Cinco anos de Escola Portuguesa

A Escola Portuguesa faz hoje cinco anos. Uma idade razoável, no mundo blogosférico, onde uma elevada percentagem dos blogues acaba por ter existência efémera. Pela minha parte, quando por aqui escrevi os primeiros posts, a 19 de Maio de 2015, não saberia dizer se esta experiência duraria um mês, um ano, ou se prolongaria mais além.

Sem ser isto uma celebração, ocorreu-me revisitar o primeiro post, movido pela curiosidade de recordar o que dominava, há cinco anos atrás, a actualidade educativa. Estávamos assim…

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Era a recta final do mandato de Nuno Crato à frente do ME e a política de responder com exames e mais exames a todo e qualquer problema educativo persistia. Há cinco anos atrás, eram as provas finais do primeiro e segundo ciclo do ensino básico, realizadas ainda antes de terminarem as aulas, que marcavam o calendário escolar nesta altura do ano. E havia alunos em casa, não por causa de qualquer pandemia, mas porque as salas onde costumavam ter aulas ou os professores que os ensinavam estavam ocupados com outros meninos que iam ser avaliados.

Os tempos mudaram, mas entre um passado ainda não tão distante e este presente pandémico, a realidade não é assim tão distinta. Na verdade, há cinco anos punham-se as escolas a trabalhar a meio gás para haver condições para a realização de exames. Hoje, retomam-se parcialmente aulas presenciais, alegadamente para preparar os alunos… para os exames que aí vêm.

Exames, o alfa e o ómega da política educativa. Bem vistas as coisas, parece que não mudámos assim tanto…

Alunos portugueses lêem pior

Saíram os resultados do PIRLS 2016, o teste internacional que avalia as competências de leitura dos alunos do 4º ano de escolaridade.

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Em linhas gerais:

  • Portugal regista uma descida acentuada no ranking de países, passando de 19º a 30º num grupo de 50;
  • Ainda assim, a pontuação obtida – 528 – é estatisticamente superior ao valor médio de referência da escala PIRLS – 500 – e é igual ou superior ao obtido por países como Espanha, França ou Bélgica;
  • Desapareceu a tendência, notada na generalidade dos países e também entre nós, em 2011, de o desempenho das raparigas ser significativamente superior ao dos rapazes.

Seguir-se-ão as análises, as opiniões e as reflexões sobre um assunto que ocupará a actualidade educativa nos próximos dias e ao qual, certamente, voltarei.

Para já, apenas uma nota importante para balizar o jogo de acusações e de culpas que costuma acompanhar este tipo de debates: os alunos participantes nestes testes realizados em 2016 foram as cobaias do modelo educativo implementado por Nuno Crato, com as metas de aprendizagem e os seus múltiplos descritores a formatar a prática lectiva e avaliativa e tendo os exames finais do 4º ano como corolário.

A avaliação PIRLS 2016 é, em larga medida, a avaliação da política educativa do governo PSD/CDS no que diz respeito à leitura, à compreensão e ao domínio da língua.

 

Visitas de estudo novamente comparticipadas

visita-museu.gifEstávamos em 2013, a ordem era para cortar despesa pública e o orçamento da educação foi um dos alvos privilegiados dos cortes. Enquanto se fazia vista grossa, como na altura se desconfiava e agora se confirma, ao trânsito de milhões de euros em direcção aos paraísos fiscais. Foi nessa altura que desapareceu, dos orçamentos das escolas e agrupamentos, a rubrica destinada a comparticipar o custo das visitas de estudo aos alunos carenciados, e que a partir daí deixaram de acompanhar os colegas nas saídas se as suas famílias não pudessem pagar o custo integral das deslocações.

Medida antipedagógica, injusta e discriminatória, esta decisão do ministério de Nuno Crato demonstrou que, ao contrário do que dizia na altura a propaganda governamental, a política de austeridade se fazia contra os que menos tinham. Mas estava perfeitamente dentro dos limitados parâmetros do cratismo educativo, centrado em conhecimentos ditos estruturantes, aprendizagens padronizadas e currículos prescritivos: onde há aqui lugar para visitas de estudo, vistas provavelmente como meros “passeios” sem qualquer relevância pedagógica e ainda por cima geralmente promovidas por disciplinas pouco “estruturantes” como a História, a Geografia ou as Ciências?

Agora, a boa notícia é que as comparticipações aos alunos dos escalões A e B da ASE que participem em visitas de estudo serão repostas já nos orçamentos escolares em 2017. A parte má é que, ocorrendo as visitas de estudo geralmente no 1º e no 2º período, não sei se haverá ainda muitos alunos em condições de beneficiar de uma medida que chega tardiamente às suas escolas.

O Ministério da Educação vai retomar o pagamento das visitas de estudo aos alunos mais carenciados, do 5.º ao 12.º ano de escolaridade. As visitas deixaram de ser pagas em 2013 durante o resgate financeiro. Esta é outra das medidas já anunciadas para entrar em vigor a partir do próximo ano letivo, confirmou ao i o gabinete de Tiago Brandão Rodrigues. De acordo com o Orçamento do Estado para 2017, «é reposta a comparticipação para as visitas de estudo programadas no âmbito das atividades curriculares», aos estudantes que fazem parte dos escalões A e B da Ação Social Escolar (ASE), respetivamente em 100% e 50 % do valor total. O custo de cada aluno numa visita de estudo é, no mínimo, entre 8 e 10 euros, dizem as escolas. Neste valor está incluído o transporte, o seguro escolar e as entradas nos locais de visita. A alimentação fica a cargo dos pais. Fora da comparticipação da ASE ficam os alunos do pré-escolar e do 1.º ciclo (do 1.º ao 4.º ano), cujas visitas são apoiadas pelas autarquias.

Currículo ao minuto

minutos.jpgSe há algo pacífico e consensual entre a generalidade de alunos e professores do 2º ciclo (e também do 3º) é que as aulas de 90 minutos são, na maior parte das disciplinas, demasiado longas e com muito menos produtividade do que duas de 45 ou 50 minutos. No entanto, como a profissão docente é contada ao minuto, se as escolas exercerem a “autonomia” e regressarem às “velhas” aulas de 50 minutos, há depois minutos que não chegam e horários que desaparecem e a regra é deixar tudo na mesma porque, se umas têm 90 e outras 50 (ou mesmo 45) é uma confusão de entradas e saídas e não sei o que mais.

A liberalização dos horários escolares foi uma das muitas asneiras do ministro Nuno Crato, na altura aplaudida por muitos que pensaram que, dando liberdade às escolas para organizarem o currículo conforme entendessem, tudo iria ser possível fazer. Na verdade, o que Crato fez foi manter uma mancha horária, para os alunos do básico, assente nos tempos de 45 minutos, enquanto os professores têm horários que funcionam em múltiplos de 50 minutos. Ora isto não iria bater certo, ou de um lado ou de outro, pelo que os minutos de compensação teriam sempre de surgir em qualquer lado.

Por outro lado, não se pode pensar que se substitui simplesmente uma aula de 90 minutos por duas de 50 – é que isto vai dilatar a mancha horária dos alunos, que já se considera actualmente excessiva, e fazê-los estar ainda mais tempo em aulas. Pelo que a passagem dos 45 para os 50 minutos vai obrigar a retirar dois ou três tempos do horário dos alunos – e as escolas a decidir quais as disciplinas que, dentro dos limites impostos legalmente, irão ser sacrificadas.

As possibilidades abertas pelo Decreto-Lei n.º 139/2012 permitiram a muitas escolas, adeptas das aulas de 50 minutos, passar a organizar os horários desta forma, enquanto outras, por convicção, por comodismo, ou simplesmente por opção realista pelo mal menor, mantiveram a matriz curricular assente nos blocos de 90 minutos.

Não por acaso, a maioria das escolas que optaram pelos 50 minutos são escolas secundárias, ou agrupamentos comandados por uma escola secundária: tendo este nível de ensino um currículo com menos disciplinas e tendo estas maior carga horária, é mais fácil a conversão para tempos de 50 minutos sem distorcer muito o equilíbrio entre as diversas disciplinas.

Já no 2º e sobretudo no 3º ciclo, passar para aulas de 50 minutos implica que muitas disciplinas passem a ter apenas 100 minutos semanais em vez dos actuais 135, enquanto outras passam dos 135 para 150 minutos. E esta minutização, como lhe chama Paulo Guinote, é inevitável, pois se assim não fosse, e tendo em conta o elevado número de disciplinas que existem entre o 7º e o 9º ano, o tempo escolar seria alongado excessivamente.

Mas há uma alternativa simples, enquanto não se fizer a reorganização curricular que, depois das aulas de 90 minutos inventadas por Marçal Grilo e a sua secretária de Estado Ana Benavente e das complicações acrescidas que lhes acrescentou Nuno Crato, me parece inevitável para um currículo ajustado às necessidades dos alunos e das escolas do século XXI.

Essa alternativa consiste simplesmente em desdobrar os blocos de 90 minutos, em todas as disciplinas onde não se vêem vantagens pedagógicas na sua utilização, em meios-blocos de 45m. Não há diferença significativa entre uma aula de 50 ou de 45, em termos de duração, pelo que me faz imensa confusão ver colegas que contestam as aulas de hora e meia não tomarem a iniciativa de pedir que lhes organizem o horário em tempos de 45 minutos.

Menos apoios para alunos com NEE

As escolas públicas perderam quase 70% dos técnicos para trabalho com alunos com necessidades educativas especiais (NEE) entre 2010 e 2015, revela o relatório do Estado da Educação 2015, do Conselho Nacional de Educação (CNE), divulgado neste sábado.

Segundo o relatório, a maior diminuição foi no número de psicólogos, que de 1584 em 2010-2011 passaram a 489 em 2014-2015. De uma forma geral, entre terapeutas ocupacionais, terapeutas da fala, fisioterapeutas, psicólogos e intérpretes e formadores de língua gestual, as escolas públicas do território continental perderam em cinco anos quase 70% de técnicos especializados no trabalho com alunos com NEE, passando de 2988 para 931 profissionais.

“Apesar do número de alunos com NEE ter aumentado no ensino regular, o número de técnicos afetos à educação especial [..] tem vindo a diminuir significativamente todos os anos”, nota o relatório do CNE.

As conclusões do relatório do CNE hoje publicado relativamente aos apoios dados aos alunos com NEE dificilmente podem deixar de ser lidas como um libelo acusatório da política do anterior governo, claramente orientada para a poupança e a concentração de recursos destinados aos alunos que precisam do apoio de profissionais especializados, nomeadamente psicólogos e terapeutas.

Ainda assim, ressalve-se que a notícia omite um ponto importante do problema: a redução abrupta do número destes profissionais nas escolas foi em parte compensada pela aposta nos CRI – Centros de Recursos para a Inclusão – organismos que distribuem, em função das necessidades, psicólogos, terapeutas e outros profissionais pelas escolas a que prestam apoio. Para uma visão completa da situação, há dois quadros do relatório citado que devem ser lidos em conjunto:

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Estes dados não desmentem, contudo, a ideia inicial: passou-se de cerca de 4500 profissionais envolvidos, em 2010/11, no apoio directo a alunos com NEE para menos de 3200 em 2014/15. Para um número crescente de alunos com necessidade de apoio, reduziu-se o número de técnicos ao serviço.

E mais: com a imposição da lógica dos mega-agupamentos e dos centros de recursos, profissionais que antes estavam em permanência nas escolas e cujo trabalho podia ser gerido em função das necessidades que iam surgindo, foram substituídos em grande parte por trabalhadores itinerantes, que dão apoios pontuais em casos previamente referenciados nas visitas semanais que vão fazendo às diversas escolas onde prestam serviço.

Sendo ainda cedo para avaliar o rumo do governo actual nesta matéria, há no entanto uma opção que foi já claramente assumida: promover e até de forçar a inclusão dos alunos com necessidades especiais, acabando com a redução das turmas a que pertencem se não frequentarem pelo menos 60% das aulas com os colegas. Ora mais inclusão precisa de mais meios e mais apoios, o que implica reverter a política de cortes nesta área que vinha a ser seguida pelo governo anterior.

A epidemia transmontana

tras-os-montes.jpgO distrito de Bragança concentra este ano mais de 10% de todos os professores destacados por doença do país. Dos 4160 pedidos deferidos pelo Ministério da Educação, 438 são para os 14 agrupamentos do Nordeste Transmontano. Uma situação que já criou polémica no ano passado. Ainda assim, este ano lectivo, o número de professores destacados nessas condições cresceu 20% face a 2015/16. São 76 os novos casos deferidos.

O maior aumento regista-se em Mirandela (28 casos) enquanto que o agrupamento Emídio Garcia, em Bragança, continua a ser o recordista, voltando a superar os cem professores ali colocados ao abrigo deste expediente. O pedido de destacamento é feito com base em relatórios médicos que atestam a doença e a necessidade de deslocação e/ou em documento da junta de freguesia que atesta a dependência exclusiva do ascendente, entre outros.

De acordo com informação prestada pelos próprios agrupamentos, há cinco em que o número de professores ali colocados em mobilidade por doença ultrapassa os 50 (Abade de Baçal, em Bragança, com 55, Miguel Torga, também em Bragança, com 57, Macedo de Cavaleiros, com 59 e Mirandela, com 63 e o recordista Emídio Garcia, em Bragança, com 104).

Ao contrário do que sucedia no tempo de Nuno Crato, um conhecido amante de estatísticas que nunca quis divulgar os números relativos à mobilidade por doença, vamos tendo agora alguma informação sobre a quantidade de professores colocados, a distribuição geográfica das colocações e o impacto que isto estará a ter nas escolas e agrupamentos de destino destes docentes.

Ora estes números, agora divulgados pelo Público, permitem, sobretudo no caso da região transmontana, fazer uma análise que vá um pouco para além das suspeições de fraude – uma discussão relativamente estéril, que esbarra sempre na correcção formal dos procedimentos e no veredicto inatacável do médico que atesta a doença.

Assim, pode começar por dizer-se, contrariando o título do post, que não há qualquer epidemia a atacar especialmente os professores e educadores transmontanos. O que há, isso sim, é uma zona pedagógica de dimensões monstruosas: distritos de Vila Real, Bragança e parte dos da Guarda e Viseu. Combinando isto com a dispersão e desertificação do interior, as fracas acessibilidades, o encerramento de escolas do 1º ciclo, a redução de vagas nas restantes e um corpo docente envelhecido, facilmente teremos professores do quadro com muitos anos de serviço a serem colocados a mais de cem quilómetros de casa.

A realidade é que, com uma política de quadros e concursos que promovesse a estabilidade e fosse proporcionando, como sucedeu durante décadas, a gradual aproximação dos professores às suas áreas de residência, criando ao mesmo tempo incentivos à fixação nos concelhos do interior, a colocação de docentes poderia há muito ter deixado de ser o problema nacional que todos os anos ressurge nesta altura do ano.

Concursos sem vagas ou pejados de vagas negativas, um crescimento desmesurado dos quadros de zona pedagógica enquanto se fechavam os lugares nas escolas e se aumentava insensatamente o âmbito geográfico daquelas, desequilíbrios da rede escolar provocados pela criação de mega-agrupamentos e pela expansão dos contratos de associação em determinadas zonas do país: tudo isto funcionou como bloqueio da mobilidade dos professores e da constituição de corpos docentes estáveis que muitas escolas ainda estão longe de conseguir ter.

Assim, para muitos docentes que sofrem de doenças incapacitantes ou se tornaram suporte imprescindível de familiares doentes, é o recurso à mobilidade por doença como única forma de conseguir uma colocação que não implique passar o ano de atestado médico. Que atrás destes venham outros, aproveitando de forma oportunista uma legislação nalguns aspectos demasiado permissiva, é uma daquelas inevitabilidades aliadas a um sentimento geral de impunidade entre nós, infelizmente, demasiado habituais.

Insucesso? É a política, estúpido!

Um simples gráfico retirado da mais recente síntese estatística publicada pela DGEEC é esclarecedor acerca da estreita ligação entre os ciclos políticos e a evolução do insucesso, traduzido na percentagem de alunos que todos os anos ficam retidos ou abandonam o sistema educativo.

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Como se pode constatar, regista-se desde o início do século uma tendência longa de descida lenta da taxa de insucesso e abandono, que se acentuou a partir de 2005 e durante a vigência do primeiro governo, com maioria absoluta, de José Sócrates, estabilizando nos valores alcançados em 2008.

Outra leitura curiosa é a correspondente ao governo do PSD/CDS e ao mandato de Nuno Crato, entre 2011 e 2015. Repare-se como, na sequência do discurso do rigor e da exigência, do combate ao alegado facilitismo e da introdução de mais exames no ensino básico, o insucesso aumentou em todos os níveis do ensino básico.

Perante a dimensão dos estragos, a segunda fase deste ciclo corresponde já a uma contenção de danos, com exames mais fáceis e a aposta no ensino vocacional para reduzir, na fase pré-eleitoral, os números negros do insucesso escolar. Mas é fácil verificar que os propagandeados êxitos da política educativa da direita mais não fizeram do que retomar níveis de retenção e abandono que ainda assim estão acima dos registados em 2011, quando chegaram ao poder.

O gráfico mostra também como o insucesso vai aumentando ao longo do ensino básico, atingindo-se os valores mais elevados no 3º ciclo. Mas o PNPSE define prioridades sobretudo ao nível do 1º ciclo, o que se por um lado se pode considerar uma perspectiva correcta, pois a intervenção precoce tende a ser mais eficaz e bem sucedida a longo prazo, por outro não nos deve fazer esquecer a necessidade de intervenção no 3º ciclo, onde os problemas serão bem mais complexos e difíceis de resolver.

Sai um registo criminal!

reg-criminal.JPGFoi finalmente disponibilizada a aplicação que permitirá às escolas e agrupamentos solicitar os registos criminais do respectivo pessoal docente e não docente, sem custos para este.

Claro que, para isso, têm os professores e funcionários de autorizar previamente o respectivo director a solicitar informação pessoal aos serviços do Ministério da Justiça. E isso faz-se acedendo à plataforma do SIGRHE (para o que é necessário ter um número de utilizador activo e respectiva palavra-passe) e solicitando o registo criminal que por lei é obrigatório para qualquer trabalhador que contacte com menores no exercício da sua profissão.

Recorde-se que no tempo do governo PSD/CDS, esta obrigação legal, então criada, vinha acompanhada, além da inevitável perda de tempo, do desembolso da módica quantia de cinco euros por cada professor, educador ou funcionário.  Terá sido perto de um milhão de euros de receita, só por conta de quem trabalha nas escolas públicas portuguesas. Uma verdadeira taxa sobre o trabalho dos profissionais da educação.

O actual governo prometeu simplificar e desonerar este procedimento. E cumpriu. O que me apraz, naturalmente, registar.

4160 colocados na mobilidade por doença

1dsp-20160127-people-001[1]Esta simples informação era, nos tempos de Nuno Crato, um verdadeiro segredo de Estado:

Ao CM, o Ministério da Educação esclarece que “foram colocados 4160 docentes em mobilidade por doença”, tendo “o ano letivo iniciado de forma tranquila e sem sobressaltos”.

O elevado número de professores em mobilidade por doença pode considerar-se um problema porque na generalidade dos casos se trata de colegas que foram colocados em escolas onde não havia horário para eles. Embora possam ser ocupados em tarefas úteis, não estão na verdade, e salvo casos excepcionais, a fazer aquilo que é a função primordial dos professores e pela qual são remunerados: leccionar.

Percebe-se assim o incómodo do anterior governo, noutras matérias paladino de muita informação, muitas estatísticas, muitos rankings, em reconhecer que o modelo de colocações ao abrigo da mobilidade por doença por ele criado contraria todos os princípios da gestão rigorosa do pessoal docente que se gabavam de saber fazer.

Mesmo considerando, e quero acreditar nisso, que a esmagadora maioria destes colegas estão em situações difíceis que nenhum de nós invejaria, resta o mal original de um modelo mal concebido, pois não prevê mecanismos, nem para colocar os professores em mobilidade nas escolas onde sejam mais necessários, nem para fiscalizar eficazmente os inevitáveis abusos que hão-de acabar por comprometer o usufruto de um direito àqueles que dele efectivamente necessitam.

Mudou o governo, mas a situação mantém-se: 4160 docentes representam cerca de 3,5% do universo aproximado de 120 mil docentes no ensino público não superior. E, talvez mais relevante, mas ainda não divulgada, será a distribuição geográfica destas colocações por doença. Sabemos que há distritos, como Bragança ou Coimbra, onde ocorrem verdadeiras epidemias, enquanto noutros lados o fenómeno é residual.

O que permite supor que o problema de fundo ultrapassa o mero estado de necessidade deste ou daquele professor e radica nas incongruências e idiossincrasias de um sistema de concursos, quadros, vagas e colocações que não é justo nem corresponde às legítimas expectativas de profissionais que, ao fim de décadas de serviço, ainda não alcançaram estabilidade e previsibilidade nas suas colocações anuais.

A gente que não lê

analfabetismo.JPGEm Portugal, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), existem cerca de 500 mil analfabetos, cerca de 5% da população. Entre eles, há 30 mil em idade ativa — uma minoria dentro de uma minoria que põe em xeque a tese vigente de que o tempo, e a morte, se encarregarão de resolver o analfabetismo em Portugal.

O analfabetismo persiste entre nós, e não afecta apenas a população mais idosa dos meios rurais e de menores recursos. A reportagem do Expresso apresenta vários casos de adultos relativamente jovens que, por variadas razões, não frequentaram a escola. Além das dificuldades em actos banais do quotidiano, como saber o preço dos produtos nas lojas ou apanhar o autocarro certo, não saber ler nem escrever impede-os de aceder a cursos de formação profissional ou obter a carta de condução.

E o problema persiste, pois faltam as respostas concretas às necessidades específicas destes adultos. Os vulgares cursos de educação e formação são pensados para a aquisição de competências profissionais, pressupondo que os formandos possuem a escolaridade básica. Mas quando a aprendizagem tem de começar a partir do zero, tanto o número de horas de formação se revela insuficiente como o tamanho das turmas se mostra excessivo para o tipo de acompanhamento de que estas pessoas necessitam.

São, assim, pertinentes as críticas à actuação negligente e irresponsável do anterior governo, que ao longo dos quatro anos da legislatura ignorou por completo este problema, desinvestindo fortemente na educação de adultos. E regista-se a promessa do governo actual de redesenhar a resposta educativa e formativa nesta área.

O presidente da Associação Portuguesa de Educação e Formação de Adultos (APEFA), Armando Loureiro, acusa o Ministério da Educação de tratar a formação de adultos como “um parente pobre do sistema de ensino” e de, atualmente, não ter qualquer oferta dirigida a estas pessoas: “A formação de adultos e cursos de alfabetização são praticamente inexistentes.”

Questionado sobre as ofertas que existem atualmente e confrontado com as críticas, o Ministério da Educação respondeu apenas que “no âmbito do Plano Nacional de Reformas este Governo está a preparar medidas que flexibilizam os programas de competências básicas para garantir que deles beneficiem mais pessoas”.