ADD, a última fronteira

O ano lectivo 2022/23 ficou marcado pela contestação e luta dos professores a um nível como já se não via desde 2008: um espírito e uma determinação colectivas que muitos, a começar por quem escreve estas linhas, duvidavam seriamente que alguma vez voltasse a surgir numa classe que passou quase toda a última década e meia numa notória apatia.

De norte a sul do país, fizeram-se inúmeras concentrações à porta das escolas e manifestações nas ruas; houve greves simbólicas de um ou dois tempos, e outras mais duras e prolongadas que fecharam escolas. Confrontou-se o ministro e outros responsáveis e apoiantes do Governo. As greves impediram ou condicionaram a realização das provas de aferição em centenas de escolas e teriam eventualmente provocado o caos, se não tivessem sido decretados os serviços mínimos, nos exames nacionais e avaliações finais.

Houve no entanto uma actividade docente que nenhuma acção de luta beliscou: a avaliação do desempenho docente, a famigerada ADD. Sem falhas nem esquecimentos, todos os interessados pediram as aulas assistidas a que têm direito para progredirem. Diligentemente, as direcções e os centros de formação arrebanharam, tantas vezes à força, os observadores de aulas. E agora andamos quase todos na azáfama da entrega e, posteriormente, da avaliação dos relatórios dos avaliados. No final, as SADD farão a aplicação da lei iníqua que reverte a maioria das notas ditas de mérito para o nível do Bom, o que impede a obtenção de vaga em escalões sujeitos a quotas.

No meio disto tudo, e depois de um ano de luta tão criativo que até nos cartazes conseguiu criar polémica, como é que ninguém pensou em nada que pudesse entravar ou questionar os procedimentos da ADD, boicotá-los até, como forma até de demonstrar que a generalidade dos docentes não se revê neste modelo de avaliação? Ou será que já nos acostumamos e até aceitamos com naturalidade as quotas e as vagas, o secretismo e as injustiças, os procedimentos kafkianos que inquinam tudo o que deveria ser uma avaliação justa e honesta dos professores, focada no trabalho pedagógico e no contínuo aperfeiçoamento profissional que são a razão de ser da carreira docente?

Com o ano lectivo a terminar para os resistentes que ainda continuam com aulas, com a luta a aproximar-se, tal como os professores, das merecidas férias, qualquer balanço sério que se faça ao seu desenvolvimento encontrará na ADD uma espécie de tema-tabu, um elefante no meio da sala em que todos fingem não reparar – mas que está lá!…

2 thoughts on “ADD, a última fronteira

  1. Alguma vez seria possível boicotar a ADD? Se nem para greves de dois os professores estão dispostos… No entanto, consigo achar bem mais compreensível a participação nesta farsa da ADD (que diabo! Os professores querem progredir!) do que o comodismo em termos de um comportamento grevista consequente.

    P. S. Sou contratado, portanto, o Bom para mim basta.

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    • Pois, não se faz nada ao longo do ano porque a causa, aparentemente, não é mobilizadora.

      Lá mais para a frente, em Setembro na maioria das escolas, começará o coro de protestos e de revolta com as classificações obtidas, as injustiças, os que ficam retidos, os amigos do director que não sei quê…

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