Agora também vendemos rifas?

O documento foi ontem divulgado no blogue de Paulo Guinote e é demonstrativo de uma situação vergonhosa que nunca deveria ocorrer nas escolas portuguesas: lançam-se sorteios de rifas para angariar dinheiro destinado a adquirir equipamento tecnológico e software cuja aquisição, a ser necessária, deveria estar contemplada no orçamento do agrupamento.

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Claro que, se não fosse uma cultura escolar que há longos anos nos vem viciando nesta ideia de que devemos colaborar em iniciativas de recolha de fundos para ajudar a pagar visitas de estudo, jornais escolares, material didáctico e outros gastos sem cabimento orçamental, provavelmente os senhores directores pensariam duas vezes antes de “convidarem” os professores a fazer estas tristes figuras.

Podemos, de facto, apontar o dedo a directores sem vergonha na cara, que são incapazes de reivindicar para as suas escolas tudo aquilo a que os alunos têm direito para um ensino de qualidade. Que à subserviência perante as visitas ministeriais contrapõem o abuso e a prepotência na relação com os que tomam por seus subordinados.

Podemos e devemos denunciar a escassez de verbas com que têm sido contemplados os orçamentos das escolas em matéria de investimento e renovação dos equipamentos tecnológicos. A maioria do material instalado tem já uma década de vida, e uma substituição gradual e programada do que se estraga ou fica obsoleto seria mais racional e económica do que pesados investimentos que, se nada for feito, se tornarão inevitáveis num futuro próximo.

Podemos questionar o IGeFE e a IGEC acerca da legalidade deste verdadeiro saco azul que o director deste agrupamento aparentemente pretende constituir, e que não me parece que encontre base legal em qualquer regra ou procedimento de contabilidade pública. Será que passam factura aos compradores das rifas?…

Podemos alertar sindicatos de professores e associações de pais para que tomem posição perante situações como a que aqui é denunciada, em defesa tanto da dignidade profissional dos professores como da questão de princípio que é a existência de recursos próprios das escolas para cobrir as despesas de funcionamento e as aquisições de materiais. E se esses recursos não existem, e fazem realmente falta, então a situação deve ser assumida e denunciada.

Poderemos, de facto, concretizar tudo o que ficou dito, mas sobrará sempre a questão fundamental: e os professores deste agrupamento, o que se dispõem a fazer? Irão cumprir com o que lhes mandam, assumindo que vender rifas cabe dentro das suas funções docentes, ainda que de forma voluntária?

É sempre pouco simpático relembrar isto, e não gosto de o fazer mais vezes do que as necessárias, mas a verdade é que muito do desrespeito e dos abusos de alguns directores contra os professores que trabalham nos seus agrupamentos se alimenta desta subserviência de muitos professores, do medo, da cedência a uma cultura de compadrios e pequenas prepotências com que se vai domesticando, com sucesso, o corpo docente. Reagir, sacudindo o jugo da resignação e do medo e levando outros colegas a agir da mesma forma pode não ser fácil. Mas é fundamental.

Não menos importante é denunciar publicamente os abusos, um primeiro passo que neste caso já foi dado. O seguinte será chamar aos bois pelos nomes…

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