O país não pode tudo

O ministro da Educação assegura que está “empenhado” em chegar a acordo, mas sublinha que agora é a vez “dos sindicatos se aproximarem do Governo”. Fernando Alexandre disse ainda que “não está previsto” que os professores aposentados ou no topo da carreira sejam considerados na recuperação do tempo de serviço congelado. “O país não consegue reparar todos os danos” provocados por crises, justificou.

“Não é uma questão deste Governo. O país não consegue reparar todos os dados, que crises muito longas e muito duras, que afetaram o nosso país, tiveram nas pessoas. E, por isso, de facto não está em cima da mesa a questão de efeitos [compensatórios] para os professores aposentados e não está também nenhum efeito previsto para os professores no topo da carreira“, reconheceu Fernando Alexandre, que esteve reunido esta segunda-feira com as 12 estruturas sindicais dos professores, tendo em vista à recuperação dos 6 anos, 6 meses e 23 dias de tempo de serviço dos docentes que estão congelados desde a troika. Este, aliás, tem sido um dos aspetos apontados pelos sindicatos para chegarem a acordo com o Executivo. Governo quer devolver 25% do tempo dos docentes já este ano Ler Mais

Na reunião desta segunda-feira, o Ministério da Educação aproximou-se, em parte, das reivindicações dos sindicados, demonstrando-se disponível para devolver o tempo de serviço congelado a um ritmo maior: de 25% na primeira (que está prevista ser devolvida já a 1 de setembro) e segunda tranches. Já na terceira tranche mantém os 20%, mas na quarta e quinta encurta para 15% (em cada um desses anos).

Tendo em conta que grande parte dos docentes abrangidos pelos dois períodos de congelamentos “estão já numa fase avançada da carreira esta proposta permitirá que até 1 de setembro de 2025 os professores recuperem 50% do tempo de serviço”, realçou Fernando Alexandre. O ministro reiterou ainda que continua “empenhado” em “responder às “expectativas dos professores” e garante que está “de boa fé” nas negociações, pelo que defende que agora “é a vez dos sindicatos de se aproximarem” à proposta da tutela. Ainda assim, não afasta uma recuperação em quatro anos, ao invés de cinco.

Sem negar a justiça das reivindicações dos professores, tentemos ver a perspectiva do ministro sobre a recuperação do tempo de serviço dos professores. Reconheça-se que não é hoje possível reparar integralmente uma longa série de injustiças praticadas contra a classe durante duas décadas. Será hoje impossível devolver tudo o que os professores perderam com os congelamentos, as transições e mudanças na estrutura da carreira, as paragens forçadas devido às progressões sujeitas a quotas. Os próprios professores sempre disseram que não queriam retroactivos em relação ao que perderam, mas sim que lhes fosse feita justiça relativamente ao futuro. Contudo, a passagem do tempo teve o efeito de permitir que os docentes mais antigos e os que se encontravam já próximo do topo pudessem alcançar entretanto o último escalão da carreira e/ou a idade de aposentação. São estes que se sentem agora, compreensivelmente, mais prejudicados com uma recuperação do tempo em moldes que pouco ou nada os beneficiarão.

Na verdade, a única maneira de devolver algum benefício a estes colegas seria através de bonificações no tempo requerido ou na fórmula de cálculo da aposentação; uma ideia já muitas vezes sugerida pelos sindicatos, mas de que nenhum governo quer ouvir falar, pelo precedente que abriria e o impacto que teria no precário equilíbrio que se tenta manter no sistema de pensões e reformas.

Em suma, se na questão do prazo de recuperação parece haver margem para um acordo MECI/sindicatos – entre as propostas de recuperação a 3 ou a 5 anos é possível fixar um meio termo nos 4 anos – nas outras exigências dificilmente haverá aproximações significativas das partes. Resta a incógnita de saber se, da parte dos sindicatos, continuarão, como no tempo de João Costa, a conjugar posições ou se, numa conjuntura aparentemente mais favorável, veremos as organizações mais próximas do PSD a mostrar uma maior flexibilidade, que possa inclusivamente permitir a assinatura de um acordo.

Importa-se de repetir?…

Dizem-me que isto se ensina no secundário, na disciplina de Português, que é comum a todos os cursos, e não apenas para futuros linguistas ou estudantes de Letras. E eu, que sempre me senti capaz de ler, falar, escrever, ouvir e interpretar razoavelmente a língua portuguesa sem necessidade de dar atenções exageradas à gramática, interrogo-me para o que é que isto serve. Mais: quantos reais ou potenciais leitores é que estas práticas (pouco) pedagógicas estarão a afastar do prazer da leitura?

Será que o condutor de um automóvel também precisa de saber os nomes e as posições de todas as peças e parafusos que estão debaixo do capot para conseguir levar o veículo do ponto A ao ponto B? O utilizador comum do computador ou telemóvel distingue os diferentes circuitos, memórias e processadores que existem no interior do aparelho?…

É inevitável a comparação com outra disciplina “estruturante” do currículo, a Matemática, na qual têm imperado ultimamente as teorias em torno do carácter utilitário da “Matemática para a vida”, menosprezando-se a importância do cálculo – para isso temos as calculadoras! – em favor do raciocínio. Nas línguas o percurso parece estar a ser feito ao contrário, com a gramática a ter um peso específico e a constituir até um domínio específico da avaliação.

Numa perspectiva inspirada pelas neurociências, parece estar-se perante um contra-senso. Sabemos que o uso correcto de uma língua se pode aprender naturalmente: os nossos cérebros estão preparados para o fazer; é assim aliás que os bebés aprendem a falar a língua materna. Já o pensamento matemático é algo que não vem “instalado de fábrica”: implica uma aprendizagem específica e o desenvolvimento dos mecanismos mentais específicos para o seu uso.

Da História, sabemos que povos antigos desenvolveram línguas gramaticalmente mais complexas do que a maioria das que usamos hoje, usando-as eficazmente sem sequer possuírem a escrita, muito menos disporem de professores linguistas, escolas ou universidades. E é aqui que a linguística se revela útil, deslindando as origens, a evolução e o funcionamento das línguas.

É possível fazer contas sem saber a tabuada, mas o processo torna-se mais lento pela falta de automatismo. Já o conhecimento explícito da língua, como decorar a lista das preposições ou dos advérbios ou identificar os elementos duma frase em vez de simplesmente usufruir da leitura, parece-me, salvo melhor opinião, perfeitamente dispensável quando o objectivo é ser capaz de falar e escrever correctamente, percebendo da mesma forma aquilo que outros dizem ou escrevem.

E os professores de Português, e das línguas em geral, o que têm a dizer de tudo isto?…

Tempo de serviço: a nova proposta do MECI

A proposta que foi hoje apresentada aos sindicatos regista alguns avanços em relação ao documento inicial, mas ainda não satisfaz os sindicatos nem será suficiente, por certo, para permitir o acordo dos sindicatos mais representativos da classe.

O Governo mantêm o prazo de 5 anos para a recuperação integral do tempo de serviço, mas admite que as primeiras tranches a devolver, em 2024 e 2025, possam corresponder cada uma a 25% do tempo total, e não 20% como proposto inicialmente.

Outro ponto positivo será o compromisso de não descontar, no total de dias a recuperar, o tempo devolvido no âmbito do acelerador de carreiras a quem esteve parado nas listas de progressão. Registe-se também a promessa de flexibilizar a obtenção dos requisitos para a progressão, permitindo que sejam apresentados posteriormente a Setembro, quando ocorrerá a primeira devolução. Mas tudo o resto mantêm-se, condicionando as futuras progressões, nomeadamente as quotas e as vagas no acesso ao 5.º e ao 7.º escalão. Sobre outro tipo de compensações para quem está perto da aposentação e pouco ou nada irá beneficiar da recuperação, também não há novidades.

O Governo aceitou devolver aos professores mais tempo de serviço na primeira fase do processo de recuperação, mas manteve o prazo de cinco anos da proposta inicial, segundo os primeiros sindicatos que se reuniram hoje com a tutela.

O Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) voltou hoje a receber hoje os sindicatos para continuar as negociações sobre a recuperação dos seis anos, seis meses e 23 dias de tempo de serviço dos professores com diferentes contrapropostas em cima da mesa.

À saída da reunião, os primeiros sindicatos ouvidos pela tutela relataram que o Governo apresentou uma nova proposta, que se aproxima de algumas reivindicações dos professores.

Em relação à proposta inicial, em que o Governo propunha devolver o tempo de serviço a uma média anual de 20%, o ministro Fernando Alexandre propôs hoje a devolução de 25% nos primeiros dois anos, de 20% em 2026 e de 15% em 2027 e 2028.

“É evidente que não concordamos ainda e vamos apresentar nova contraproposta para o próximo dia”, disse aos jornalistas o presidente do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades (Spliu).

A falar também em nome da Federação Portuguesa dos Profissionais de Educação, Ensino, Cultura e Investigação (Fepeci), do Sindicato Independente de Professores e Educadores (SIPE) e do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados (SNPL), Manuel Monteiro acrescentou que os sindicatos mantêm algumas linhas vermelhas, relacionadas com a intenção de manter as vagas de acesso aos 5.º e 7.º escalões e de revogar o “acelerador” da progressão na carreira.

Sobre o decreto-lei aprovado pelo anterior executivo, que permite aos docentes afetados pelos dois períodos de congelamento da carreira recuperar o tempo em que ficaram a aguardar vaga para os 5.º e 7.º escalões, a presidente do SIPE acrescentou que o Ministério deixou algumas garantias.

“Todos aqueles colegas que foram recuperar tempo de serviço na paragem dos 4.º e 6.º escalões, esse tempo não vai ser subtraído ao descongelamento e isto é uma grande, grande vitória”, afirmou Júlia Azevedo.

Por outro lado, apesar de a devolução do tempo de serviço produzir efeitos em 01 de setembro, o ministro garantiu também, segundo a presidente do SIPE, que os professores que só reúnam formalmente os requisitos alguns meses mais tarde não serão prejudicados.

Proposta e contrapropostas

Quando são retomadas as negociações com o MECI tendo em vista a recuperação do tempo de serviço dos professores, recordem-se as linhas gerais da proposta ministerial:

  • Recuperação da totalidade do tempo à razão de 20% ao ano, entre 2024 e 2028;
  • Manutenção do regime de vagas e quotas nas progressões, bem como (subentende-se) das demais condições necessárias para progredir – créditos, ADD – o que pode redundar, na prática, em atrasos nas progressões, “roubando” parte do tempo de serviço recuperado;
  • Revogação do decreto-lei n.º 74/2023, sendo o tempo já devolvido ao abrigo do chamado “acelerador de carreiras” descontado no tempo de serviço a recuperar.

Sendo este um cenário inaceitável pela generalidade dos professores, os principais sindicatos e federações de professores têm vindo a apresentar, nos últimos dias, as suas contrapropostas negociais, pautadas, o que é de saudar, por uma notória convergência nos pontos de vista e nas reivindicações. Há consenso em pontos-chave como a recuperação faseada do tempo, sim, mas em 3 anos, não em 5. Exige-se que a devolução do tempo seja acompanhada de medidas excepcionais – mobilização de avaliações anteriores, dispensa de créditos de formação, não sujeição ao regime de quotas e vagas – que permitam que os professores recuperem efectivamente, nos prazos previstos, o tempo que lhes começou a ser roubado em 2005, já lá vão quase 20 anos! E, por último, não se confundam as coisas: o acelerador de carreiras e a devolução do tempo perdido nos congelamentos da carreira são realidades distintas que não se anulam nem se esgotam mutuamente!

Já aqui tinha sido publicada a contraproposta da Fenprof; ficam também as que os demais sindicatos e federações disponibilizaram publicamente:

Contraproposta da FNE

Contraproposta do SIPE

Contraproposta do SNPL

Contraproposta da Pró-Ordem

Videojogos: a cultura da violência

Portugal acordou há dias em choque com a notícia de um jovem português de 17 anos que mandava executar crimes e homicídios pela internet a uma rede de seguidores no Brasil e que planeava outro homicídio para breve. O mesmo país parece não estar ainda suficientemente indignado com as mais de 4 horas por dia que os seus adolescentes passam nos smartphones e redes sociais, em sites pornográficos ou em videojogos, alguns muito violentos, onde executar ou decapitar parecem atos tão neutros como beber água. De outro modo, provavelmente, os pais deixariam de oferecer smartphones aos filhos antes dos 13 anos (tal como fez Steve Jobs, o génio da Apple), exigiriam do Governo a proibição do seu uso nas escolas e censurariam tanto o consumo como a comercialização de videojogos violentos. E será que estariam a ser radicais ou apenas a tentar prevenir problemas de saúde mental e de desenvolvimento cognitivo dos seus filhos?

A excelente peça de Carla Aguiar analisa os problemas decorrentes da exposição precoce de crianças e adolescentes aos telemóveis e à internet, focando-se especialmente nos riscos dos jogos online que promovem a violência. É verdade que milhões de jovens em todo o mundo jogam, regular ou ocasionalmente, jogos onde a violência explícita está presente, sem que se tornem perigosos psicopatas ou serial killers. Sabendo-se que o entretenimento online foi concebido para criar comportamentos aditivos e que os jogos violentos surgiram no contexto do treino militar, para familiarizar os soldados com o conceito de matar sem hesitações nem remorsos, percebemos que, para mentes imaturas ou perturbadas, os jogos violentos podem ser extremamente prejudiciais.

Além do risco de desenvolver comportamentos anti-sociais – isolamento, falta de empatia, dificuldade em regular gerir emoções e frustrações, obter prazer do sofrimento alheio – os jogadores online ficam também expostos, através dos chats associados às plataformas de jogos, às más influências e manipulações de terceiros.

Combater a perniciosa e destrutiva influência dos jogos digitais entre os mais novos é à partida uma responsabilidade dos pais, da qual o resto da sociedade, e em particular a escola, não se pode alhear. Pelo que a questão da admissibilidade do uso de telemóveis na infância e pré-adolescência se vai colocando com cada vez mais acuidade. Começa a perceber-se que o uso pedagógico do telemóvel, pelo menos nas idades mais tenras, nunca será mais do que residual. E repentinamente, a “escola digital” ficou fora de moda: as escolas de referência são, agora, as que pura e simplesmente baniram o uso do telemóvel, colocando os alunos a interagir uns com os outros e com os adultos responsáveis em vez de andarem agarrados aos aparelhos.

Entre nós, sobretudo em relação à escola pública, coloca-se uma questão cada vez mais incontornável: devem ser decretadas normas mais restritivas em relação ao uso do telemóvel nos espaços escolares ou continuar a confiar, como até aqui, no “bom senso” e na “autonomia das escolas” para definirem localmente as regras mais adequadas? A experiência diz-nos que, quando há claras vantagens em uniformizar procedimentos, não o fazer irá apenas aprofundar as desigualdades educativas. Por cá, os colégios de elite já parecem ter percebido há muito, nesta matéria, o que melhor a fazer:

Começa a desenhar-se uma tendência europeia para banir os smartphones das escolas. O Reino Unido e a França anunciaram essa decisão, o mesmo acontecendo em algumas regiões de Espanha, tendo em conta as evidências de problemas de concentração, insucesso escolar, menos interação social e mais ansiedade associada ao uso frequente. Em Portugal, o Ministério da Educação tem preferido deixar o assunto ao critério das escolas, o que não garante condições de equidade aos alunos onde é possível estar conectado ou não. E o que a experiência mostra nas escolas proativas é que os alunos estão em clara vantagem, “com melhor foco e bem-estar”, atesta a co-fundadora da Mirabilis, Matilde Sobral.

Em Portugal, a decisão foi tomada essencialmente em colégios privados de elite como a Escola Alemã, que proíbe os telemóveis há cerca de 10 anos, o mesmo acontecendo com os colégios Mira Rio e Planalto. O Colégio São João de Brito é outro caso onde a Mirabilis já fez ações de sensibilização com pais e professores e vai agora dirigir-se aos alunos. Quanto a escolas públicas, há pelo menos duas, em Lousada e em Almeirim, que foram pela mesma opção.

Migalhas são para os pombos

Um grupo de Profissionais da Educação vai reunir-se em vigília à porta do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) no próximo domingo, dia 12, a partir das 21h. Professores e não professores vão ficar no local até ao dia seguinte, segunda-feira quando os sindicatos se voltam a sentar à mesa das negociações com o ministro Fernando Alexandre.

“No dia 12 de maio, os Profissionais da Educação vão ‘vigilar’ para que haja bom-senso e a razão impere nas negociações do dia 13 de maio… Retiraremos apenas após o terminus das negociações — cujo horário em que vão decorrer não foi ainda comunicado pelo MECI. As migalhas são para os pombos!”, lê-se no comunicado enviado ao Observador.

Por detrás da organização deste vigília não está qualquer sindicato, mas sim “vários colegas” do ensino que organizaram “especificamente esta iniciativa”, adianta um dos envolvidos ao Observador.

Na véspera de mais uma ronda negocial com os sindicatos, esta acampada frente ao MECI pode constituir um apoio de peso às reivindicações dos professores.

Perante um governo que já se percebeu estar a prazo e ainda a tactear terreno, construir desde já uma imagem de determinação na luta é fundamental para a causa dos professores. Movimentações dos professores nas ruas dão visibilidade ao seu descontentamento e destroem desde logo a narrativa, cara a todos os governos, de que os professores estão satisfeitos com o que o Governo lhes dá, os sindicatos é que não sei quê…

Um processo que, se os deixarmos, acaba sempre da mesma forma: com a distribuição de migalhas para apaziguar o descontentamento, enquanto as justas aspirações são eternamente adiadas. Ora migalhas, dizem os colegas organizadores deste evento e dizem muito bem, dão-se aos pombos!

Contra o genocídio

Imagem daqui.

Há pelo menos uma diferença importante entre o genocídio que o estado de Israel está a perpetrar em Gaza e noutras partes da Palestina e outras operações de extermínio em massa de populações civis, como as que ocorreram nos campos de concentração nazis ou em territórios remotos da África ou da Ásia: é que o genocídio em Gaza é feito à vista de todos. Se em tragédias passadas quase todos podiam alegar que de nada sabiam, do sofrimento e martírio de milhões de palestinianos todos somos tornados cúmplices, nem que seja pela inacção e o silêncio.

Por aqui, escolhe-se não silenciar. Há um genocídio a decorrer em Gaza, há um povo indefeso a ser massacrado às mãos assassinas de Netanyahu e dos seus sequazes e sobre isto ninguém, com um mínimo de humanidade e decência, deve ficar indiferente. Há um exército aliado do Ocidente a cometer impunemente crimes de guerra: assassinato de populações civis, valas comuns, abusos sexuais, tortura, bombardeamento de hospitais, bloqueio de ajuda humanitária, jornalistas e pessoal de saúde tomados como alvo a abater. Tudo isto feito a uma escala incomparavelmente maior do que os ataques terroristas do Hamas.

Há mais vida para além das realidades e problemas das escolas, da recuperação do tempo de serviço e de outras justas lutas dos professores. O exercício da cidadania activa que tanto se exalta no papel deveria ter expressão no nosso quotidiano. Pessoalmente sinto-me incapaz, por exemplo, de celebrar o Dia da Europa, como em tantas escolas se fez esta semana, quando não vejo um só líder europeu ter a coragem de afirmar publicamente aquilo que milhões de cidadãos europeus gritam nas ruas e praças do Velho Continente: a denúncia sem subterfúgios do genocídio em curso na Faixa de Gaza.

Negociações podem complicar-se

As negociações entre Governo e sindicatos dos professores podem complicar-se. Vai ser revogado o chamado “acelerador de carreiras” e os sindicatos dizem que a decisão afeta 50 mil docentes.

Quando voltarem a estar sentados à mesma mesa, na segunda-feira, os sindicatos vão trazer já prontas e detalhadas as contrapropostas para apresentar ao Governo. A ideia é chegar a um acordo ainda este mês.

Apesar do otimismo declarado pelo ministro da Educação, Fernando Alexandre, o fumo branco pode ser mais difícil que o previsto, uma vez que os sindicatos vão tentar convencer o Governo de que a intenção de revogar o “acelerador de carreiras” dos professores, aprovado pelo anterior Executivo, pode ser prejudicial para os professores.

A intenção de revogar o Decreto-Lei n.º 74/2023 antes mesmo de que chegue a produzir efeitos para a maioria dos professores abrangidos é a medida mais gravosa prevista na proposta de entendimento com os sindicatos apresentada pelo Governo. Para já, veio inquinar o clima de aparente confiança e optimismo que se estava a instalar na relação com os sindicatos. E impedirá certamente qualquer acordo com os sindicatos mais representativos se o MECI quiser fazer disto um cavalo de batalha.

A proposta não faz sentido, essencialmente por duas razões: primeiro, porque o tempo recuperado ao abrigo deste decreto não é o dos congelamentos das carreiras mas sim os anos perdidos a aguardar vaga nas listas de progressão. Segundo, porque o decreto, aprovado ainda na vigência do anterior governo, pressupõe que a sua aplicação não prejudicará outras iniciativas futuras no sentido de fazer justiça aos professores na questão do tempo de serviço.

Na perspectiva governamental, a solução seria tentadora caso fosse aceite: devolveriam com uma mão tempo de serviço que retirariam com a outra, fazendo assim um suposto brilharete a custos mínimos. Esquecem-se, naturalmente, que se eles se iniciam agora nestas lides, do lado dos professores e dos seus sindicatos existe um pesado histórico de desilusões e promessas não cumpridas por parte de todos os partidos do arco da governação. Não se deixarão seduzir e enganar, espero, com um par de balelas…

Para a próxima ronda negocial, que se inicia na próxima segunda-feira, a Fenprof fez já o trabalho de casa: uma contraproposta negocial na qual rejeita a revogação do “acelerador”, defende a aceleração do processo de devolução faseada do tempo de serviço e propõe uma série de medidas para agilizar o processo, sem criar novas injustiças, como ultrapassagens ou novas barreiras à progressão.

Quantos professores têm apoio à renda?

Contam-se pelos dedos das duas mãos: dez, apenas.

Se a oferta de alojamentos ficou muito aquém das necessidades, o processo burocrático criado para a atribuição do benefício afastou ainda mais candidatos.

Conseguiram apenas apoiar a renda a dez professores deslocados, mas certamente terá havido muito mais do que dez decisores e burocratas a trabalhar na implementação da medida.

Trabalham bem!…

A medida de apoio ao pagamento de renda para professores deslocados a dar aulas nas regiões de Lisboa e do Algarve apenas chegou a dez docentes, de acordo com o jornal Público.

O objetivo da iniciativa que entrou em vigor no final do ano passado, com retroativos a contratos celebrados a partir de 1 de setembro do ano passado era apoiar até um máximo de 200 euros o pagamento da renda de professores deslocados, a mais de 70 quilómetros da residência nas duas regiões do país.

O Ministério da Educação, Ciência e Inovação referiu ao jornal que a Direção-Geral da Administração Escolar recebeu 49 candidaturas, tendo sido aprovadas até ao momento dez. “As restantes candidaturas foram consiederadas inválidas por não cumprirem os requisitos necessários”, indicou o Ministério.

Agressões a professores a aumentar

“Vivi um terror psicológico”: agressões a professores estão a aumentar

No ano passado, só a GNR registou 44 ocorrências e este ano já vai em 16. O Governo quer que passe a ser um crime público e com penas agravadas.

As agressões registadas tanto partem de alunos como dos pais e encarregados de educação, e o aumento das queixas pode indiciar duas coisas: que a escola, sobretudo em determinados contextos sócio-educativos, se está a tornar mais violenta, mas também que os professores agredidos não “se ficam”: querem que os agressores sejam punidos e que medidas sejam tomadas para que estes casos não se repitam, muito menos se normalizem. Mesmo assim, sabe-se que muitos casos, provavelmente a grande maioria, ficam por denunciar.

Há, na denúncia pública destes casos e na discussão que suscitam, um factor omnipresente e deveras preocupante: a resistência das direcções escolares e dos dirigentes ministeriais em falar dos assuntos. O que vai desde a recusa lacónica em “prestar declarações” às desculpas esfarrapadas que se inventam para minimizar as situações: foi um caso isolado, está a ser tratado internamente, decorre um inquérito que impede que se fale sobre o assunto… A verdade é que, regra geral, as sequelas físicas e psicológicas das agressões tendem a ser mais severas e duradouras do que os castigos aplicados aos agressores, nos casos em que isso chega efectivamente a acontecer.

Pela minha parte, só conheço uma forma de enfrentar os problemas que se pretende realmente resolver: uma política de verdade, que propicie a discussão aberta e sem preconceitos, que possa apontar caminhos e soluções. Esconder os problemas, fingindo que não existem, não é solução. Revolta-me e envergonha-me que partidos e pessoas de esquerda entreguem de bandeja as questões da segurança, na escola e noutros locais, à extrema-direita populista, xenófoba e securitária. Como se o direito a trabalhar em segurança, com respeito pela dignidade do trabalhador e pela sua integridade física e mental fosse um qualquer capricho pequeno-burguês e não um direito humano fundamental.

O anúncio de que o actual governo pretende finalmente consagrar em lei a tipificação de crime público para agressões a docentes e outros funcionários da administração pública pode ser um bom ponto de partida para estas questões começarem a ser discutidas com seriedade e de forma consequente. Estamos fartos de ouvir ministros apelando à paz e à boa convivência nas escolas sempre que há um episódio de violência, mas nada fazendo em concreto para que os professores sejam mais defendidos, valorizados e respeitados no exercício das suas funções. De ministros dessa laia, mais à esquerda ou mais à direita, já tivemos a nossa conta!