Os silêncios do senhor reitor

Cento e sessenta e dois professores e investigadores da Universidade de Coimbra (UC) exigem à reitoria daquela instituição, num abaixo-assinado, que tome uma posição contra a guerra em Gaza e que defenda um cessar-fogo imediato.

O abaixo-assinado enviado à agência Lusa e entregue na quinta-feira à tarde ao reitor da Universidade de Coimbra, Amílcar Falcão, inclui assinaturas de 162 investigadores e professores, incluindo vários catedráticos e docentes associados de quase todas as faculdades da instituição.

Os subscritores pedem que o reitor tome “todas as providências necessárias para que a voz da UC se junte a todos os que denunciam os crimes de guerra e contra a humanidade perpetrados em Gaza” e defendem um “cessar-fogo imediato que permita a libertação de todos os reféns e a abertura de caminhos que permitam uma paz duradoura para os povos da região, incluindo o reconhecimento do Estado da Palestina”.

No documento, docentes e investigadores apelam também à reitoria para que acabe com “a sua cooperação científica e tecnológica com as entidades que sirvam, direta ou indiretamente, fins contrários a valores como são o da dignidade humana, o direito à vida, o direito à liberdade, o direito à não-discriminação de qualquer natureza”.

O alheamento da reitoria da UC face ao genocídio em curso na Faixa de Gaza contrasta com a acção pronta e decidida aquando da invasão russa da Ucrânia. Nessa ocasião, o reitor Amílcar Falcão ordenou o despedimento sumário de um professor do Centro de Estudos Russos, depois de uma denúncia, feita por dois activistas ucranianos, de que o docente andaria a fazer propaganda pró-russa. Na altura, nem as acusações foram fundamentadas nem a reitoria foi capaz de justificar a decisão tomada, sem apelo nem agravo, num flagrante exercício de prepotência e autoritarismo, apesar das muitas vozes de repúdio que então se fizeram ouvir, dentro e fora da instituição académica.

Na verdade, uma coisa é um acto de agressão decidido pelo governo ditatorial de um país, que é inteiramente legítimo condenar sem reservas. Mas nem os cidadãos russos que vivem e trabalham em Portugal devem ser perseguidos ou discriminados, nem a milenar cultura russa deve ser cancelada ou diminuída por causa das acções condenáveis do governo de Putin. Amílcar Falcão parece não perceber isto, da mesma forma que não consegue identificar um genocídio em curso, nem quando ele é exibido diariamente nas TVs, nos jornais e nas redes sociais.

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