O brinquedo novo do MEC

O MEC disponibilizou no site Infoescolas uma base de dados com informação estatística sobre os a avaliação no ensino secundário feita pelas escolas de todo o país.

Esta obsessão com a estatística não é nada de novo da parte de Nuno Crato e da sua equipa, mas aqui parece haver uma novidade: já não se ensaia a comparação, demasiado batida, entre avaliação externa e interna. Faz-se, em vez disso, uma análise um pouco mais sofisticada que determina os “resultados esperados” de cada escola com base nos resultados dos seus alunos nos exames nacionais. É com estes valores que se comparam as médias das avaliações realmente atribuídas pelas escolas aos seus alunos ao longo de vários anos.

Sem grande surpresa, o que se verifica é que há um grupo de escolas, quase todas privadas e quase todas do Norte, que consistentemente dá notas mais altas aos seus alunos do que o esperado. Outro grupo, menos numeroso e formado maioritariamente por escolas públicas, atribui notas inferiores ao que seria de esperar. O Público analisou os resultados e apresentou a seguinte tabela das “escolas desalinhadas”:

Escolas-desalinhadas[1]

Nada disto é novidade, e certamente que em Braga, no Porto ou em Gondomar todos os interessados sabiam e sabem o que fazer para assegurar aos filhos uma média final no secundário que lhes permita entrar nos cursos superiores de primeira escolha. Haja dinheiro para as propinas do colégio, que a “cultura da escola”, o “projecto educativo”, os critérios de avaliação próprios ou o que lhe queiram chamar, tratarão de assegurar o que for preciso.

Quanto ao resto, o MEC prosseguirá as suas intermináveis e sigilosas “averiguações” e as escolas privadas inflacionadoras de notas continuarão a explorar o seu modelo de negócio bem sucedido e ao qual não têm faltado clientes. Porque na verdade o que está aqui fundamentalmente errado não são os desvios em relação às médias, que existirão sempre e decorrem naturalmente da diversidade de contextos sociais e educativos, Aliás, um ministério que diz defender a descentralização e a autonomia, que quer entregar a gestão escolar às câmaras, que admite que 25% do currículo possa ser definido localmente, que chegou a anunciar a sua auto-implosão, deveria estar preparado para aceitar “desalinhamentos” ainda maiores do que estes que agora se verificam.

O que está profundamente errado não é a diversidade de critérios com que os alunos são avaliados em diferentes escolas, mas sim o facto de essa avaliação influenciar a graduação dos estudantes no acesso ao ensino superior. Nos cursos mais procurados, aqueles onde uma décima a mais ou a menos podem determinar a sorte de um aluno, por mais aplicado que seja, a avaliação mais ou menos exigente das escolas e dos professores do secundário põe efectivamente em causa a equidade no acesso.

A avaliação de um aluno no final do secundário avalia o que esse aluno fez e aprendeu no secundário, não define por si só as aptidões que possa ter para este ou aquele curso superior, muito menos quando o processo é eliminatório, ou seja, quando a selecção implica que a entrada de uns deixa outros de fora.

A única forma de resolver isto é fazer o que há muito deveria ter sido feito, tornar o ensino superior responsável pelo processo de admissão dos seus alunos, definindo não só os pré-requisitos, como nalguns casos já faz, mas também o peso das notas dos exames nacionais ou de outras provas que as próprias instituições decidissem organizar para seleccionar os candidatos aos cursos mais pretendidos.

Mas este continua a ser um tema-tabu, pois a situação que temos actualmente, sendo geradora de injustiças, convém a demasiada gente. E o computador ministerial, que nos garantiram ser incapaz de colocar em Setembro uns milhares de professores contratados nas escolas, tal a “complexidade” e o “gigantismo” da operação, irá pela mesma altura distribuir, pontualmente, mais de cinquenta mil candidatos pelas escolas superiores.

2 thoughts on “O brinquedo novo do MEC

  1. António,

    Ainda há poucos dias o presidente do CRUP dizia que o atual sistema de acesso está consolidado, não vendo razões para alterações. Pelo lado das universidades não vamos lá.

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    • Pois, não me parece que as universidades queiram mudanças. O actual sistema não lhes traz trabalho nem responsabilidades, é tão bom. E perante as injustiças e iniquidades evidentes podem sempre criticar os outros.

      A autonomia que lhes interessa é a de gerirem o orçamento como entenderem e contratarem quem querem. As chatices, dispensam.

      E como a cúpula do MEC é dominada por universitários…

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