Pais de crianças com necessidades especiais “não sabem para onde se virar” com a falta de auxiliares nas escolas

A peça do Público faz um retrato bastante nítido dos problemas e dos paradoxos da escola inclusiva.
O regime instituído pelo decreto-lei 54/2018 prescreve a inclusão dos alunos com necessidades especiais nas turmas regulares como uma panaceia capaz de resolver praticamente todos os problemas que estes alunos enfrentam.
É verdade que, perante dificuldades ligeiras ou moderadas do aluno, permanecer na turma pode ser a resposta mais estimulante e integradora, desde que beneficie de adaptações e apoios adequados. O problema maior coloca-se em relação aos que apresentam maiores limitações, sobretudo àqueles que necessitam de um apoio individualizado constante, que o professor da turma não está em condições de prestar – nem é essa a sua função.
Ao decretar a inclusão de todos os alunos, o “54” mostra-se bastante mais ambicioso do que o diploma que o antecedeu. No entanto, sendo especialmente exigente com os professores e os técnicos, que deverão desenvolver um ensino à medida de cada aluno, é muito menos taxativo quando se trata de dotar as escolas com os recursos necessários à tão desejada inclusão. E isso nota-se especialmente na carência de funcionários que dêem assistência individual aos alunos com pouca ou nenhuma autonomia.
No regime segregado que prevaleceu até há pouco na maioria das escolas, era possível disponibilizar recursos concentrando alunos e pessoal de apoio em salas específicas para alunos com necessidades especiais. Mas quando espalhamos estes alunos por várias turmas da escola constata-se, sem surpresa, que os funcionários que os acompanhavam quando estavam juntos agora já não são suficientes para o fazer.
A verdade é que tem sido mais a poupança financeira do que a resposta às necessidades que tem prevalecido na gestão deste dossier. Se com o decreto-lei 3/2008 um outro governo socialista procurou, através da medicalização das necessidades especiais, reduzir o número de alunos abrangidos, com o 54/2018 a ideia é universalizar a aplicação de medidas educativas no contexto da sala de aula. O objectivo inconfessado é reduzir a necessidade de professores de educação especial, terapeutas e auxiliares, “capacitando” os professores das turmas regulares para a integração plena de todos os alunos na sala de aula. Para apoiar este desígnio, explora-se o mítico conceito do “desenho universal do currículo” – um currículo acessível a todos e tão adequado aos alunos com notórias limitações cognitivas ou funcionais como aos futuros einsteins…
No entanto, a realidade é o que é. Da mesma forma que não se consegue controlar o crescimento galopante da actual pandemia apenas com decretos e retórica, também com o ambicioso programa da escola inclusiva não haverá milagres: só se concretizará com o envolvimento de maiores recursos – a começar pelos humanos, os mais importantes de todos – na educação das crianças e jovens que deles necessitam.