Vergonha nacional

pre-escolarUm país que viu descer a natalidade a mínimos históricos não conseguir, mesmo assim, assegurar a universalização do pré-escolar a todas as crianças é, efectivamente, e sem ter medo das palavras, algo que nos deve envergonhar colectivamente.

Recordo que a universalização da educação pré-escolar a partir dos três anos fez parte do rol das promessas não cumpridas do anterior governo socialista. Não conseguiram inventar nenhum “projecto” para pagar a medida com financiamentos europeus e, claro, tapar os buracos da gestão fraudulenta na banca esteve sempre à frente, na lista de pagamentos, do investimento público em Educação.

Ainda assim, o Governo não tem todas as culpas. Porque não vi, nem da parte da sociedade civil nem das oposições, o empenhamento necessário para forçar o governo a corrigir a sua política. Numa sociedade com cada vez menos crianças, não tardará muito, se continuarmos por este caminho, a que rendam mais votos as medidas tomadas a favor de cães e gatos do que da educação, da saúde e do bem-estar das nossas crianças.

Talvez agora, que o assunto adquire visibilidade a nível internacional, o Governo demonstre o empenhamento que não teve perante a complacência nacional…

Se for cumprido o que se encontra previsto no Orçamento do Estado (OE) para 2020, Portugal poderá deixar de figurar ainda este ano na “lista negra” dos países que continuam a não ter vagas necessárias para garantir a frequência da educação pré-escolar às crianças com três anos de idade.

É esta, aliás, uma das características destacadas no último relatório da rede europeia Eurydice com os Números-chave sobre a Educação Pré-Escolar e Cuidados para a Infância na Europa, divulgado na última semana. Cerca de metade dos 38 países analisados neste estudo têm oferta gratuita do pré-escolar a partir dos três anos, Portugal incluído, mas, “em contraste” com o que se passa na maioria dos casos, por cá “ainda se observa uma falta considerável de vagas para este grupo etário”, frisa-se no relatório. Que aponta como explicação para esta situação o facto de o “direito legal” a uma vaga só estar disponível para crianças a partir dos quatro anos.

Este “direito legal” consiste na obrigação de o Estado garantir vagas a todas as crianças inscritas na educação pré-escolar. É o que se chama universalização deste nível de ensino, que já está garantida entre os quatro e os cinco anos de idade, tendo sido criadas desde 2016 cerca de mais 7500 novas vagas na rede pública.

2 thoughts on “Vergonha nacional

  1. Tenho dificuldade em perceber a racionalidade da comparação com intuito crítico entre a popularidade de medidas promotoras da natalidade e de medidas promotoras do bem-estar animal. A defesa destas entra em conflito com a defesa daquelas? Ou trata-se de uma observação deslocada e preconceituosa similar à dos que protestam assim: “Andam para aí a apoiar (inserir referência a vítimas de um qualquer desastre humanitário no estrangeiro) e não querem saber dos sem-abrigo do país!”)? Semelhante tipo de considerandos não me espanta em gente como o bué-de-esquerda-de-trazer-pelo-Expresso-e-SIC Daniel Oliveira, mas não no António Duarte. De resto, excepção feita ao último parágrafo, só posso subscrever as ideias do post.

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    • Caro RF, não foi meu intuito ofender os apreciadores de cães e gatos. Nem tão pouco encontro incompatibilidades na coexistência de famílias com filhos e animais de estimação.

      Apenas constato a realidade insofismável de um número crescente de pessoas estar a excluir a parentalidade do seu projecto de vida, ao mesmo tempo que investem tempo, dinheiro e dedicação nos animais de companhia.

      Nesse contexto, e quando as estatísticas oficiais já prevêem que na Europa passe a haver em breve – se é que não acontece já – mais cães e gatos do que crianças, é natural passem a render mais votos as políticas orientadas para o bem-estar animal do que as de promoção da natalidade e de apoio às famílias.

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