Pensamento do dia

Tempos estranhos estes, em que pessoas inteligentes são silenciadas para que os estúpidos não se sintam ofendidos.

A ideia não é nova e, com ligeiras variações, circula em memes e citações, nas redes sociais, há pelo menos dois anos. Mas continua actual: em vez de envelhecida e datada, a pujante cultura do cancelamento e do politicamente correcto vai-a confirmando todos os dias.

A política da mentira

Há quem pense que mentir faz parte da arte da política, e se um mentiroso descarado dificilmente será bem sucedido no jogo político democrático, já a mentira mais subtil, a das meias-verdades, das insinuações e das omissões, essa tem tido um carreira de sucesso entre nós. E, a avaliar pela recente maioria absoluta conquistada por um partido que se esmera em fazer o contrário do que anuncia, um provável futuro radioso à sua frente.

No campo da Educação, é notória a contradição entre os anúncios de defesa e compromisso com a escola pública por parte de responsáveis políticos e as políticas concretas que promovem, levando à degradação a todos os níveis da qualidade das aprendizagens e da situação profissional dos que nela trabalham. A hipocrisia atinge o cúmulo quando a principal mentora da política de domesticação e proletarização dos professores e de promoção do facilitismo na “escola a tempo inteiro” vem agora chorar lágrimas de crocodilo sobre os problemas da classe docente e da escola pública. Como muito bem explica, no DN, António Carlos Cortez.

Muitos responsáveis políticos esquecem que a governação da res publica implica o rigor e o realismo na avaliação dos problemas e a verdade quanto ao relato dos factos. De há muito a sensação que temos é a de que se navega à vista nos mares encapelados da Educação. De Maria de Lurdes Rodrigues a João Costa, de Manuela Ferreira Leite a Tiago Brandão Rodrigues, a pasta ministerial tem constituído um verdadeiro caso de esquecimento de inúmeras medidas pelos quais são responsáveis todos os ministros e as suas respetivas equipas. Mas foi entre 2005 e 2009, no consulado de Maria de Lurdes Rodrigues, que se feriu de morte a profissão docente. (…)

Os factos: foi a antiga ministra quem criou o cargo de Diretor nas escolas; essa medida que resultou no servilismo de muitos que seguem as diretrizes emanadas do Ministério da Educação, aparelho da ideologia oca. Pergunto: com que verdadeira imparcialidade e rigor se quis criar este cargo? Não se criou um ambiente policial nas escolas? Que falem os professores!! Que digam de sua justiça! Que ponham a nu as perseguições de que são e foram alvo! Pergunto: as escolas, antes de haver o cargo de diretor, funcionavam mal? Foi no consulado de Maria de Lurdes Rodrigues que se criou o modelo de avaliação docente baseado no sucesso obtido pelos estudantes. Tal medida gerou um facilitismo soez que devia ser repudiado por todos, inflacionando-se as classificações com vista à subida de escalão e boa classificação de desempenho. A mentira como moeda de troca na relação pedagógica e na relação entre pares, eis a política de MLR. Assim, é bom professor quem banaliza os Excelentes, os 17, os 18, ou mesmo os 19 e 20 valores. Com Exames Nacionais que visam comprovar o sucesso das avaliações, baixou-se o nível de dificuldade e exigência das matérias a lecionar. Resultado final: todos contentes e os pais também. Depois desta escolaridade obrigatória e das licenciaturas à bolonhesa, temos de perguntar: que país será o nosso? Que conhecimentos têm futuros quadros superiores?

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Uma entrevista sem papas na língua

Agora que a luta dos professores enche primeiras páginas dos jornais e abre noticiários televisivos, alguns dos nossos colegas mais mediáticos vão sendo chamados, não apenas a dar opiniões avulsas de 30 segundos, mas verdadeiras entrevistas. Foi o caso de Luís Sottomaior Braga, professor, blogger, activista, subdirector de agrupamento. Questionado sobre os temas quentes do momento, respondeu com a habitual assertividade e frontalidade. Sem papas na língua, que é como dá gosto de ouvir e ler, aqui ficam alguns excertos de uma peça a ler integralmente.

Eu arrisco-me a ser alvo de um processo por dizer isto, mas digo sem problema nenhum: seria interessante saber qual o financiamento que o Estado dá à CONFAP para esta funcionar. Discutindo essa ligação ao Estado, através do subsídio, acho que aí entendemos o que a CONFAP anda a dizer.

A CONFAP está muito preocupada com o problema da recuperação das aprendizagens, das aulas perdidas por causa da greve – mas ainda não vimos a CONFAP a ter um discurso estruturado sobre a falta de professores, que é generalizada e que vai crescer.

É triste uma democracia reprimir os professores. A única discussão que o regime democrático está a ter, em relação aos professores, é cortar salários. Hoje, financeiramente, estudar é pior do que a especulação mobiliária banal. Temos de reflectir que país é este. O modelo da sociedade portuguesa não privilegia a educação, acha que a escola é acessória.

Se o Governo fosse inteligente, mandava calar o deputado Porfírio Silva. Eu estou convencido de que, cada vez que o deputado Porfírio Silva fala, mais professores aparecem na manifestação seguinte. Ele fala de uma realidade que julga conhecer mas não conhece; e é agressivo”.

Espero que o Governo faça uma reflexão estratégica e que mude a forma como lidar com a educação. O Governo tem que ter pessoas competentes – e o nosso ministro da Educação (João Costa) é incompetente, politicamente, para lidar com os assuntos da educação. É professor catedrático, do ensino superior, e acha que conhece bem o sistema, mas conhece mal. E já manifestou o seu desconhecimento. Além de ser um subordinado do ministro das Finanças. Precisamos de alguém com peso político, que dissesse ao ministro das finanças que a educação tem de ser uma prioridade financeira. 331 milhões de euros por ano (custo da recuperação integral das carreiras dos professores) é pouco dinheiro, no orçamento geral do Estado. Gastámos muito mais em bancos pequenos, que fomos salvar só pelo princípio de que temos de salvar bancos.

O líder da oposição diz que tem de se dar o tempo possível. Isso é uma formulação completamente hipócrita, até porque o PSD teve a oportunidade de resolver isto na legislatura anterior e não deu o passo em frente”.

Os serviços mínimos obrigatórios não vão travar este movimento. Estamos a lidar com pessoas criativas, que têm soluções. Não são pessoas que não têm cultura; são pessoas que transmitem cultura à sociedade.

Pensamento do dia

Como é possível que um ministro que ainda há pouco tempo atrás exortava os professores a ouvir as vozes dos alunos, permaneça surdo a tudo o que os professores, alto e bom som, lhe tentam dizer?

Só com uma enorme dose de sonsice e a hipocrisia, que mesmo assim têm limites, os quais João Costa há muito ultrapassou.

Promovido a ministro, o secretário de Estado “bom”, o “amigo das escolas”, não tardou em revelar a sua verdadeira face àqueles professores que, durante tanto tempo, enganou bem enganados.

Que ainda me lembro dos rasgados elogios que recebeu, vindos de variados quadrantes, quando subiu a ministro…

Já foste!

O humor imparável – e impagável – da Txitxa!

Uma grande verdade

O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde defendeu na quarta-feira que o mundo “não presta o mesmo grau de atenção às vidas dos negros e às dos brancos”, comparando a atenção dada à Ucrânia e a conflitos noutros países.

“Toda a atenção prestada à Ucrânia é muito importante, é claro, porque [o que lá se passa] tem impacto em todo o mundo, mas não é dada sequer uma fração dessa atenção ao Tigray (a região da Etiópia de que é originário, onde há um conflito armado devastador em curso), ao Iémen, ao Afeganistão, à Síria e a todos os outros”, lamentou Tedros Adhanom Ghebreyesus numa conferência de imprensa.

“Tenho de ser direto e honesto, o mundo não trata a raça humana da mesma maneira. Alguns são mais iguais que outros”, sustentou o responsável da OMS, parafraseando o escritor norte-americano George Orwell.

“E quando digo isso, magoa-me (…) É muito difícil de aceitar, mas é o que acontece”, insistiu, afirmando esperar que “o mundo recupere a razão e trate todas as vidas humanas da mesma forma”.

Há gente culta e adulta que parece ter descoberto a realidade da guerra há coisa de mês e meio, quando as tropas russas invadiram a Ucrânia. Aparentemente, desconheciam que na guerra se mata e morre, que podem ser destruídas cidades inteiras, que a população civil indefesa é duplamente vítima, quer como alvo de disparos e bombardeamentos, quer ao ser usada como escudo humano pelos contendores. Que a brutalidade e impiedade inerentes à guerra podem desencadear velhos demónios que ressurgem em cada conflito militar: genocídios, valas comuns, violações em massa, limpezas étnicas, sevícias sobre reféns e prisioneiros, execuções sumárias.

Outros, menos inocentes, não desconhecem que a guerra possa conter isto tudo – apenas acham inaceitável que suceda na Europa “civilizada”, com povos que nos identificamos. Estes aguardam ansiosamente pela paz na Ucrânia, para que a guerra deixe de vitimar homens brancos ocidentais, podendo prosseguir sem sobressaltos contra africanos e asiáticos – essas vidas de menor valor de que fala Ghebreyesus.

O grau zero na saúde mental

Em tempo de campanha eleitoral, impõe-se um aviso prévio: este não é um post panfletário, de apelo ao não-voto do PS. Mas é um post que não poderia deixar de escrever, pois se até certo ponto se podem compreender os erros ou reconhecer a incompetência de quem governa, há algo muito mais grave do que isso e que o PS, ao fim de seis longos anos no poder, vem cultivando cada vez com maior ousadia e desassombro: a desonestidade.

Diversos governantes, com especial destaque para os da área da Educação, vêm enchendo a boca com a importância da saúde mental e a necessidade de compensar o enorme impacto que a pandemia e os confinamentos terão tido nos comportamentos sociais e mentais, sobretudo dos mais jovens. Pois bem, a Ordem dos Psicólogos deu-se ao trabalho de compilar todas as propostas que, na discussão do Orçamento de Estado de 2021, foram feitas para reforçar a resposta do Estado aos problemas da saúde mental potenciados pela pandemia, e que já na altura eram motivo de preocupação.

Será talvez surpresa para alguns. A mim não me espantou muito comprovar que as inúmeras propostas apresentadas pelos deputados de várias bancadas foram, na sua quase totalidade, rejeitadas pelo PS, sendo a grande maioria chumbada com a colaboração dos partidos de direita. Há de facto uma forma especialmente detestável de fazer política a que este PS nos vem habituando, que é a dos grandes anúncios e das eloquentes declarações de princípio que escondem uma completa inacção perante os problemas concretos. Quando não, com ainda maior perversidade, fazem o exacto contrário daquilo que proclamam aos quatro ventos. E disto, na Educação, também temos tido inúmeros exemplos.

Cretinos digitais – agora em Português

A Fábrica de Cretinos Digitais, obra que já há algum tempo aqui comentei, foi finalmente publicada em Portugal. Um lançamento oportuno, numa época em que o pós-pandemia e a “transição digital” parecem estar a ser usadas para justificar doses reforçadas de insanidade e irracionalidade no sector da Educação, onde o panorama já era preocupante.

Com a mesma irresponsabilidade com que se pretende tratar problemas de saúde mental fazendo dos professores uma espécie de psicoterapeutas improvisados, há quem pense que entregar um telemóvel ou um tablet a um jovem nativo digital é o suficiente para que passe a ter todo o conhecimento de que necessita na palma da sua mão.

A verdade é que as avaliações que ao longo do tempo se vêm fazendo às capacidades intelectuais e cognitivas de crianças e adolescentes demonstram que os valores médios vêm declinando pelo menos desde os anos 90 do século passado. Ou seja, desde que os ecrãs, primeiro das televisões, mais tarde dos computadores, hoje dos telemóveis e dos tablets, passaram a ocupar, de forma avassaladora, o tempo e as atenções dos mais novos.

Em idades cada vez mais precoces, os ecrãs estão a roubar o tempo precioso e insubstituível que as crianças deveriam dedicar ao diálogo e interacção com os outros, à manipulação e à exploração dos ambientes à sua volta. Questionado directamente na entrevista ao Público, Desmurget é veemente na resposta:

O tempo de ecrã de crianças até aos seis anos devia ser nenhum. Zero

E agora, a palavra aos especialistas a sério…

Está praticamente tudo explicado nesta peça do Público. Com uma análise rigorosa de números e factos, não com a expressão de vontades e estados de alma nem exercícios de demagogia.

Se cada infectado com covid-19 contagiar menos de uma pessoa, os números da pandemia descem. Se infectar mais do que uma, irão subir. Os dados disponíveis mostram a dificuldade de manter este valor de Rt em valores desejáveis com as escolas abertas. A ausência de sintomas, comum entre a população jovem infectada, dificulta o controle da pandemia. Quando o número de novos casos dispara, o confinamento torna-se incontornável para evitar a catástrofe sanitária. O reforço da medidas sanitárias e o aumento da capacidade de testagem podem ser uma alternativa quando se pretende abrir escolas e outros serviços públicos, mas não se está a investir o suficiente nestas áreas. O atraso na distribuição de vacinas também não ajuda. Sem uma mudança profunda nas regras de segurança sanitária vigentes nas escolas, abri-las prematuramente é abrir o caminho à quarta vaga pandémica quando ainda nem debelámos a terceira. E não nos venham com o argumento demagógico de que os danos da privação da escola são superiores aos riscos da pandemia. Estão simplesmente a comparar o que não é comparável.

Fica um excerto da notícia, mais longo do que é habitual, com destaques da minha responsabilidade.

A abertura das escolas em Setembro fez o risco de transmissibilidade (Rt) subir cerca de 20% a 25% ao final de seis dias, explicou Jorge Buescu, professor de matemática da Universidade de Lisboa, ouvido esta quarta-feira na comissão parlamentar de acompanhamento da pandemia. O especialista alertou ainda para o descontrolo que pode acontecer se o Rt ficar acima de 1,2: “É quase garantido que poderá haver uma quarta vaga”.

“Se queremos ter a noção do efeito de abrir as escolas, é olhar para o que aconteceu ao Rt” em Setembro quando estas abriram, respondeu o especialista aos deputados. “Seis dias depois da abertura das escolas o Rt começou a subir e passados mais 15 dias tinha subido 20 a 25%. Se pensarmos que vai acontecer a mesma coisa, o que temos fazer é uma conta relativamente simples: Estamos com um Rt suficiente para que acrescentando mais 20% continuemos abaixo de 1 ou não?”, explicou Jorge Buescu.

A resposta foi também simples. “Se o Rt antes de abrirmos as escolas estiver 0,98 diria que é mais do que imprudência, é quase procurar problemas sérios, correr um risco muito grande de uma nova vaga”, disse Jorge Buescu, dando como exemplo o que aconteceu por altura do Natal em que o Rt estava neste valor e acabou por subir com o desconfinamento dado nessa altura. E um Rt acima de 1, referiram os quatro matemáticos, é ter “um aumento exponencial de casos”.

Explicou ainda que a análise diária do Rt, ainda que menos fina, permite perceber que evolução da incidência se pode esperar ao final de dez a 15 dias. E fazer baixar o Rt leva tempo. Explicou que, com as medidas gradualistas tomadas no início do ano, este indicador levou cerca de mês e meio a descer. Já após o fecho das escolas, o Rt desceu a menos de 1.

Henrique Oliveira, professor de matemática do Instituto Superior Técnico, referiu que nas escolas “grande parte transmissão é feita através de [doentes] assintomáticos ou sintomáticos antes dos sintomas [se manifestarem]” e que esta transmissão é “o grande perigo da doença”. “É muito difícil combater a pandemia por causa dos assintomáticos.”

“Quanto mais jovem, mais se está no estado assintomáticos ou com poucos sintomas. As escolas servem para transmitir a doentes de agregado familiar para agregado familiar”, alertou o especialista, fazendo ainda referência ao desporto escolar que realizado “sem máscara permite maior transmissibilidade”. “Temos de ser cuidado nesta questão. Tem de ser feito ao ar livre e com distância. Em ambiente fechado existe muita transmissão assintomática”, reforçou Henrique Oliveira.

Já Carlos Antunes, também professor da Universidade de Lisboa e elemento da equipa do epidemiologista Manuel Carmo Gomes, mostrou a análise da incidência que fez por faixas etárias para dizer que no final do ano passado a taxa de incidência dos grupos 6-12 anos e 13-17 anos “crescia na ordem dos 6% ao dia” e que a 22 de Fevereiro eram os grupos que mais desceram na taxa de incidência. Segundo o especialista, houve “uma redução drástica a 31 de Janeiro que tem a ver com algo que aconteceu nos dias 21 a 23”, já que “a transmissibilidade dá-se antes do inicio sintomas”, data pela qual faz a análise.

O especialista falou ainda sobre o modelo de análise de risco que criaram em Outubro e que junta vários indicadores que permitiram estabelecer cinco níveis de risco que podem servir de guia para o início de um confinamento ou desconfinamento. Linhas vermelhas que não devem ultrapassar um Rt de 1,1, uma média de incidência a sete dias de 3000 novos casos, uma taxa de positividade de 7,5% e um limite de 242 camas em cuidados intensivos e de 1300 em enfermaria.

Covid-19: Portugal no topo

Os dados, recolhidos a nível mundial e obtidos num site de referência, referem-se aos novos casos de covid-19 por milhão de habitantes registados nos últimos sete dias. E falam por si: Portugal detém o nada invejável segundo lugar, à frente dos EUA, do Brasil e de todos os países europeus. Com mais casos do que nós proporcionalmente à população, apenas Israel. No entanto, este país está a apostar na vacinação rápida e em massa, pelo que a curto prazo poderá ter o problema controlado.

Por cá, parece que nem a classe política, nem os media, nem os cidadãos acordam para a gravidade do problema. Decretam-se confinamentos mas continuam a fazer-se ajuntamentos e a não corrigir comportamentos de risco. Assumimos que as escolas são lugares seguros, quando é óbvio, perante estes números avassaladores, que o vírus pode estar em todo o lado e por todo o lado se propaga. Sendo que as novas variantes da doença vieram arrumar de vez com o mito de que as crianças não contagiam…

Temos hospitais a fazer medicina de catástrofe, escolhendo os doentes que são para morrer e os que são para salvar, porque os recursos materiais e humanos disponíveis não chegam para todos os que precisam. Precisávamos de um confinamento radical, mas preferimos acreditar que a perda de um mês de aulas presenciais, num percurso de doze anos de escolaridade obrigatória, iria hipotecar irremediavelmente o futuro das novas gerações.

Como dizem os advogados amaricanos, I rest my case…