O passo já não é maior do que a perna?

O fim da maioria absoluta socialista tem destas coisas: o PS, que andou anos a recusar aos professores, médicos e outros profissionais da administração pública a satisfação das suas legítimas aspirações, tenta agora associar-se às soluções que o novo governo vier a encontrar para evitar que velhos problemas comecem, desde a primeira hora, a ensombrar a sua governação. Até já admitem aprovar rectificativos ao Orçamento de Estado para 2024 que, contra tudo e todos, fizeram aprovar.

Se estão tão preocupados com os professores, médicos, polícias e oficiais de justiça e disponíveis para satisfazer as suas pretensões, porque não o fizeram durante os oito anos ininterruptos de governação? O que mudou para melhor, no país e no mundo, para que o que era impossível em finais de 2023 passasse não só a ser possível, mas até desejável, em 2024?…

Pedro Nuno admite aprovar orçamento retificativo da AD para aumentar professores, polícias, médicos e oficiais de justiça até ao verão

O socialista remeteu para Luís Montenegro a responsabilidade de apresentar uma solução de governo “estável” uma vez que deverá ser o líder do PSD indigitado como primeiro-ministro. Depois do encontro com Marcelo, admitiu aprovar um orçamento retificativo da AD para aumentar professores, polícias, profissionais de saúde e oficiais de justiça até ao verão.

Um novo PS?

Os congressos partidários, sobretudo quando dão palco à mudança de líder, tendem a ser aproveitados para transmitir a ideia de renovação e de mudança, sobretudo em partidos que, como é o caso do PS, acusam o desgaste de oito anos consecutivos no poder. Mas a ideia de mudança, apesar de necessária para travar o passo ao crescimento eleitoral da direita, é ilusória: a par de alguma renovação geracional, com a consolidação nos órgãos partidários da geração nascida já no pós-25 de Abril, o pessoal político continua a ser o da escola dos jotinhas, gente que saiu das associações de estudantes directamente para os gabinetes de governantes e autarcas, que pouco ou nada trabalhou e vivenciou fora da redoma político-partidária. E se não mudam os políticos, nem a forma de fazer política, dificilmente irão mudar as políticas concretas, aquelas que determinam a vida pública e o funcionamento das instituições.

O que esperar então de um novo governo PS, caso o partido ainda consiga convencer o eleitorado a dar-lhe nova oportunidade? Cauteloso, Pedro Nuno Santos evita enredar-se na questão do tempo de serviço: tenta o caminho mais pacífico e sedutor do aumento de salário à entrada da profissão, encurtando a diferença excessiva entre a base e o topo numa carreira com demasiados anos entre a base e o topo…

No Congresso do PS deste fim de semana, Pedro Nuno Santos prometeu um aumento dos vencimentos à entrada na carreira docente e deixou de fora referências àquela que tem sido a grande reivindicação dos professores. Esqueceu-se ou preferiu evitar o tema da recuperação do tempo de serviço?, questiona a FNE

João Costa, apoiante assumido do novo líder, afina pelo mesmo diapasão: deseja falar de outras coisas e, como se o tempo de serviço roubado aos professores estivesse em leilão, quer que outros partidos falem do assunto antes de o próprio PS se comprometer com o que quer que seja. E não consegue disfarçar alguma irritação por lhe estarem sempre a perguntar o mesmo – a educação não é monotemática, afirma! Claro que não, e nesta vasta área há certamente temas mais interessantes e motivadores. Mais uma razão para que se resolva de vez, como foi feito nas regiões autónomas, uma reivindicação de que os professores, já se viu, não estão dispostos a abrir mão.

Sou a favor…

Mas voto contra! (por causa da disciplina de voto, claro…)

(c) PATRICIA DE MELO MOREIRA / AFP

Com uma teimosia que tenta fazer passar por coerência e sentido de Estado, o PS rejeitou hoje a última oportunidade de acender, ainda nesta legislatura, uma luz ao fundo do túnel na contagem integral do tempo de serviço dos professores.

Pedro Nuno Santos, o candidato à liderança socialista que tem dado sinais de que poderá, caso seja eleito, ser o líder que virá a fazer justiça aos professores, esteve por esse motivo debaixo de fogo mediático: então é a favor da recuperação faseada e votou contra a proposta do PSD nesse sentido?

As explicações convencerão que deseje ser convencido. Mas há que reconhecer que, neste contexto, dificilmente PNS poderia ter votado de outra forma sem comprometer irremediavelmente as suas aspirações à sucessão de António Costa.

Fica, para memória futura, a declaração de voto:

Nas votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2024 votei contra a proposta do PSD relativa à reposição integral do tempo de serviço dos professores porque, sendo matéria orçamental, estou sujeito à disciplina de voto e porque entendo que o modo de reposição da contagem do tempo de serviço dos professores deve ser definido em negociação e concertação com as organizações representativas dos professores, que não devem ser desconsideradas.

Não obstante, não tendo ainda sido integralmente recuperado o tempo de serviço prestado pelos Educadores de Infância e pelos docentes dos Ensinos Básico e Secundário, entendo que existe um esforço inacabado, na resposta a questões de justiça e de cumprimento dos compromissos do Estado perante os educadores e docentes, as suas respetivas carreiras e legitimas expectativas.

Portugal enfrenta hoje uma grave crise de falta de educadores e docentes dos Ensinos Básico e Secundário, para a qual muito contribuíram os desincentivos gerados durante a governação PSD/CDS entre 2011 e 2015, numa área fundamental e decisiva para o desenvolvimento do nosso país e que regista níveis de envelhecimento muito significativos. Importa, por isso, continuar a dignificar a profissão, valorizando os seus trabalhadores e estabelecendo condições para tornar a carreira atrativa para os jovens.

Assim, e por concordar genericamente com o espírito da proposta, entrego a presente declaração de voto.

PS e IL, a mesma luta (contra os professores)

Se para muitos professores será ainda cedo para decidirem o sentido de voto nas próximas legislativas de Março, já dá pelo menos para ter uma ideia, na perspectiva da defesa dos direitos dos professores, de quem evitar: há dois partidos que votam sistematicamente contra todas as tentativas de aprovar a devolução do tempo de serviço roubado aos professores durante os congelamentos das progressões na carreira. Veremos como decorrerá a última destas votações, a da proposta do PSD para a recuperação faseada do tempo de serviço, marcada para a próxima terça-feira.

Costuma dizer-se que a democracia é o pior dos regimes políticos já inventados, com excepção de todos os outros. Na verdade, a democracia não impede o povo de cometer erros na apreciação dos políticos e dos partidos que pretendem governá-lo. Mas tem a vantagem insuperável de garantir que as escolhas não são irreversíveis, e uma escolha insensata ou desastrada pode ser facilmente revertida com um voto, em sentido diferente, na eleição seguinte. Estejamos por isso atentos às posições e aos compromissos de cada partido que se apresenta às próximas eleições. Que cada cidadão vote em consciência e nenhum professor desperdice o seu voto…

Até ontem, 24 de novembro, foram chumbadas no Parlamento todas as propostas apresentadas por grupos parlamentares (BE, PCP, Livre e Ch), que visavam recuperar o tempo de serviço dos professores. Em todas as votações, tanto em comissão parlamentar, como em plenário, o PS esteve sempre contra os professores. A Iniciativa Liberal acompanhou o PS em 9 das votações, abstendo-se em uma.

Sobre o comportamento dos/das deputados/as do grupo parlamentar do PS (como da IL) há pouco a dizer, pois foram iguais a si próprios, continuando a negar o necessário respeito pelo trabalho desenvolvido pelos professores. Entre esses/as, houve mesmo deputados/as que, fora do Parlamento, se afirmam favoráveis à recuperação do tempo de serviço roubado aos professores, mas que votaram pela manutenção do roubo. Foi deplorável, também, ver, uma vez mais, deputados e deputadas que são professores e professoras votarem contra um direito elementar dos/as colegas, ser contado o tempo que trabalharam, o que constitui um clamoroso fator de desvalorização da profissão docente. Haverá quem se incomode com esta constatação, mas o que mais se lamenta é que não se incomode com a injustiça que comete e as suas consequências.

O adeus ao Costa

A perceção que tinha, quer pelos pareceres positivos que me chegavam, quer pelas mensagens que fui trocando, enquanto João Costa ainda era secretário de Estado, era a de que seria um bom ministro da Educação, sobretudo após 6 anos sob a tutela de Tiago Brandão Rodrigues, conhecido entre os professores como “o nulo”. Enganei-me! Enganaram-se muitos dos professores que se iludiram com a empatia que, aparentemente, criava por onde passava e com quem falava! Uma pena! Teve tudo para fazer melhor. Optou, sim, foi uma opção, pelo caminho mais fácil, pelo caminho mais economicista, pelo caminho que eterniza os problemas e ainda acrescenta outros.

Num adeus àquele que considera o pior ministro da Educação do Portugal democrático, Alberto Veronesi assume o engano em que ele, e como ele muitos milhares de professores, caíram: pensaram que, depois do “nulo” Brandão Rodrigues, a ascensão a ministro do seu secretário de Estado dotaria finalmente o ME de um ministro técnica e politicamente preparado, com conhecimento dos dossiers, capacidade de comunicação e de resolução de problemas e, sempre importante em política, uma boa imagem junto das escolas e dos professores.

Eu, que cedo me desiludi com João Costa – ainda o homem estava longe de chegar a ministro! – continuo a espantar-me com a ingenuidade de tantos colegas, profissionais que exercem uma profissão na qual a perspicácia e o pensamento crítico se exercitam diariamente: então não se via bem que não rimava a bota com a perdigota? Que a boa imagem do Costa da Educação era construída de sonsice e demagogia?

E discordo totalmente da tese de que João Costa assumiu o cargo para resolver os problemas dos professores, desde logo aquele que, ao longo das lutas dos últimos tempos, mais os galvaniza: a recuperação integral do tempo de serviço. É mais do que evidente que esta é uma questão política no âmago do governo e do partido que o sustenta: nenhum ministro socialista, por melhor que fosse, iria alguma vez receber carta branca para resolver a situação a contento dos professores.

Mais do que os políticos de turno, que podem ter em determinados momentos um papel decisivo, interessam as políticas. E nem a Educação nem a valorização das carreiras dos trabalhadores do Estado, constam entre as reais prioridades dos sucessivos governos PS e PSD. Sem uma reconfiguração das forças que têm dominado o poder político no nosso país, não são expectáveis mudanças substanciais nas políticas que vêm sendo seguidas. E é bom que os professores não corram, uma vez mais, atrás de ilusões…

Coerências

Imagem daqui.

Coerência será, para qualquer pessoa bem formada, agir de acordo com as suas ideias e princípios. Que o que faz não contradiga o que diz, e que o seu discurso espelhe as suas acções. Na política à portuguesa, contudo, a coerência tem um significado bem mais elástico, tal a facilidade com que os políticos profissionais vestem diferentes papéis – o que, pensam eles, lhes permite entrar em contradição entre o discurso e a acção. É como se fossem diferentes heterónimos da mesma figura pública, actuando em diferentes esferas públicas: o governante, o ex-governante, o deputado, o comentador televisivo, o candidato a líder partidário…

É assim que Pedro Nuno Santos, exprimindo o conceito de lealdade tão caro aos aparelhos partidários – é-se leal ao líder partidário que nos escolheu, não ao povo que votou em nós – segue a disciplina de voto imposta pelo seu partido, votando contra a recuperação faseada do tempo de serviço dos professores. Dias depois, na qualidade de comentador, deixa escapar que acharia possível e desejável a solução que anteriormente havia rejeitado.

O povo chama a isto querer estar de bem com Deus e o diabo: neste caso, quer colher as simpatias dos professores e dos que apoiam a sua causa, sem verdadeiramente pôr em causa a política do seu partido, que há quase vinte anos amesquinha e castiga os professores. Ao mesmo tempo, a insinuação de que faria diferente e faria melhor vai deixando o cartão de visita enquanto candidato à sucessão de António Costa.

Criados desde as jotinhas neste caldo de cultura político-partidário, fazem estas coisas com a maior naturalidade. E a verdade é que num país onde o escrutínio é escasso, a memória curta e, de um modo geral, as expectativas são baixas em relação aos políticos, a atitude, sonsa e calculista, acaba muitas vezes por compensar.

“Uns gajos merdosos”

Está combinado com o Medina eles apresentarem uns gajos merdosos para garantirmos as nossas juntas.

A investigação do caso Tutti Frutti revela um país governado por “gajos merdosos” de dois partidos que garantem mutuamente a ida ao pote do poder. Corrupção, nepotismo, tráfico de influências, haverá para todos os gostos, neste corrupio de boys and girls que querem dinheiro na conta ao final do mês mas, como reconhecem nas conversas privadas que têm entre si, se “estão a cagar” para o trabalho e as responsabilidades de que são incumbidos.

Desengane-se, no entanto, quem pense que isto vai dar mais do que deram as acusações a Sócrates no caso Marquês. Os favorecimentos, os jobs for the boys e o descaminho de dinheiros públicos topam-se à légua perante os factos já divulgados. Difícil será, diz-nos a experiência, fundamentar e provar tudo isto em tribunal.

De qualquer das formas, o mal não nasce apenas nas máquinas partidárias corruptas e clientelares, da quais qualquer cidadão competente e bem formado fugirá, nos dias de hoje, a sete pés. O que permite e incentiva estas negociatas é haver uma imensa maioria de eleitores que, das duas uma: ou não vota porque “os políticos são todos iguais” ou, quando o faz, só consegue descortinar, no boletim de voto, os quadradinhos do PS e do PSD.

Negoceiam os votos porque a maioria dos eleitores continua a votar neles, e eles sabem-no. E enquanto assim for, as coisas só poderão piorar. Ou alguém consegue descobrir sinais de regeneração nos dois maiores partidos?

Em 40 anos – todos os que já levo de cidadão eleitor – nunca abdiquei de votar. E nunca votei no PS nem no PSD. Sim, é possível: à esquerda, ao centro e à direita, existem outros partidos.

Está mais do que na altura de os eleitores portugueses deixarem de encarar as eleições para o governo das cidades e do país como se de mais um clássico Benfica-Porto se tratasse.

Quem se mete com o PS…

Quem se mete com o PS leva, já dizia Jorge Coelho, o aparelhista-mor do partido nos tempos de António Guterres. Ontem os professores que marcharam em direcção ao Pavilhão Rosa Mota, para onde estava marcada a festa popular de celebração dos 50 anos do partido, não apanharam pancada. Mas é melhor porem-se a pau, que os dirigentes do partido disfarçam cada vez pior a irritação, o desprezo, quiçá o ódio que sentem pela classe. Ontem foram apenas barrados ao portão, mantidos à distância e, alguns deles, identificados pela polícia, que tinha ordens claras para não permitir que ninguém perturbasse os celebrantes e seus ilustres convidados. Apesar de o evento “popular” ser, de acordo com o anunciado publicamente, de entrada livre, havendo mesmo convites a circular entre os manifestantes, os únicos figurantes pretendidos eram os que fossem aplaudir…

Assim se constrói a falsa unanimidade do poder socialista, afastando vozes incómodas e discordantes e usando a polícia para ocupar o espaço público que a militância do partido não consegue preencher. Sim, porque duvido muito que convictos militantes socialistas que ainda deverão existir nas bases do partido se identifiquem com o nepotismo, caciquismo e tráfico de influências que têm dominado a governação socialista, numa relação cada vez mais promíscua entre o Estado e o Partido. Conquistada a maioria absoluta, agarram-se agora com unhas e dentes ao “mandato” que dizem ter para cumprir e aos oleodutos financeiros alimentados pelo PRR e os últimos e generosos fundos europeus.

Professores, escola pública, Educação, dignidade, respeito? Perante valores mais altos que se levantam, é evidente que isso agora não interessa para nada…

“Costa escuta, o povo está na rua”. Professores (e não só) fazem-se ouvir junto à festa do PS no Porto

Com a promessa de “não parar” e a gritar “Costa escuta, o povo está na rua”, milhares de manifestantes juntaram-se perto do Palácio de Cristal, no Porto, onde no interior decorre a festa de 50.º aniversário do PS.

O Porto a marchar

Assinalando condignamente os 50 anos de vida do PS, milhares de manifestantes irão marchar amanhã em protesto contra o governo de um partido que, sendo estruturante do nosso regime democrático, cedo meteu o socialismo na gaveta.

A iniciativa é de um grupo independente de professores, mas os apoios e a participação extravasam muito, pelo que se vai percebendo, a luta específica da classe docente. A governação socialista, sobretudo desde que recebeu o bónus da maioria absoluta, está cada vez mais longe de corresponder às expectativas do país e do povo. E são cada vez mais os grupos sociais e profissionais descontentes com o desgoverno socialista.

Evidências…

Por norma não gosto de enveredar por lutas político-partidárias, mas a verdade é que já não dá mais para disfarçar a mistura de incompetência e displicência governativas que estão a levar este país à ruína. Isto quando vivemos a conjuntura económica menos limitativa dos últimos vinte anos, os principais problemas do país estão diagnosticados e existe um amplo consenso social e político em relação às reformas prioritárias e realmente necessárias.

Imagem de origem indeterminada, em circulação nas redes sociais

A esmagadora maioria dos portugueses quer um Estado social forte, capaz de providenciar escola pública de qualidade a todas as crianças e jovens, um serviço nacional de saúde de acesso universal e tendencialmente gratuito, apoios sociais na doença, maternidade, desemprego, invalidez e velhice que permitam viver com dignidade todas as etapas da vida. E estão dispostos a continuar a pagar impostos comparativamente elevados para reforçar o Estado social, mas não para que se continue a enterrar dinheiro em empresas falidas ou nas negociatas da corrupção, do clientelismo e das parcerias ruinosas do Estado com os privados.

Os autointitulados socialistas têm, imerecidamente, a maioria absoluta que ambicionavam. Mas preferem continuar a adiar as políticas que sabem ser necessárias e que até estão inscritas nos programas do governo e do partido. E a prova é que as anunciam todos os dias, enquanto fazem o contrário daquilo que apregoam.