O negócio das explicações

Entre explicadores domiciliários e centros, o negócio das explicações move muitos milhões. É uma economia paralela, onde impera a concorrência desleal. E o Governo, acusam responsáveis e estudiosos do sector, prefere continuar a assobiar para o lado. Matemática A, considerada a mais difícil das disciplinas do secundário, é a que mais motiva o recurso a explicações.

O recurso a explicações é talvez o mais poderoso factor a influenciar as melhorias dos resultados escolares, sobretudo nos anos e nas disciplinas sujeitos a exame nacional. E, no entanto, passa completamente ao lado das complicadas métricas e algoritmos com que se tenta analisa habitualmente a evolução dos resultados escolares. Ainda recentemente, um estudo, apresentado com pompa e circunstância, pretendia medir o “valor acrescentado” dos professores nas aprendizagens dos alunos. Os autores recorreram a mais de um milhão de registos das bases de dados do ME. Mas o factor explicador, que não consta das estatísticas oficiais, ficou convenientemente de fora.

E no entanto, nas escolas secundárias de elite, que habitualmente povoam o topo dos rankings, o fenómeno está generalizado, sendo quase impossível, no 12.º ano, encontrar alunos que não frequentem explicações de Matemática, ou de outra qualquer disciplina em que sintam maiores dificuldades, para chegar aos resultados almejados.

Apesar da omnipresença na vida estudantil, este “submundo”, como lhe chama a reportagem do Público, continua ainda a caracterizar-se, em grande medida, pela informalidade. A par dos centros de estudos que nas últimas décadas surgiram um pouco por todo o país, a maior parte das explicações são dadas particularmente. Por professores no activo, que acumulam esta actividade com a docência, mas também por docentes desempregados ou que já desistiram mesmo de leccionar e têm nas explicações a principal ou exclusiva fonte de rendimento.

Embora seja difícil quantificar o valor económico do mercado das explicações, é fácil perceber o seu peso excessivo. Ele reflecte as contradições de um sistema educativo que, apesar das investidas concertadas e continuadas de políticos e pedagogos no sentido do facilitsmo, mantém ainda níveis de exigência a que as escolas, por falta de recursos e por vezes de organização, não conseguem corresponder inteiramente. É o resultado das turmas numerosas, que não permitem aos professores acompanhar todos os alunos e resolver aula a aula as dificuldades que vão surgindo. E também da falta de recursos materiais e humanos para o apoio individualizado aos alunos que dele necessitam, e que acaba por levar as famílias que podem a recorrer às explicações.

Isto leva-nos a outro problema de fundo do actual sistema: as explicações promovem a desigualdade no acesso à educação, o que se torna especialmente visível no acesso aos cursos superiores com médias de acesso mais elevadas, e onde já praticamente não se vêem alunos oriundos das camadas menos favorecidas da população. O custo das explicações acaba por impor pesados sacrifícios a famílias de escassos rendimentos, mas que não querem comprometer os estudos dos filhos. Para quem não pode de todo, esta acaba frequentemente por ser uma barreira intransponível entre as aspirações académicas e a sua concretização. Para os mais abonados, o mercado das explicações abre um mundo de possibilidades: de acordo com as disponibilidades financeiras, pode ter-se um explicador mais caro ou mais barato, explicações individuais ou em grupo, uma vez por semana ou com maior frequência. É a liberdade de escolha, para quem pode pagar.

Comentar

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.