O texto de opinião do director-adjunto do JN ainda prossegue, mas o essencial está dito. O primeiro parágrafo da prosa é especialmente revelador: quando um articulista pretende enaltecer os professores começando por atacar os seus representantes, é certo e sabido que o elogio é venenoso e interesseiro. Tentar desacreditar os sindicatos que defendem os direitos e interesses de uma classe é uma velha estratégia para atacar a classe no seu todo. Claro que é mais fácil dobrar os professores quebrando a sua consciência colectiva e deixando cada um isolado no seu “contexto”. “Todos diferentes”, para que seja cada um por si e se tornem mais difíceis a união e a luta colectiva. Este Molinos sabe muito…
Na verdade, a posição sindical não chama incompetentes aos professores. Pelo contrário, enaltece a sua competência profissional. Pois os profissionais da Educação são isso mesmo, professores e educadores, não médicos, epidemiologistas, enfermeiros ou técnicos de saúde pública. Os professores já são, involuntariamente ou por dever de ofício, muitas coisas. Não nos obriguem também a ser especialistas em confinamentos, desinfecções e contaminações. E se mesmo em hospitais, laboratórios e centros de saúde, onde é suposto trabalharem especialistas que sabem o que andam a fazer, os contágios acontecem, não é difícil perceber que as oportunidades de propagação da doença aumentam exponencialmente no meio escolar, caso não se tomem os devidos cuidados. A abertura apressada das escolas pode despoletar um grave problema de saúde pública, se o assunto não for entregue a quem saiba o que anda a fazer.
Vem depois a deriva em torno das desigualdades no sistema, um velho problema que se teima em manter desligado da questão de fundo que o origina, que é a desigualdade na própria sociedade. E a incapacidade de pôr em causa uma das vacas sagradas do regime, os exames para entrar na faculdade. Como se fosse impossível conceber outra forma, mais lógica, coerente e justa para organizar o acesso ao ensino superior, do que usar para o efeito os exames do secundário. Enquanto os mais ricos pagam as explicações e os colégios que garantem as notas de acesso, outros vão-se contentando em exigir “alguma justiça” para os pobres e os remediados. Só que a justiça não é algo que deva ser servido às meias doses. Não será já tempo de exigir simplesmente justiça – um sistema de acesso ao ensino superior justo para todos?…
Finalmente, os jovens. E a velha tentação de tratar a juventude como uma categoria homogénea, quando entre os jovens, como no resto da sociedade, existe de tudo. Há-os social e ambientalmente responsáveis, há-os respeitosos e cumpridores. Mas também os há irresponsáveis, impulsivos, egocêntricos, inconscientes. E há quem possa ser um pouco disto tudo. Afinal de contas, estamos a falar de personalidades em processo de formação e amadurecimento, no qual as componentes afectivas e emocionais assumem um papel muito importante. Quem lida com gente jovem sabe como os humores variam e que a mesma pessoa, em diferentes contextos, pode reagir de formas muito distintas. E quão poderosa pode ser a dinâmica de grupo na modelação de atitudes, comportamentos e formas de estar e de agir dos nossos alunos.
Sim, a juventude pode ser egocêntrica e irresponsável, até mesmo aquela que se mobiliza em torno de causas nobres como a da defesa do nosso planeta. Um reconhecimento que não deve servir para acusar os mais jovens de não terem a maturidade, o conhecimento e a experiência que são atributo dos mais velhos. O activismo corajoso e determinado de Greta Thunberg não pode servir de desculpa para a inacção dos decisores políticos e económicos. Da mesma forma, não é admissível que o sentido de responsabilidade de alunos e professores sirva de pretexto para que os responsáveis da Educação e da Saúde se eximam às suas responsabilidades.
É interessante comparar o artigo do director adjunto do JN com o comentário do António Duarte. De um lado, leviandade, sofismas e ideologia mal disfarçada. Do outro, seriedade de análise, argumentação rigorosa e uma posição assumida em função daquela e daquela exposição argumentativa.o director adjunto quis passar um atestado de incompetência aos professores, mas, ao subir ao seu palanque, nada mais revela do que incompetência.
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