O país dos incêndios

incendio-pedrogao1Ainda lavram, incontrolados, os incêndios em Pedrógão Grande e concelhos vizinhos. Pouco haverá a acrescentar ao muito que já se disse sobre a imensa tragédia do fim de semana. Falta o mais importante, que é agir de acordo com o que há muito se sabe que está por fazer em matéria de ordenamento do território, de responsabilização dos proprietários, de coordenação de estruturas de protecção civil, de rentabilização do muito dinheiro que se esbanja, anualmente, em cada “época de incêndios”, para continuarmos, ano após ano, no lugar nada invejável de país europeu com mais área florestal ardida.

De facto, basta percorrer o IC8 para perceber a dimensão e a densidade da mancha florestal a que se convencionou chamar Pinhal Interior: perante o envelhecimento e a desertificação humana e a fraca aptidão agrícola da maioria dos solos, apostou-se na exploração florestal, sem tomar em devida conta as necessidades do ordenamento do território e de uma gestão adequada das florestas. Esquecem-se medidas básicas e fundamentais de segurança como a desflorestação e a limpeza das zonas adjacentes às estradas ou em torno das povoações que preservariam zonas seguras e caminhos de fuga às populações ameaçadas pelas chamas.

No meio da tragédia, que foi pasto não apenas para as chamas mas também para intermináveis serviços noticiosos que, a certo ponto, mais não faziam do que repetir até à náusea as mesmas imagens e informações, o destaque, pela negativa, coube desta vez à TVI e à sua jornalista-vedeta Judite de Sousa. Achando por bem deixar, por uma vez, o conforto dos estúdios e ir pavonear-se para o centro dos acontecimentos, não encontrou melhor sítio para fazer a sua reportagem do que ao lado do cadáver de uma senhora vitimada pelo fogo.

judite-pedrogao.jpgDuplamente lamentável, não só pelo triste exemplo ético e deontológico de uma jornalista que é também professora de jornalismo, mas também porque todos soubemos da sua imensa dor e sofrimento aquando do falecimento recente do seu filho. E nos recordamos de como foi alvo de inúmeras manifestações de apoio, compreensão e de solidariedade. O que teria sentido Judite de Sousa na altura, se um seu colega de profissão fosse fazer uma reportagem ao lado do corpo do seu filho?

3 thoughts on “O país dos incêndios

  1. Chocante o episódio protagonizado por JS. Paradoxalmente, tendo a desculpabilizá-la. Porquê? Porque, dizem, o seu estado mental é débil ( como compreendo! ..). Posto isto, a culpa vai “inteirinha” para a TVI que deveria evitar tão macabra cena, mesmo tendo em conta a febre das audiências.

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    • Pois, a JS não esteve sozinha a fazer o que fez. A estação é responsável pela emissão lamentável que colocou no ar, embora a jornalista, ao que julgo saber, continue ela própria a ter responsabilidades importantes no jornalismo da TVI.

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  2. Procurar refúgio no trabalho – não é o que se recomenda? Se o trabalho em causa vive da competição desenfreada, dos atropelos à ética, tudo em nome dos índices de audiência necessários para garantir que a fornalha da publicidade continue a alimentar o negócio do canal, se, para mais, a senhora em causa e outros pivôs são tratados e tratam-se como mercadoria, que há de espantoso neste comportamento abjecto? A morte do filho da senhora não me merece mais compaixão do que a de outra pessoa qualquer com quem não tenho relação e que não é vítima de injustiça: lamento, apenas. Mas lamento mais que a mãe venha falar para a comunicação social da sua dor e do seu luto. É obsceno . Ou faz tudo parte da gestão de carreira?

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