma criança vai para a escola com fome, se um professor trabalha durante décadas, em situação precária, a 100 ou 200 quilómetros de casa, ou se uns e outros tentam sobreviver diariamente numa escola acossada pela indisciplina e a violência, é evidente que estas situações terão reflexos na sua saúde mental. Qual a solução para estes problemas, e para muitos outros que derivam directamente da vida difícil e complicada que muita gente tem? Umas sessões de psicoterapia de grupo, apimentada com filosofia ubuntu? Ou identificar e atacar as verdadeiras causas dos problemas que nos desgastam ao ponto de nos deixarem doentes?…
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Corroborando inteiramente mais um certeiro texto do António, gostaria de citar o testemunho de uma colega. Decidiu avançar com a reforma antecipada, mesmo com as graves penalizações que se sabe, pois já não aguentava mais. Confessou-me que o trauma era tão profundo que nunca, mas nunca mais na vida sequer passou perto da escola. Procurava sempre outros caminhos, pois a simples aproximação causava-lhe um mal estar tão grande que preferia dar uma volta muito maior. É o-país-que-temos-
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