A ideia de que aprender é algo de intrinsecamente aborrecido e que, em última análise, só se aprende aquilo de que se gosta, tem vindo a ser activamente promovida na agenda educativa do mundo globalizado. Para confirmar que não é só por cá, nem precisamos de ir muito longe: basta espreitar o outro lado da fronteira para constatar que também por Espanha o emotivismo educativo, desvalorizando o conhecimento em nome do primado das emoções, é uma das pedras de toque das reformas educativas que se tenta implantar.
Embora reflectindo sobre uma realidade distinta, este excerto de um texto de Alberto Royo, que traduzi e adaptei, sinaliza bem aquilo que é cada vez mais, nos tempos que correm, um combate universal: por uma escola capaz de cumprir a mais nobre das suas funções, que é a de ensinar e abrir horizontes aos seus alunos, em vez de os entreter com patranhas, mediocridade e facilitismo.
A mudança fundamental que podemos apreciar no debate educativo, e mais ainda desde a irrupção dos Globalteacherprize, é a ênfase na emoção e o desdém pela razão. Alguns vão chamar-me exagerado, vão dizer-me que a emoção e a razão não são incompatíveis….. E assim é, à partida, mas a emoção pode ser encontrada no conhecimento, na ciência e na cultura. Aprendemos a apreciar o belo através da emoção que o conhecimento nos dá (e não através de atalhos foleiros e superficiais cujo estímulo é escasso, precisamente porque não é necessário esforço para o alcançar). É tão certo que não podemos deixar a emoção de lado na aprendizagem como é verdade que estamos enganados se nos preocuparmos apenas com isto e esquecermos que quanto maior for a nossa solidez intelectual, em melhor situação estaremos para desfrutar do que vale a pena ser apreciado.
O delírio emotivista é tal que falar de exigência está associado à lista dos reis godos e ao velho ditado “a letra entra com sangue”, enquanto caímos em concepções vazias como “ensinar com o coração” (o que pensaria um cardiologista disto?) ou “educar as emoções”, o que acabará por transformar o ensino, primeiro em puro e simples entretenimento e, a seguir, em terapia. Terapia e emoções, como proclama a nossa ministra. Por acaso os nossos alunos são todos disfuncionais ou estão todos doentes? Porque transformar o professor em terapeuta vai deixar as crianças que precisam de terapia sem o profissional certo para as ajudar e a todos sem o que é essencial: conhecimento.
[…]
Voltámos a cair na sobrevalorização dos aspectos mais subjectivos, arbitrários e questionáveis da educação, quando o que é urgente é basear o nosso sistema no sólido, no científico, na evidência e na experiência dos que todos os dias dão o litro na sala de aula com o objectivo de ensinar e formar cidadãos. Os próprios psicólogos denunciam a intrusão de pseudociências como o “coaching” (soa familiar?) no seu campo de trabalho, que “poderia”, denunciam, “desorientar pacientes desinformados”. Temos estudantes (naturalmente) desinformados, que também estamos a desorientar por meio de gracejos, placebos e métodos miraculosos que não servirão para alcançar o seu bem-estar nem ajudarão a moldar uma sociedade madura, crítica e emocional e intelectualmente saudável.
Texto original e integral publicado aqui: Metamorfosis educativa y emotivismo terapéutico