“Palermices” ou “greve a sério”?

© NUNO FERREIRA SANTOS

Afinal para que queremos sindicatos?

As lutas de há 14 anos continuam a ser as mesmas, juntando até mais problemas, como é o caso do tempo de serviço não contabilizado para progressão na carreira.

O modelo de gestão das escolas é o mesmo, deteriorando-se, a cada dia, o clima organizacional, os professores vivem inundados de burocracia, com níveis altíssimos de burnout, as quotas continuam a estrangular a progressão, os salários são quase o mínimo nacional e os sindicatos continuam em modo folclore.

Depois de seis anos em que foram totalmente coniventes com o Governo, salvo raríssimas exceções, como se durante esse tempo os problemas tivessem desaparecido, vemos agora ações pífias.

Se queremos ver os nossos problemas resolvidos, há uma imperativa necessidade de trocar estratégias folclóricas (cordões humanos, petições e outras palermices) por… greve a sério.

No Público, Alberto Veronesi passa em revista 14 anos de insucessos do movimento sindical docente. Depois das grandes manifestações de 2008, cujo único resultado palpável e persistente foi o fim dos titulares, persistem as quotas e outros entraves à progressão na carreira, não se recuperou a maior parte do tempo de serviço congelado, mantém-se uma ADD burocrática e punitiva, o regime de gestão unipessoal e os mega-agrupamentos corroeram a democracia nas escolas, os salários, sobretudo nos escalões iniciais e intermédios, são escassos e o trabalho, avassalador.

Se factualmente não contesto a análise de Veronesi, à qual Paulo Guinote, por sua vez, deu um enquadramento mais amplo e trouxe achegas oportunas, já os considerandos, pressupostos e conclusões de ambos suscitam-me algumas reservas, que tentarei sintetizar em breves notas:

1. Conviria antes de mais perceber a inexistência real dessa entidade mítica a que muitos insistem em chamar “os sindicatos”. Há muitos sindicatos de professores, é certo, mas nem eles são todos iguais nem todos os sindicalistas da mesma organização pensam e agem da mesma forma.

2. Da mesma forma, insistir na ideia de uma mítica “união” que nunca fará a força ou na dos muitos sindicatos aos quais “se perdeu a conta” é não perceber que a multiplicação de sindicatos foi uma estratégia de enfraquecimento dos sindicatos fortes e representativos existentes perseguida durante décadas pelo poder político. Há sindicatos que existem porque são emprego para a vida para gente medíocre que se cansou de dar aulas ou nunca gostou de o fazer: haja a lucidez de compreender que existem para dividir, apenas se representam a si próprios e nunca farão coisa alguma em prol dos professores.

3. Os sindicatos são a classe que representam e da qual emanam. Não gostamos dos sindicatos que temos da mesma forma que detestamos uma parte daquilo em que a classe docente se tornou. Olho à minha volta e não tenho problemas em reconhecer que não gosto de muito do que vejo: o conformismo, o oportunismo, o seguidismo que grassa nas nossas escolas, entre uma classe que, pela sua formação e cultura profissional, deveria ser, no seu todo, bem mais crítica, reivindicativa e interventiva. Mas claro que é sempre mais fácil criticar a inacção dos sindicatos do que enfrentar a hostilidade de colegas ou das excelentíssimas lideranças que pululam pelas escolas.

4. Sobre as “palermices”. Tornou-se um lugar-comum ridicularizar, na blogosfera docente, o “folclore” ou as “coreografias” não “dos sindicatos” em geral, mas daqueles que, cumprindo o seu dever, tentam manter acesa a luta quando os professores parecem desistir. Conquistar para os professores um espaço na agenda mediática quando todos os poderes instituídos conspiram para os silenciar. Estes não são “os sindicatos”. São, façamos por uma vez a justiça de o reconhecer, os sindicatos da Fenprof e, mais recentemente, o STOP.

5. Finalmente, a “greve a sério”: uma greve prolongada no tempo, ao estilo de tudo ou nada, “ou vai ou racha”, nunca se fez entre a classe docente, nem quando a união e o ânimo para lutar era incomparavelmente mais elevado do que nos dias de hoje. Serve de pouco invocar a greve às avaliações, quando todos sabemos que apenas se prolongou porque permitia diluir as perdas salariais para os grevistas. A verdade é que os professores não gostam, nunca gostaram de greves, e rapidamente desistem delas quando percebem que o seu custo é elevado e os resultados, incertos. Neste ano lectivo, tanto a Fenprof como o STOP publicaram pré-avisos de greve que permitiam aos professores, individualmente ou organizados a nível de escola, protestarem eficazmente contra situações lesivas, como o sobretrabalho ou as irregularidades no lançamento do ano lectivo. Quantos professores aderiram?…

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