O referendo do senhor director

lider.jpg[…] Ainda que o diploma citado não o preveja, mas acreditando e defendendo que a real autonomia das escolas passa também pela participação coletiva na eleição dos órgãos e consequentemente daqueles que nos representam, é minha intenção abrir espaço a que todos possam expressar a sua vontade quanto à recondução d@ atual Diretor@ através de REFERENDO a realizar no próximo dia 26 de abril, entre as 8:30 e as 16:30, na Escola Sede. A mesa será constituída pelos seis Coordenadores de Departamento Curricular, 1 representante dos assistentes operacionais (Encarregado dos Assistentes Operacionais) e 1 representante dos assistentes e pessoal técnico (Chefe dos Serviços de Administração Escolar). A assembleia geral com direito a voto é constituída por todos os docentes e funcionários em efetivo exercício de funções no Agrupamento de Escolas XXXXXXXXXXXXXX.

Se o referendo pode ser um meio eficaz de concretização da democracia directa, aquela que já os Gregos antigos consideravam a melhor das democracias, a sua utilização selectiva, manipulatória e à margem do quadro legal estabelecido pode ser apenas uma tentativa de condicionar as decisões de terceiros no sentido mais favorável, não ao bem comum, mas aos interesses do promotor da consulta.

Neste caso, em que um director pretende influenciar o Conselho Geral do seu agrupamento na decisão sobre a sua recondução, o que vejo é a arregimentação de seis professores e dois funcionários não docentes, que durante um dia inteiro largam o seu serviço habitual para estarem ao serviço do senhor director, numa actividade que não se integra, nem no quadro das competências dos cargos que exercem, nem nos procedimentos legalmente previstos para a escolha ou recondução do director.

Não me parece uma forma de contornar limitações à vida democrática nas escolas, mas antes a tentativa de recriar, à margem da lei, uma democracia ao gosto do freguês. O director pretende confirmar, por via referendária, o apoio da maioria dos professores e funcionários, e pelos vistos não confia nos representantes destes, que tomam lugar no Conselho Geral, para fazer valer essa posição. Opta então por criar a “vaga de fundo” de que necessita para a sua entronização.

Não se percebe, num processo que pretende ser mais democrático e transparente do que o estrito cumprimento da legislação vigente, a necessidade do anonimato para a divulgação da iniciativa.

E nota-se a contradição entre o apelo a uma maior democracia nas escolas e a defesa dessa “suspensão da democracia” que é a sistemática recondução dos directores em funções em vez de se dar oportunidade a que apareçam novos candidatos ao lugar.

13 thoughts on “O referendo do senhor director

  1. Em relação ao comentário a esta iniciativa tenho a dizer que acho bastante curioso o apego ao “quadro legal” do modelo único de gestão, criticando iniciativas que lhe abrem brechas.
    Pobre Salgueiro Maia se tivesse pensado assim.

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    • Há algumas diferenças.
      Salgueiro Maia lutou pela liberdade e pela democracia, outros manipulam para conservar o poder.
      SM deu a cara pelo movimento dos capitães e pelos homens que comandava, não se acobertou no anonimato do director do agrupamento xxxxxxx.

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      • Mas essa não é a questão… a recondução deverá surgir DEPOIS do dito referendo e parto do princípio que – em boa fé – um resultado negativo levará @ candidat@ a não pedir a recondução.

        Entre pedir essa recondução sem ou com consulta do pessoal docente e não docente da escola, prefiro, naturalmente, COM consulta.

        E é bom que se note que eu sou parte de um Conselho Geral. Não me choca nada que me seja apresentado o resultado de um rteferendo deste tipo.

        Repito… o argumento do estrito cumprimento de um “enquadramento legal” com limitações democráticas a mim não sensibiliza.

        Quanto ao SM não me parece que tenha andado a anunciar ates do 25 de Abril o que ia fazer.

        Eu não publiquei o nome da pessoa porque já me chaga de chatices judiciais que outras pessoas nunca tiveram, porque raramente arriscaram e agora apontam o dedo a quem teve de andar a fazer centenas de km do seu bolso para se defender de acusações.

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  2. Percebo a ideia de “abrir brechas”, mas parece-me que o retorno puro e simples ao modelo anterior, do órgão de gestão eleito apenas por professores e funcionários não é defensável, e no fundo é isso que subliminarmente está presente nesta proposta calculista de referendo.

    A participação de pais e alunos do secundário será um dado adquirido em qualquer revisão do modelo de gestão. Dispensar as “forças vivas”, isso sim, seria muito positivo.

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  3. Gosto do último parágrafo, caro A. Duarte. Pelo que me apercebo, a inclusão das “forças vivas” no processo de eleição parece-me ser uma aberração.Vejamos: quem são , e que legitimidade têm, os chamados ” representantes da comunidade?Foram eleitos pela “comunidade” ? Quanto aos representantes da autarquia , apetece perguntar se estava no programa eleitoral do partido designar o professor A ou B para director , ou se reuniu a vereação ou a junta de freguesia com o mesmo fim (ironias) . O mesmo se diga relativamente aos representantes do”mundo empresarial”, sem desprimor. A que propósito um funcionário de uma empresa metalomecânica ou do supermercado lá da terra é convidado a pronunciar-se acerca de quem deve dirigir a escola?. Dizem-me que, por não estarem minimamente por dentro do assunto, ou por outras razões (atenção a estas “razões” !), estes membros do CG são facilmente seduzidos a…

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    • Os membros do CG podem ser tão seduzidos quanto quaisquer professores que apoiem tudo em troca de uma folga ou de um horário maneirinho… lá por isso…

      Agora que eu me lembro que desde 2008 me oponho a esta legislação com muito pouca gente a mover-se nesse sentido, é bem verdade.

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  4. Volto ao assunto. O tipo de comentário que me atrevi a fazer relativamente ao tema, estará – devo confessar – relacionado com a escassa informação que possuo. De facto, não me tenho apercebido da existência de grandes objecções vindas da parte dos verdadeiros entendidos e, por isso, serei eu que estou a ver mal “a coisa”. Pode ser que o autor desta página, com a lucidez e isenção que lhe reconheço, tenha uma palavra a dizer…

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  5. Um referendo é sempre marcado para obedecer à agenda de alguém ou algum grupo…
    Sei que há imenso receio que o “povo” se expresse… não vá ele defender algo que as elites “indesejem”.

    Mas eu gosto… seja à regionalização, à ivg… aos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, seja o que for.

    A teoria da delegação da soberania nos deputados/conselheiros comigo tem limitações…

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  6. Algumas notas breves ao que foi comentado:

    1. Tenho vindo a descrer dos referendos que, talvez com a notável excepção da Suíça, são em geral uma forma demagógica e manipulatória de fazer política. O problema fundamental das democracias há muito deixou de ser a questão da representatividade, é antes a captura da soberania por instituições supranacionais sem legitimidade democrática e tratados internacionais que assumem força de lei irrevogável nos países que os subscrevem.

    2. A questão do anonimato não a levantei como uma crítica aos bloggers que divulgaram esta iniciativa, mas do director que, se acha que está a fazer o que deve dentro da legalidade não deveria ter necessidade de se esconder. Mantenho que não é função de um coordenador de departamento andar a servir de mestre de cerimónias ao director presunçoso que usa as estruturas do seu agrupamento para servir fins pessoais.

    3. Quanto à doutrina dos que preferem estar dentro da gestão escolar para “abrir brechas”, ando a ouvi-la desde 2008, quando a maioria dos presidentes de conselhos executivos se reconverteram em directores, apesar de se dizerem contra o novo modelo de gestão. Que, quase dez anos volvidos, continua de pedra e cal…

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  7. Salazar também fez plebiscitos…..e chamou-lhes democráticos?

    Os portugueses conhecem mal a sua História. Culpa minha e dos meus colegas que a explicamos mal.
    Por exemplo, pouca gente entende a cautela presente que o nosso sistema democrático tem com referendos. Afinal o referendo é o povo a votar. Coisa boa portanto.
    Mas o nosso legislador constituinte obriga a que até um simples referendo numa junta de freguesia (por causa de um simples campo de futebol ou coisa do género) tenha de ser escrutinado pelo Tribunal Constitucional na sua pergunta e forma de realização.
    A explicação tem a ver com Salazar. Em 1933 fez aprovar a Constituição de 1933 (a que regeu a ditadura do Estado Novo) através de um plebiscito em que as formas de perguntar e de contar os votos eram bastante originais. E que naturalmente fez o “botas” ganhar o seu poder absoluto de décadas.
    O regime democrático ficou avisado quanto a essas coisas. Os que estudaram um mínimo de história também sabem como eram as “eleições” antes do 25 de Abril. Um levantamento que fiz aos processos eleitorais das escolas fez-me pensar que estamos a voltar a isso. As eleições legislativas ou autárquicas têm leis complexas e muito bem feitas que garantem a lisura do processo. Nas escolas brincou-se com essas normas e as consequências estão à vista.
    Dias depois de passarem 43 anos do 25 de Abril e 41 da entrada em vigor da Constituição (que ninguém contesta na sua forma de definir processos eleitorais) é triste ver que nas escolas a revogação dos seus princípios e pressupostos está naturalizada e consolidada.
    Porquê fazer referendos agora, se em 2007 ficamos quase sozinhos (uns quantos cromos, em que me incluía, a lutar contra a legislação que impede as eleições reais)

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    • Não se conhecendo – eu, pelo menos, não conheço – o contexto real do agrupamento em que o dito referendo se terá realizado, a única coisa que se pode concluir é que, como em todos os referendos, há um interesse calculista de quem o convoca e pretende obter determinados resultados.

      Sendo um processo à margem da lei vigente, ainda mais margem de manobra tem o director para definir ele próprio as regras do processo.

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