Não há “objecção de consciência” à Cidadania

Na semana passada, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga indeferiu a providência cautelar que pretendia travar o chumbo de dois alunos de Vila Nova de Famalicão que, por decisão dos pais, não frequentaram as aulas daquela disciplina, mas o pai, Artur Mesquita Guimarães, adiantou que iria recorrer da sentença.

No entanto, o recurso agora negado pelo STA refere-se a uma decisão anterior do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga. Referindo-se apenas à objeção de consciência, o STA justifica a decisão argumentando que os pais “invocam direitos que certamente não possuem a extensão que presumivelmente julgam ter”.

“Direitos que não são absolutos e que devem ser conjugados com outros bens e valores igualmente protegidos na Constituição”, explica o acórdão.

No entender do STA, as inconstitucionalidades invocadas pelos pais não podem ser consideradas como manifestas ou evidentes e, por isso, o tribunal afasta a alegada objeção de consciência “nos termos invocados” na providência cautelar.

O STA, pronunciando-se apenas sobre a objecção de consciência invocada pelo pai de Famalicão para subtrair os filhos à frequência da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, confirma o que foi desde sempre a minha convicção e escrevi, a esse respeito, quando o caso foi trazido ao conhecimento público:

 o principal argumento do pai e dos seus apoiantes cai pela base ao basear-se num suposto direito constitucional à objecção de consciência. É que este não é um direito universal e abstracto, como o são o direito à vida, à liberdade ou à segurança: a própria Constituição define que o seu exercício é feito “nos termos da lei” (ponto 6 do artigo 41.º). Ora não há qualquer lei que determine o carácter opcional da disciplina de Cidadania, como sucede, por exemplo, com as aulas de EMRC.

Mesmo que pudesse existir uma qualquer objecção de consciência a matérias que fazem parte dos referenciais da Educação para a Cidadania, há que ter em conta que as consciências em causa seriam as dos alunos que frequentam as aulas da disciplina. Os pais são responsáveis pela Educação dos filhos, mas isso não lhes dá o direito de decidir o currículo escolar, muito menos de tentar formatar o pensamento dos filhos de acordo com os seus tabus e preconceitos.

Ao que parece, a decisão agora tomada, embora definitiva, não termina definitivamente o processo judicial, uma vez que haverá ainda outras questões a dirimir. Mas seria bom que a litigância entre o pai de Famalicão e o SE João Costa chegasse rapidamente ao seu termo. Para se poder tratar do que verdadeiramente interessa, uma solução pedagógica que acautele o que neste caso tem sido repetidamente desrespeitado por todos, a começar pelo pai que deveria zelar pela educação dos filhos: o superior interesse destes alunos.

1 thoughts on “Não há “objecção de consciência” à Cidadania

  1. “Raios!”, pensaram Mário Machado e o seu advogado, ao lerem esta notícia. “E nós a pensarmos que podíamos invocar a objecção de consciência em relação a outros direitos inscritos na Constituição. Os pretos e os pedófilos mandam nisto tudo!”.

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