O mediatismo que alguns professores da “telescola” adquiriram nos últimos tempos extravasou das aulas para a presença noutros programas televisivos e para o comentário na imprensa e nas redes sociais. E levou-me a escrever sobre o assunto no balanço da semana que faço habitualmente no blogue ComRegras. Este texto recupera e desenvolve o breve comentário que então fiz.
É tão invulgar a presença de professores do básico ou do secundário na televisão portuguesa que as emissões do “EstudoEmCasa teriam, forçosamente, de dar nisto: o cidadão comum apercebeu-se de que o ensino já não é hoje a tal escola retrógrada e parada no tempo que se tornou cliché de uns quantos charlatães da (semi)nova pedagogia. Afinal, parece que as aulas dos professores formados na “escola do século XX” podem ser dinâmicas, integrar recursos diversificados e recorrer às tecnologias. Os professores podem ser imaginativos e até divertidos, na constante busca de formas eficazes de ensinar e aprender. Mesmo que o ensino continue a ser directivo e expositivo, o que no caso da telescola é uma inevitabilidade, tendo em conta o carácter unidirecional da comunicação pelo meio televisivo.
O #EstudoEmCasa trouxe fama a alguns professores e deu-os a conhecer a outros públicos, além dos alunos da telescola. O caso mais notório foi o da dupla de professoras de Inglês que inventou uma espécie de rap para ensinar os meses do ano. O convite para irem a programas de entretenimento televisivo foi insistente, e as colegas acabaram decidir comparecer.
Durante a semana, o assunto foi amplamente discutido entre os professores. Uma discussão que começou com um post algo polémico no ComRegras, chegou à imprensa e se espraiou pelas redes sociais. Não tendo estado em causa, suponho, a liberdade pedagógica inerente à criação de uma estratégia motivadora para os alunos, a questão colocou-se sobretudo ao nível do estrelato televisivo. Devem os professores expor-se desta forma, a eles e ao seu trabalho, em programas de entretenimento? Discutível, sobretudo quando uma das envolvidas acabou a confessar o seu arrependimento e as pressões a que terá sido sujeita.
Mas… por outro lado, porque não? Estará um professor civicamente diminuído em relação à generalidade dos cidadãos que desta forma se dão a conhecer? Se um ministro, que calhou ser da Educação, pode ir a um programa de entretenimento matinal falar do que não sabe, não fará melhor figura um professor a falar da sua profissão?
Pela minha parte, bato-me há muitos anos por uma maior visibilidade pública da classe docente e por um papel mais influente desta, tanto junto da opinião pública como na definição das políticas educativas. Pelo que só devo congratular-me com o protagonismo dado às colegas, ainda para mais assente no reconhecimento da sua competência profissional.
Contudo, importa estar atento às cedências e compromissos que os quinze minutos de fama televisiva podem implicar. Quer isto dizer que qualquer professor que, sendo convidado nessa qualidade, vá à televisão, deve estar consciente de que, mesmo involuntariamente, está de alguma maneira a representar a sua profissão.
Intervir de uma forma que valorize o nosso trabalho e dignifique a nossa profissão, num ambiente que não é aquele a que estamos habituados, nem sempre é fácil, sobretudo em programas que abusam do tom ligeiro, e às vezes brejeiro, para entreter audiências. Pelo que o desafio é usar com inteligência o meio televisivo, sem se deixar instrumentalizar por ele. Há a considerar que reduzir o trabalho docente à caricatura da sala de aula e à piada fácil, preconceituosa e estereotipada é uma velha tradição do humor à portuguesa. Que vem já do tempo, pelo menos, das Lições do Tonecas…
Se gostou de ler, partilhe...